“O Plano-piloto refuge a imagem tradicional no Brasil da
barreira edificada ao longo da água; a orla do lago se pretendeu de livre
acesso a todos, apenas privatizada no caso dos clubes. É onde prevalece a
escala bucólica.”
Assim
Lucio Costa se refere à orla do Lago Paranoá no documento Brasília revisitada,
que constitui anexo aos instrumentos local e federal de Tombamento do conjunto
urbanístico de Brasília (Decreto Distrital nº 10 e Portaria nº 314/92, do
Iphan). Os loteamentos dos Setores de Habitação Individual Sul e Norte — Shis e
Shin — foram inicialmente registrados em cartório contendo apenas os lotes de
uso residencial, e alguns lotes destinados a equipamentos públicos comunitários
(educação, saúde, recreação, abastecimento). Posteriormente, esses loteamentos
foram complementados com a definição de todos os equipamentos públicos
comunitários necessários ao atendimento a população ali residente, portanto,
equipamentos de âmbito local.
Na
oportunidade, as áreas públicas de uso comum ficaram completa e definitivamente
determinadas, mencionadas e delimitadas. São as áreas livres, verdes, onde não
se pode edificar, mas apenas prevê existência de vegetação, inclusive aquelas
típicas da região. Em nenhum momento e em nenhum projeto, o loteamento desses
setores permitiu que os lotes residenciais alcançassem o lago, até porque
estaria indo de encontro com o conceito de criação dessas áreas residenciais,
conforme descrito acima, pelo próprio autor de Brasília — Lucio Costa.
A baixa
densidade de ocupação, a manutenção das áreas públicas de uso comum do povo
livres de edificações e o limite das construções em altura são a garantia da
“visibilidade e ambiência” necessárias à proteção do bem tombado de Brasília,
conforme determina a legislação federal. Além disso, trata-se de Área de
Preservação Permanente (APP), que também deve ser protegida e livre de
construções, para a proteção do próprio Lago Paranoá, patrimônio de todos.
Assim,
não há nenhum motivo, quer urbanístico ou ambiental, que sustente a ocupação e
privatização da orla do Lago Paranoá. Ao contrário, é DEVER do Estado agir no
sentido de desocupá-la, retomando o uso efetivo, da sociedade e de proteção do
Lago que é também bem público. Assim previa Lucio Costa. Assim determina a
legislação vigente. Portanto, prestamos inteiro apoio à ação do GDF e da
Agefis, no cumprimento de seu DEVER.
Por: Tânia
Battella de Siqueira, arquiteta
e urbanista, membro da Frente
Comunitária do Sítio Histórico de Brasília e DF e do Conselho Internacional de Monumentos
e Sítios da Unesco - Fonte: Correio Braziliense - Foto: Google