Manoel e Francisca se abraçam ao lado de Fusca em
ensaio fotográfico no Parque da Cidade (Foto: Victor Moura/Reprodução)
Fotos viralizaram na web e receberam mais de
100 mil curtidas em 3 dias. 'Se eu
morrer e voltar, ainda caso com você', diz a marido idosa retratada. O fotógrafo
brasiliense Victor Moura recebeu, nos últimos dias, centenas de mensagens de
pessoas de todo o país emocionadas com um ensaio romântico de dois idosos
clicado por ele no Parque da Cidade Sarah Kubitschek. Foram mais de 100 mil
curtidas, 1,4 mil solicitações de amizade e 340 pedidos de orçamento depois da
divulgação das fotos, tiradas em comemoração aos 60 anos de união dos idosos
Manoel Senhorzinho de Moraes e Francisca Gomes de Moraes, de 79 e 77 anos,
respectivamente.
“As
pessoas diziam estar chorando, emocionadas. Várias me falaram dos próprios
pais, dos pais falecidos ou da vontade de viver algo parecido. Também diziam:
‘pôxa, meu marido morreu, queria ter essa história também’. Outros brincavam
que ainda faltam 43 anos para chegar lá ou dizendo que já estou contratado para
2040”, diz.
As
fotos foram tiradas para serem distribuídas a familiares durante a festa de
celebração das bodas de diamante do casal. Um dia após a cerimônia, no entanto,
o filho mais velho deles, de 58 anos, sofreu um derrame e, uma semana depois,
morreu. Muito abalados, os idosos preferiram não dar entrevista.
A
filha caçula deles, Flávia Sandra de Moraes, de 35 anos, que foi quem
incentivou os pais a tirarem as fotos, diz que, mesmo em meio à tristeza, os
idosos conseguem achar graça da repercussão que as fotos ganharam.
˜Eles
não entendem a proporção que isso tomou porque não mexem com internet, com
Facebook, desconhecem esse mundo. Os filhos mais novos, netos, são as pessoas
que estão passando para eles essa explosão. Então eles riem quando a gente
chega radiante contando", diz Flávia.
"Quando
falei para meu pai que estava em 15 mil 'likes', ele perguntou: 'Mas como
assim? Quem são essas pessoas? Elas não me conhecem'. Falei para ele que uma
pessoa passa para a outra, e para outra, e que estavam gostando, achando bonito
e estavam desejando isso, completar 60 anos de casados. Ele ria e achava
engraçado, e minha mãe também."
Manoel e Francisca em ensaio fotográfico no Parque
da Cidade (Foto: Victor Moura/Reprodução)
Embora
saiba que os pais têm uma história admirável, Flávia rejeita para os pais o
rótulo de "conto de fadas". "Não é aquela coisa irreal, história
de filme. Não é isso. É a realidade mesmo, a batalha. O perdão o tempo todo. Não
é fácil, nunca foi fácil. Tiveram vários filhos, vários netos, minha mãe cuidou
dos irmãos. É uma entrega, na dificuldade do dia a dia", diz.
Flávia
diz que os pais são inseparáveis. "O que mais admiro é meu pai, o tempo
todo ao lado da minha mãe, onde quer que ela vá. Eles saem 99% do tempo juntos.
Tem esse companheirismo, essa coisa de estar juntos o tempo todo, a preocupação
um com o outro. As pessoas hoje em dia não querem isso, elas não querem
entender o outro, elas querem o individualismo, eu em primeiro lugar."
Ensaio
Morador de Samambaia,
Moura abandonou o trabalho de vendedor de material de construção para seguir a
paixão por fotografia e música há um ano e meio. Ele também não imaginava que
as fotos seriam tão compartilhadas. "Não imaginei que tomaria tal proporção,
confesso que parece surreal", diz. “Todos se sensibilizaram pelo casal,
pelas fotos, pela sinceridade deles, por conta deles. Poderia ser outro
fotógrafo? Poderia. Talvez eu tenha tido sorte, talvez tenha tido
sensibilidade, não sei. Isso ultrapassa técnicas.”
O
trabalho dele não se restringe em fotografar. Com limitações de visão e de
audição, os idosos precisaram de atenção especial para o ensaio. Não só por
conta de dores, que impediam que Manoel ficasse mais de três minutos em pé, mas
para que se soltassem e confiassem no fotógrafo.
Antes
de clicar os idosos, Moura conta que passou uma tarde conversando com o casal.
“Acho muito importante a aproximação com o cliente, conhecer. Se não tenho o
mínimo de confiança do cliente, como vou tirar a sinceridade da pessoa,
enxergar isso? A gente deu muitas gargalhadas. Conversamos sobre tudo, menos
fotografia.”
João e Angélica, casados há 70 anos, em ensaio
fotográfico (Foto: Victor Moura/Reprodução)
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No
dia das fotos, Victor dizia já ter intimidade suficiente para fazer
brincadeiras com o casal. “O seu Manoel é durão. Essa dureza aí foi quebrada.
Quando você trata eles, não como um casal de idosos, mas como pessoas normais,
eles se sentem à vontade”, afirma.
“Acho
que esse humor na prévia, essas brincadeiras, as coisas que tento fazer para
que se sintam à vontade, faz mostrar quem eles realmente são. Não tem nada
demais nas fotos. O que tem é a sinceridade”, diz. “O fato deles ficarem à
vontade no ensaio faz eles mostrarem o real carinho que existe. Não tem uma técnica,
'façam isso, tem que fazer tal coisa'. Não acredito muito nessas formas de
bolo. É deixar acontecer e deixar rolar.”
João
e Angélica
O primeiro ensaio com idosos foi com os pernambucanos João Antônio de Oliveira, de 92 anos, e Angélica Gomes de Meneses, de 88, em comemoração aos 70 anos de união. Moura disse ter se emocionado com a cumplicidade do casal, que vive sozinho em Taguatinga e divide as tarefas da casa. “Quando fui deixar as impressões para a dona Angélica, ele estava lavando o banheiro e ela lavando a cozinha e fazendo comida.”
O primeiro ensaio com idosos foi com os pernambucanos João Antônio de Oliveira, de 92 anos, e Angélica Gomes de Meneses, de 88, em comemoração aos 70 anos de união. Moura disse ter se emocionado com a cumplicidade do casal, que vive sozinho em Taguatinga e divide as tarefas da casa. “Quando fui deixar as impressões para a dona Angélica, ele estava lavando o banheiro e ela lavando a cozinha e fazendo comida.”
Oliveira
diz que pediu a mão de Angélica para o pai quando ela tinha 19 anos e ele, 21.
Em sete décadas, o casal teve dez filhos, três dos quais faleceram. Ele afirma
que o segredo para um casamento longo é amor, paciência, e respeito. "Dou
graças a Deus porque o senhor ouviu minha voz. Não posso viver sem ela",
diz ele.
Em
entrevista ao G1 com a participação de Moura , Angélica diz que faria tudo
novamente. "Às vezes ele faz uma coisa boa, e eu falo: 'Se eu morrer e
voltar, ainda caso com você'", diz ela. "Ele vive com medo que eu
possa morrer, porque vou morrer qualquer dia."
Moura,
que é recém-casado, diz que conseguiu transferir para a vida dele o que
aprendeu com o casal. “Acho que, nessa fase, pude perceber que amor e paixão
são duas coisas diferentes. Creio que paixão são constantes demonstrações de
afeto, um sentimento belo e importante, porém oscilante. Já o amor, o amor é
consciente e não cego, nos faz decidir ser pacientes e bondosos, nos faz suportar
e crer, ele é demonstrado no dia a dia, nos mais simples gestos, no ato de
cuidar, tratar e nos leva a fazer algo que talvez seja um dos mais importantes
atos: perdoar.”
João e Angélica, casados há 70 anos, em ensaio
fotográfico (Foto: Victor Moura/Reprodução)
Mais do que uma
terapia para o autor das imagens, Moura acredita que os idosos também tiveram
um dia de "encontro romântico". “No final do ensaio, deu para ver, no
olho deles, que eles ficaram felizes com aquele contato. No final agradeceram,
ficaram unidos, e deu para ver que é como se estivessem lembrando de uma
plantinha de paixão. Porque, às vezes, no dia a dia, a gente perde o hábito de
ficar se abraçando com aquele carinho. Esse dia foi o dia que tiveram para ter
um encontro romântico."
Fonte: Isabella Formiga - Do G1 DF