Há uma visão dominante, marcada por
nossa experiência cotidiana e dados, de que o Plano Piloto concentra a maioria
dos empregos do Distrito Federal e que prevalece a dinâmica de região
mononucleada, circundada por cidades-dormitório, com movimento pendular de
pessoas entre periferia e centro. Argumentamos aqui que esta não é a única
forma de se ver a cidade. Podemos pensar a cidade polinucleada e de trânsito
circular intenso de pessoas entre Regiões Administrativas (RAs), e não só
radial, centro-periferia?
Os dados
da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad) de 2013 da Codeplan nos
mostram a cidade por esse ângulo. Há uma realidade ignorada que apresenta uma
cidade diferente. A pesquisa identifica os locais de moradia e de trabalho das
populações de todas as RAs do Distrito Federal. Quando fazemos esse cruzamento,
descobrimos alguns números interessantes que jogam luz a outras dinâmicas de
movimentação populacional diária.
Sim, a
maior parte dos habitantes do Distrito Federal, 43%, trabalha no Plano Piloto.
Mas isso é menos da metade. Desses, parcela significativa mora no próprio Plano
Piloto (17%). Se somarmos lagos Sul e Norte, Sudoeste/Octogonal, Cruzeiro, Park
Way e Jardim Botânico, áreas nobres e centrais, chegamos a 30%. Expandindo um
pouco mais esse núcleo para incluir Guará, Águas Claras e Sobradinho II, que
concentra vários condomínios de classe média e alta, chegamos a 45% do
contingente de trabalhadores do DF. Ou seja, menos da metade da população do DF
trabalha no Plano Piloto e quase a metade dos que trabalham moram também nas
regiões centrais.
A
porcentagem que se locomove das cidades mais periféricas para o centro é,
portanto, minoritária. O grosso dos problemas de mobilidade que afetam o Plano
Piloto com superpopulação de carros é resultado do comportamento de segmentos
sociais que moram no centro e, provavelmente, pela falta de oferta de
transporte público de qualidade para esses setores.
A
pergunta óbvia é, e o resto da população? É válido verificar se há outros polos
de geração de empregos. Taguatinga é o local de trabalho de 8% da população e
Ceilândia responde por 7%. Dos que trabalham em Taguatinga, 44% moram na
própria cidade, 11% se locomovam de Ceilândia, 16% de Vicente Pires, 9% de
Águas Claras, 9% de Samambaia, 9% de Recanto das Emas e 10% de Riacho Fundo II.
Já em Ceilândia, 37% moram na própria cidade e esta absorve mão de obra de
Taguatinga (4%), Brazlândia (2%), Samambaia (3%) e Vicente Pires (5%). Ou seja,
há outros polos que atraem trabalhadores de distintas localidades do DF, em
fluxo contrário ao Plano Piloto.
Outro
dado interessante: na média entre as RAs, 30% dos trabalhadores não estão
empregados na cidade em que mora nem no Plano Piloto, indicando grande
movimento de pessoas entre distintas RAs. Além disso, 8% da população do DF
trabalham em várias localidades. Há grupo relevante de pessoas que se locomovem
entre RAs, em estrutura de mobilidade muito mais clara de rede, circular, do
que pendular.
Outra
forma de entender esse fenômeno é também observar a porcentagem de pessoas que
trabalha na própria RA em que habita. Em média, 28% da população de cada RA
trabalham na cidade em que mora. Esse valor varia de 90% no Plano Piloto até 7%
no Sudoeste. Contudo, há alguns casos intermediários importantes. Nas cidades
mais distantes, como Fercal, Brazlândia, Sobradinho, Gama, Planaltina, em média
47% das populações trabalham na mesma cidade em que moram. Como vimos, algo
semelhante ocorre em Taguatinga e Ceilândia. Ou seja, em alguns casos, a cidade
deixa de ser apenas dormitório.
E, como
os dados da Pdad de 2015 começam a mostrar, quem trabalha na cidade que mora
tende a usar menos o carro para se locomover e a usar mais bicicleta, ônibus e
a andar a pé. Dados de 2015 já consolidados para 10 regiões administrativas do
DF localizadas mais distantes do centro mostram que entre os que trabalham na
própria RA em que moram, na média, 40% vão a pé para o trabalho. Isso
representa o dobro dos usuários de carro e de ônibus, empatados em 22%.
Em suma,
uma outra cidade é possível. Os dados acima permitem vislumbrar outro Distrito
Federal, mais integrado, com dinâmica circular e não só radial de mobilidade
urbana, com distribuição maior da força de trabalho pelo território e com o uso
de modos de transporte variados nos locais onde pessoas moram e trabalham.
Avançar nessas direções não é só necessário e possível, é plausível.
Por:Lucio Rennó - Cientista
político e presidente da Codeplan – Fonte: correio Braziliense –
Foto/Ilustração: Blog - Google
Importante pesquisa, espero que seja usada nos estudos e ações de mobilidade do DF.
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