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#SAÚDE » A sombra da Aids na capital federal

Gabriel Estrela, soropositivo, acredita que a falta de interação entre duas gerações pode trazer falhas no cuidado com a doença futuramente

Há quase 11 mil pessoas soropositivas em Brasília. No geral, os números caíram entre 2014 e 2015, mas dois grupos específicos estão mais vulneráveis: jovens e gestantes. Especialistas preocupam-se com a falta de informação sobre a doença

Desde a identificação dos primeiros casos de Aids, em 1981, a sociedade se reinventou um sem número de vezes. Acompanhou o fim da Guerra Fria, testemunhou a revolução da internet, a queda do Muro de Berlim e a Primavera Árabe. Nesse intervalo, nasceram Sônia* e Carlos*. Os dois não se conhecem, mas têm um diagnóstico em comum: são soropositivos. Na capital federal, há 10,9 mil pessoas nessa condição. Somente no ano passado, outras 327 receberam a confirmação da doença — 21% menos que em 2014, quando ocorreram 414 casos. Apesar dos números otimistas, o mal tem acometido dois grupos sensíveis: gestantes e jovens.

Após três décadas e meia de pesquisa, há a certeza do causador da doença — o retrovírus HIV —, dos indicativos de como ela se disseminou e do modo de ação. Como resolver o quebra-cabeça ainda é um mistério. Nos últimos quatro anos, 1.858 pessoas tiveram o diagnóstico na cidade. Em 2015, Taguatinga, Ceilândia, Asa Norte, Planaltina e Águas Claras concentraram 46% das 327 infecções. Juntas, as regiões contabilizaram 152 novos soropositivos.

A Aids é a segunda infecção que mais faz vítimas no mundo, atrás apenas da tuberculose, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No início da década, acreditava-se numa feminização da doença. Entretanto, a perspectiva não se consolidou. A cada um caso em mulheres na cidade, há quase cinco em homens. Os adultos entre 20 e 34 anos são os mais acometidos — cerca de 61% das notificações em seis anos ocorrem na faixa etária.

Até o ano passado, nove unidades de saúde disponibilizavam tratamento nas 31 regiões do DF. O Executivo local inaugurou outros três locais em Samambaia, Paranoá e Recanto das Emas. Apesar do investimento, a Secretaria de Saúde admite falhas. Sérgio D’Ávila, coordenador do Programa de doenças sexualmente transmissíveis/Aids, avalia que as estratégias governamentais não acompanharam o avanço das contaminações. “A busca por direitos básicos colocou muitas questões explícitas que antes eram colocadas para debaixo do tapete”, critica.

Alerta
Aos 18 anos, numa tarde de quarta-feira, Carlos conheceu o diagnóstico de HIV positivo. Hoje, com 34, testemunha toda uma geração recebendo a mesma notícia. O índice de jovens entre 15 e 19 anos com o vírus saltou de 6 casos para 40 no período. “Sou branco, heterossexual, de classe média, sem vícios e sou soropositivo. Descobri jovem e realmente não faço ideia de como contraí. Não levava uma vida desregrada naquela época, mas aconteceu. Não acreditava que eu poderia ser vítima, assim como muita gente hoje em dia”, lamenta o técnico em computação. Atualmente, ele está no sexto mês do tratamento de tuberculose.

Vicky Tavares,  67 anos, é presidente da Vida Positiva, instituição dedicada a cuidar de pessoas com a infecção. Para ela, houve “uma banalização do vírus”. “Já estou preocupada com uma possível nova pandemia. As pessoas pensam que é só tomar o remédio e tudo está resolvido. Deixamos o assunto para depois. É preciso dialogar e esclarecer essa questão para uma geração que não viveu o ápice da Aids”, alerta.

O ator e diretor de teatro Gabriel Estrela, 24 anos, descobriu ser soropositivo em 2010. Não escondeu a doença. O jovem acredita que existe um descompasso no processo de educação para a saúde. “A doença aparecia em estágios muitos avançados. Isso causou um pânico muito grande. Todas as ações eram baseadas no medo da morte. Hoje, isso não ocorre mais. Junta-se a isso uma geração que não conviveu com a época dramática e outra que não soube transpor os conhecimentos. Estamos falhando com o futuro”, argumenta.

Risco
Em agosto de 2012, a vendedora Sônia, 26, esperava a única filha Lara*. Naquele ano, a personagem integrou um grupo de 44 gestantes que tiveram o diagnóstico de Aids. De lá para cá, 12,7% do total de casos são de mulheres grávidas, ou seja, risco dobrado. De acordo com estimativas do Ministério da Saúde, o contágio vertical — quando a mãe transmite para o filho — caiu 80% em uma década. Na capital, a última situação ocorreu em 2014.

“Eu iniciei minha vida sexual muito cedo. Na minha casa, não se falava no assunto. Levei três anos para contar para a minha família. Não aceitaram. Minha mãe separava até o talher com que eu comia”, conta a moradora da QND 56, em Taguatinga. Para evitar a contaminação da filha, atenção redobrada. “Fiz todo o pré-natal, parto cesariano e não amamentei. Lara tomou xarope antirretroviral durante um período”, detalha. Segundo a Secretaria de Saúde, todos os casos de gestantes com HIV positivos ocorridos entre 2012 e o ano passado foram identificados antes do parto.

João Geraldo Netto, do Departamento de DST/Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, o diagnóstico em gestantes é compulsório, ou seja, não há como a paciente não saber, desde a implantação da Rede Cegonha. “Esse índice é preocupante pelo risco de infecção do bebê”, avalia. Cerca de 90% da população sabe do poder de prevenção. Entretanto, apenas 40% usam. Nos últimos dois anos, houve mudanças no tratamento disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em vez de 23 comprimidos no tratamento antigo, hoje é apenas um. “O essencial é se medicar. Deixar de se tratar é um suicídio lento e coletivo”, esclarece João.

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Fonte: Otávio Augusto – Foto: Minervino Junior/CB/D.A.Press – Correio Braziliense 

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