Ruas sem asfalto, iluminação ou rede de esgoto na Estrutural (acima) e
no Sol Nascente: precariedade
"Para tentar resolver o problema de deficit de casas no Distrito Federal,
o GDF lançará, no próximo sábado, o Habita Brasília. O programa vai se
estruturar na venda de lotes com valor subsidiado e na participação da
iniciativa privada"
A distribuição gratuita de lotes não urbanizados
motivou o surgimento de uma geração de políticos e elegeu dezenas de
candidatos, mas não resolveu o problema do deficit habitacional na capital do
Brasil. Pelo contrário: a oferta indiscriminada de terrenos atraiu ainda mais
gente em busca da casa própria e fez disparar a fila de espera por uma moradia.
Há cerca de seis anos, a política habitacional do DF mudou e a entrega de lotes
foi definitivamente encerrada. O GDF passou a enfocar o programa Minha Casa,
Minha Vida, do governo federal.
A ideia era financiar imóveis prontos com condições
vantajosas à população de baixa renda. Mas, desde então, o deficit cresceu 25%,
especialmente entre as famílias mais pobres, que não conseguiram acesso ao
crédito. Agora, o governo lançará mais uma iniciativa para tentar mitigar o
problema. O Habita Brasília, novo programa oficial de moradias, será anunciado
no próximo sábado pelo governador Rodrigo Rollemberg.
O novo programa tem cinco frentes de atuação (veja
Em busca da casa própria). A produção de unidades habitacionais, prevista no
Minha Casa, Minha Vida e no Morar Bem, do GDF, será mantida, mas deixará de ser
a única política de moradia. Uma das novidades é a venda de lotes urbanizados
com valor subsidiado. O objetivo é fazer parcelamentos em áreas com
infraestrutura consolidada e vender os terrenos a preços que não tragam lucro
ao governo, mas que remunerem o valor da gleba, os investimentos para urbanizar
a região e os custos com licenciamento, para que não haja prejuízos aos cofres
públicos. Os lotes serão financiados com prestações baixas, e os compradores
terão apoio na construção das casas.
Essa assistência técnica é o terceiro eixo da nova
política habitacional. O governo quer oferecer assessoria profissional e
projetos arquitetônicos e de engenharia para que os futuros moradores, sozinhos
ou em esquema de mutirão, construam as residências com segurança e seguindo
padrões. O GDF abrirá 10 postos de atendimento em várias cidades para que
especialistas prestem esse serviço.
Há, ainda, outras duas novidades, que envolvem a
participação da iniciativa privada. A primeira delas consiste em uma parceria
com empresas da construção civil. A ideia é que os empreiteiros ofereçam
apartamentos prontos ou em fase final de construção a pessoas inscritas na Companhia
de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (Codhab). O governo poderia
subsidiar parte do imóvel, fazendo o pagamento por meio de cartas de crédito,
por exemplo. No caso de um apartamento orçado em R$ 225 mil, por exemplo, que é
o teto do valor permitido para imóveis do Minha Casa, Minha Vida, o GDF poderia
repassar à empresa R$ 25 mil, para que o cadastrado compre o apartamento com
desconto, por R$ 200 mil. Para essa modalidade, é preciso fazer ajustes à
legislação e definir detalhes de como será feito o pagamento do subsídio.
A última novidade do Habita Brasília é a locação
social. Essa modalidade é distinta do pagamento do aluguel social, que assegura
o repasse de R$ 600 mensais para famílias desalojadas por conta de derrubadas
ou desmoronamentos, por exemplo. Essa frente da nova política habitacional
prevê a construção de empreendimentos pela iniciativa privada em modelo de
permuta. O GDF cede o terreno, os empresários fazem a edificação e podem
explorar parte dos imóveis, cedendo outros para serem alugados a preços
subsidiados.
Priorizar
O secretário de Gestão do Território, Thiago de
Andrade, explica que o Habita Brasília surgiu a partir da necessidade de
diversificar soluções de moradia. “Há um esgotamento do modelo proposto pelo
programa Minha Casa, Minha Vida. É preciso buscar essa diversificação, porque a
ideia é fazer cidades, não apenas casas”, afirma o secretário. Ele estima que,
até o fim de 2018, é possível chegar ao patamar de 30 mil unidades entregues.
O presidente da Codhab, Gilson Paranhos, também faz
críticas ao enfoque excessivo na iniciativa. “O Minha Casa, Minha Vida não foi
pensado apenas com o objetivo de combater o deficit habitacional, mas para
atender a construção civil e movimentar a economia”, comenta Paranhos.
A legislação habitacional do Distrito Federal
permite a inclusão de pessoas com renda de até 12 salários mínimos nos
programas de governo para moradia. “Mas, se levarmos em conta essa faixa, mais
de 80% da população teria direito a participar dos programas habitacionais. Por
isso, é preciso priorizar as iniciativas para contemplar as pessoas nas faixas
mais baixas de renda”, justifica Thiago. Hoje, cerca de 30% da população do DF
está enquadrada na faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida, com renda de até R$ 1,8
mil.
Enfoque
O público-alvo dessa iniciativa são pessoas acima
de 60 anos, em situação de rua, que vivem em áreas de risco ou que gastam um
percentual alto da renda com aluguel. A gestão condominial e dos contratos de
locação será feita por meio de concessão. A ideia é fazer contratos de 48
meses. Em uma simulação feita pelo GDF em Santa Maria, apartamentos de 1 quarto
alugados por R$ 500 poderiam ser locados pela metade do preço.
Elogios à iniciativa
O
vice-presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil, João Accioly,
diz que o setor comemorou a iniciativa. Ele acredita que o novo programa
ajudará a movimentar o segmento, fortemente atingido pela crise econômica.
“Recebemos o lançamento do Habita Brasília com bons olhos e estamos ajudando a
construir um formato que compatibilize todos os interesses”, explica. Segundo
ele, o setor imobiliário tem um estoque de unidades prontas ou em fase final de
construção, que pode se enquadrar nas faixas de financiamento do programa. “Com
o subsídio da Caixa Econômica e do Habita Brasília, um imóvel de R$ 220 mil
pode sair por R$ 180 mil para o mutuário. Isso é benéfico para o governo, para
a iniciativa privada e para quem vai conquistar a casa própria”, comenta.
As cidades com maior número de imóveis disponíveis
são: Samambaia, Ceilândia, Santa Maria e Gama. A princípio, os empresários não
devem construir empreendimentos apenas com foco nesse segmento do Habita
Brasília. “Mas, se as coisas se desenvolverem de forma positiva, é possível que
haja interesse em produzir ainda mais imóveis para atender essa demanda”,
acrescenta João Accioly. “O desafio do governo, agora, está na construção do
modelo desse subsídio complementar, para encontrar o formato ideal e seguro.” O
representante do setor produtivo conta que também deve haver interesse dos empresários
pelo modelo de locação social. “A gente já trabalha no mercado com esse modelo
de permuta. Vamos aguardar para ver que terrenos serão ofertados, para saber se
serão investimentos interessantes”, finaliza João Accioly.
A participação de cooperativas habitacionais na
política de moradias do DF é prevista em lei desde 2006. Mas as entidades ficam
com a imagem arranhada a cada denúncia envolvendo a exploração de pessoas na
fila de espera da casa própria. No último escândalo, revelado no mês passado, pela
Operação Clã, a Polícia Federal fez a condução coercitiva de presidentes de
cooperativas, empresários e de políticos, como o ex-secretário Geraldo Magela e
o ex-presidente da Codhab Rafael de Oliveira. Eles negam qualquer
irregularidade.
Remédio
O presidente da Associação dos Inquilinos de
Ceilândia, Epaminondas da Silva, uma das primeiras entidades habitacionais
criadas no Distrito Federal, apoia a criação do programa Habita Brasília, mas
cobra participação dessas organizações. Ele participou de uma reunião na
Codhab, na semana passada, para a apresentação prévia da iniciativa. “Qualquer
trabalho para reduzir o deficit habitacional é bem-vindo. A gente defende um
modelo verticalizado, com a oferta de apartamentos para a venda. Já a ideia da
locação social não é muito vantajosa. É como um remédio que tira a dor de
cabeça, mas não cura a doença. As pessoas querem casa com escritura para
resolver definitivamente o problema”, comenta. (HM)
Fonte: Helena Mader – Fotos:
Rodrigo Nunes/Esp.CB/Press – Correio Braziliense