Os campeões Wellington Fernandes do Nascimento e Marco Túlio Bites
Carvalho treinam na pista do Guará: luta em nome do esporte
"Brasilienses apaixonados pelo esporte incentivam os mais jovens a
aderirem à prática e, assim, retomarem a popularidade dos anos 1980. Há quatro
pistas no Distrito Federal, mas apenas uma está em boas condições"
Com a corrente tensionada e a explosão, a coroa e as duas rodas guiam os
pilotos pelos altos e baixos do circuito. Os pés giram nos pedais a toda a
velocidade que a tração pode produzir. O ponto de partida está um nível acima
do trajeto sinuoso. Do visor do capacete, os olhos contemplam a pista e, então,
a veloz descida que se desenrola segundos antes do primeiro salto. Pode ser um
torneio em Santa Maria, um treino no Guará ou apenas um momento de lazer em
Sobradinho 2. Em qualquer um dos casos, a adrenalina, a diversão e a amizade
estão presentes na prática de bicicross no Distrito Federal. A capital tem, no
total, quatro circuitos. O que apresenta melhor condição é a do Guará. Uma das
maiores, a de Sobradinho, no entanto, está desativada, tomada por mato, lixo e
entulho (veja Para esporte e diversão).
São
nesses cenários que os campeões Wellington Fernandes do Nascimento, 40 anos,
com mais de 10 títulos nacionais; e Marco Túlio Bites Carvalho, 41, com cinco
vice-campeonatos brasileiros e um título internacional, treinam e incentivam
crianças e adolescentes a aderirem à prática. São jovens como João Henrique
Vianna Ribeiro, 12, que se divertem nas curvas inclinadas ao mesmo tempo em que
sonham com troféus.
Esporte
popular no Distrito Federal na década de 1980, o bicicross perdeu espaço na
capital, que chegou a ficar sem pistas nos 10 anos seguintes. Entre 1990 e
2000, administrações regionais chegaram a ceder espaço para esses esportistas
próximo às obras do metrô na Feira do Guará e no Mercadão Leste, no Setor Leste
do Gama. Mas nenhuma delas durou muito tempo. Foi só no fim do século que se
inaugurou o circuito da QE 23 do Guará 2, na Avenida Contorno.
Wellington
recorda o dia em que subiu a rampa de partida de uma pista de bicicross pela
primeira vez. Ele começou a praticar o esporte aos 9 anos, em 28 de março de
1984, na antiga pista da 410 Sul. À época, tinha apenas o período de férias
para se divertir no circuito com os primos. “Lembro-me que um primo meu
participou de um torneio. No seguinte, eu já estava pedalando”, recorda. Nos
períodos “entrepistas”, Wellington chegou a abandonar o esporte por cerca de
dois anos, mas voltou com força total quando o trajeto do Guará ficou pronto.
“Eu não parei mais. Hoje, para mim, é um hobby. Mas eu continuo treinando.
Queremos melhorar a situação do esporte e das pistas no DF para que os mais
jovens possam aproveitar o quanto aproveitamos”, revela.
O plano
de Wellington e Marco Túlio é montar uma escolinha em cada uma das pistas do
DF. “À minha época, não tivemos nada estruturado, mas tinha pessoas
interessadas em nos treinar”, conta. Marco Túlio ressalta o prazer das corridas
e o fortalecimento dos laços de amizade nos campeonatos. Ele também começou a
praticar na pista da 410 Sul. “Tinha um piloto chamado Golfinho, que nos
ajudou. Hoje, temos de nos manter alertas para o cenário não enfraquecer no DF.
É um esporte para famílias. Conhecemos gente em todo o Brasil. Tenho amigos na
Colômbia também, além de pessoas que conhecemos em competições, mas que,
depois, recebemos em casa ou visitamos nas férias”, explica.
Para
Marco Túlio, a interação é “mais importante do que qualquer título”. “Ganhamos
amigos e irmãos. Agora, precisamos pensar na renovação. Gente nova, com
energia, para nos tornarmos mais fortes; por isso demos início a uma associação
em 2006”, destaca.
Revitalização
Aos 45 anos, o autônomo Diovani Ribeiro, que nunca pilotou uma BMX —
modelo de bicicleta menor e compacta usada no bicicross —, declara seu amor
pelo esporte radical. Morador de Sobradinho 2, ele apoia o esporte por causa do
filho. Estudante do 7º ano do ensino fundamental, João Henrique Vianna Ribeiro
começou a guiar a bike aos 9, por incentivo do pai e do tio. Nos últimos três
anos, conquistou dois títulos e um segundo lugar. “Queremos garantir espaços
para que jovens como o meu filho se sintam convidados a pedalar. Sem os
circuitos, não conseguimos disputar em pé de igualdade com competidores de
outros lugares. Os torneios também são cheios de surpresas, com pulos, quedas e
ultrapassagens”, conta.
O pai se
preocupa com o futuro do esporte no DF. Ele alerta que os maiores campeões
locais passaram dos 40 anos e que faltam pilotos de base em todas as regiões
administrativas. João Henrique concorda. Segundo ele, nas competições das quais
participou, só havia outro garoto da mesma idade. “Falta gente do meu tamanho
nos campeonatos. Parece que, no DF, as pessoas pensam muito em futebol e
esquecem que existem outros esportes. Eu comecei com uma BMX, brincando com
amigos, mas o meu tio me incentivou a treinar. Sentimos adrenalina, vontade de
correr, pular. É algo que não quero parar de fazer nunca”, diz o garoto.
O
administrador regional de Sobradinho, Divino Sales, afirma que é difícil
estipular um prazo para a revitalização da pista de bicicross da cidade.
Segundo ele, a administração enfrentou uma série de percalços, que atrasaram a
obra. Agora, busca alternativas para recuperar o tempo perdido. “Chegamos a
mandar limpar o local, mas o projeto para colocar a pista dentro dos padrões
oficiais é muito caro. Decidimos, então, revitalizar o que temos, mas estávamos
sem maquinário. Fizemos um contrato, e esse problema foi resolvido. Agora,
buscamos a terra adequada para os trabalhos. Uma hipótese é conseguirmos uma
licença do Instituto Brasília Ambiental (Ibram) para extrair o material, que
não temos. Outra, mais simples, é aproveitar o que for extraído em construções
em Sobradinho”, conclui.
“Queremos garantir espaços para que jovens como o meu filho se sintam
convidados a pedalar. Sem os circuitos, não conseguimos disputar em pé de
igualdade com competidores de outros lugares”
(Diovani Ribeiro, pai de João Henrique, praticante da modalidade)
Outra modalidade
Na bicicross, pilotos de bicicletas BMX enfrentam um circuito fechado
com rampas para saltos e curvas sinuosas. Na mountain bike, ciclistas usam
bikes de marcha, maiores, mais leves e resistentes. Percorrem trajetos
geralmente abertos e bem mais longos. O tipo de esporte testa a destreza de
praticantes em subidas árduas e descidas acentuadas em trilhas acidentadas de
cerrado, por exemplo. Recentemente, os praticantes ganharam um trajeto de
treino fechado e urbano da modalidade, no DF, conhecido como XCO. A pista tem
obstáculos como pedras, aclives e declives, além de um viaduto de palete que
pode deixar o percurso maior ou mais curto, dependendo do caminho escolhido. O
espaço fica em Águas Claras, próximo ao viaduto do metrô e da administração
regional, e pode ser utilizado para treino ou lazer.
Fonte:Luiz Calcagno – Foto: Carlos Vieira/CB/D.A.Press – Correio
Braziliense