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Senador Cristovam Buarque: Falta o Brasil

Na véspera de sediar o maior espetáculo da Terra, o Brasil se transformou em um país de chacotas no exterior. Despois de 30 anos de democracia, estabilidade monetária e crescimento econômico continuamos como um dos mais desiguais, mais deseducados e mais violentos países do mundo. Também passamos a nos mostrar como dos mais corruptos, descuidados e ridículos. A Lava Jato mostra todos os dias diálogos e valores astronômicos de deboche e de roubalheira; os governos de estados e municípios estão quebrados financeiramente (ao ponto que na véspera das Olimpíadas, o Rio se declara em estado de calamidade); a saúde pública caótica com enfermidades assustadoras, do tipo microcefalia, por causa da falta de saneamento; a economia em recessão, empobrecendo a população pela queda de renda e provocando a tragédia do desemprego. A sociedade dividida politicamente em grupos sectariamente opostos; a população desiludida com seus líderes políticos.
Temos o ridículo do policial que prendia os corruptos sendo preso por corrupção, e ainda mais grave assisti-lo condenado, mas trabalhando como policial, usando tornozeleiras eletrônicas durante o expediente. Temos uma crise política que desmoraliza os poderes Executivo e Legislativo; um processo de impeachment que nos deixa com dois presidentes; e as ameaças legais que nos deixam sem dirigentes sólidos na Câmara e no Senado, sujeitos a suspeitas e até a pedidos de prisão.
As coisas não vão bem no Brasil e a causa não é uma guerra inevitável, uma catástrofe natural inesperada, pobreza por falta de recursos, erros de um ditador há anos no poder. Dispomos de recursos, temos uma natureza rica e estável, com raros e localizados períodos de seca, mas quase sem desertos, terremotos destruidores, tsunamis devastadores; vivemos em paz – estamos livres, até aqui, até mesmo do terrorismo e temos uma democracia de três décadas, o que teoricamente deixaria a sociedade com condições de corrigir os erros do passado e reorientar o futuro. Mas não estamos conseguindo fazer isso. No lugar, usamos a democracia para provocar imensos erros que emperram a economia, desmoralizam o Brasil no cenário internacional, desagregam a sociedade.
Qualquer observador atento, no país ou no Exterior, se pergunta onde erramos, como deixamos isso acontecer. Provavelmente, a resposta está no fato de que a política tem esquecido o Brasil. Alguns fazem política para locupletarem-se, enriquecerem pela corrupção; outros, para se manterem no poder a qualquer custo; e os outros, para atenderem interesses de grupos que representam. Raríssimos fazem política pensando no bem maior do conjunto da população. Os bons e honestos políticos brasileiros representam interesses de categorias no presente, não os interesses nacionais no futuro. Por isso, defende-se aumentos salariais e benefícios que não cabem no orçamento, e certamente causarão inflação; obras que custarão valores superiores ao possível para beneficiar interesses locais e mesmo permitir propinas; ações que passam ilusões de grandeza, sem deixarem resultados positivos permanentes.
"O Congresso é dividido em bancadas de segmentos sociais, não há bancadas do Brasil como um todo e em sua perspectiva histórica."
O processo de impeachment é um exemplo. Se os políticos e o Governo dos últimos 13 anos tivessem pensado no Brasil e não nas categorias e em setores específicos, não estaríamos hoje tendo de escolher entre a tragédia da interrupção do mandato de uma presidente eleita ou a tragédia da continuação de seu mandato por mais quase três anos. Os dois governos do PT tentaram articular todos os segmentos do país com bolsas e cotas para os pobres, salários para os trabalhadores, lucros para industriais e banqueiros, subsídios aos consumidores, mas sem um projeto nacional para todos os brasileiros no futuro. Por isso preferiram mais escolas no ensino superior a melhores escolas no ensino básico. E esta escolha, hoje, no Senado parece se fazer por um debate entre os grupos que nunca aceitaram estes governos e aqueles que sempre os defenderão. Estes são incapazes de reconhecer que “não dá mais”, os outros não refletem sobre os custos históricos de mais um presidente destituído entre os quatro que foram eleitos nestes menos de 30 anos. A política está perdida por falta do mais óbvio tema que deveria preocupar os políticos: o Brasil.

*Cristovam Buarque é Professor Emérito da UnB e Senador pelo PPS-DF.

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