Não se iludam. A indústria da
invasão de terras públicas que tantos transtornos vem trazendo para o
ordenamento urbano do DF é filha primogênita da emancipação política
introduzida na capital. Os outros descendentes diretos desse arranjo maledetto
são os escândalos de corrupção contínuos, a divisão da cidade em currais
eleitorais, a sangria do dinheiro público para sustentar um esqueleto
burocrático artificial e inoperante, além dos conflitos violentos e
generalizados opondo pessoas de diferentes legendas, inclusive com a ocorrência
de crimes e ameaças contra a vida.
Para uma cidade, planejada com esmero visionário, a
introdução das mesmas mazelas administrativas que sempre assolaram o restante
do país significou um recuo no tempo, não pelo processo político representativo
em si, necessário, mas, sobretudo, pela qualidade pessoal dos agentes
envolvidos.
Democracia com qualidade só é possível com
representantes de qualidade. Usada como moeda de troca, no toma lá dá cá da
aritmética malandra, as terras e os espaços públicos da capital foram sendo
loteados entre as legendas, enquanto se buscava, por meio da feitura de leis
marotas, aplainar os caminhos para a regularização veloz desses espaços.
A partir de 1990, num espaço de poucos anos, a
cidade começou a experimentar um inchaço populacional, com gente de todos os
cantos se transferindo para capital, por conta das notícias de que por aqui
bastava assegurar o voto em determinado candidato para garantir um lote nos
inúmeros condomínios que se formaram da noite para o dia. Como consequência, os
brasilienses passaram a conviver com o aumento assustador da violência urbana,
colapso no fornecimento de água e luz, hospitais agonizando e escolas públicas
superlotadas. Paralisações e greves políticas frequentes, além da costumeira
malversação dos recursos públicos e da corrupção disseminada na máquina
administrativa.
Enquanto uma reforma política séria e profunda não
for posta em prática, continuaremos tendo que optar entre a paz dos cemitérios,
própria das ditaduras, e o alvoroço vivo da representatividade, embora feito
por gente que não enxerga além do próprio umbigo.
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A frase que foi pronunciada
“Se para tirar a carteira de
motorista fiquei tão nervosa, imagine o que sente a Dilma Rousseff hoje, quando
vão lhe tirar o governo!”
(Ju Borges, de Brasília)
Por: Circe Cunha – Coluna “Visto,
lido e ouvido” – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto: Felipe
Falchi Ando - Ilustração: Blog - Google