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PAIS DE OURO - - - (Wilson Ribeiro vendeu rifas para garantir que o filho, o atleta paralímpico Sérgio Froes, continuasse na equitação)

Wilson Ribeiro vendeu rifas para garantir que o filho, o atleta paralímpico Sérgio Froes, continuasse na equitação e faz questão de acompanhar todas as competições: "Meu garoto me mostrou que tudo é possível"

É impossível se tornar atleta olímpico sem apoio. E o mais importante vem dos primeiros fãs: os pais. Eles estão juntos na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na derrota e na vitória, e não medem esforços para garantir as melhores chances para os filhos

As conquistas de medalhistas olímpicos e paralímpicos são construídas por incontáveis elementos. Dedicação, disciplina, renúncia, treinos exaustivos, estudos. Mas entre os ingredientes da mistura que forma um grande campeão está um elemento fundamental. Os pais. Em meio a adversidades financeiras e portas fechadas, eles estendem as mãos aos outrora utopistas e dão forma aos sonhos dos filhos. A confiança e o suporte embalam até mesmo os atletas menos pretensiosos e a ajuda transforma­se, então, em sequenciais subidas ao pódio.

A arremessadora de dardos, discos e peso Shirlene Coelho, faz parte do expressivo grupo de esportistas impulsionados pelos pais. Aos 30 anos, ela participará da terceira paralimpíada da carreira. O sucesso refletido na arena de atletismo é, em grande parte, fruto do suor de Dagmar Coelho. Enquanto a filha dedicava­se à carreira esportiva, o senhor de 54 anos trabalhava de domingo a domingo, como motorista, para ajudá­la financeiramente. O esforço impediu, por diversas oportunidades, que o pai acompanhasse a filha nos treinos ou a assistisse em campeonatos. Durante os jogos paralímpicos, o cenário não será diferente — Dagmar terá que permanecer em Brasília. Todavia, ele garante: “Acompanharei minha campeã pela TV ou pelo rádio. Estarei lá em coração”.

Quarto lugar na marcha atlética nas olimpíadas, o brasiliense Caio Bonfim atribui o sucesso aos pais

O amparo emociona Shirlene. Vítima de paralisia cerebral desde o nascimento, a moça convive com limitações na parte esquerda do corpo. A dificuldade, entretanto, nunca a fez pequena perante os olhos do pai. “Ele nunca me tratou como se eu fosse uma coitada. Ao contrário. Incentivou e mostrou que, apesar de tudo, eu poderia ser a melhor em tudo que fizesse”, comenta. O encorajamento foi efetivo. Hoje, a mulher que sequer sonhava em tornar-se paratleta guarda uma bolsa abarrotada de medalhas. Com tantos campeonatos na conta e um instinto de superação que parece se renovar a cada dia, a paratleta é um dos maiores orgulhos de Dagmar. “Ela poderia ter desistido. Tinha tudo para ser comum, mas decidiu ser extraordinária. A disciplina é impecável. Treina quase todos os dias e merece todas as conquistas que alcançou”, conta o orgulhoso pai.

Além da dedicação, Shirlene conta, também, com uma vocação para o esporte. Ela costuma dizer que o atletismo a escolheu. Ao ingressar no Brasília Country Club, a moça visava, na verdade, uma vaga na equipe de serviços gerais da empresa. A esportista não conseguiu o emprego, mas recebeu um convite para ingressar no basquete em cadeira de rodas. A adaptação não ocorreu e, um ano depois, Shirlene recebeu uma oportunidade de participar do lançamento de discos. 

Após três meses de treino, a paratleta participou do campeonato regional de Minas Gerais e venceu as três categorias nas quais compete atualmente — lançamento de dardo, disco e peso. “O engraçado é que eu nunca tinha lançado dardos. Ainda assim, quebrei o recorde brasileiro. Foi neste momento que me apaixonei pelo esporte”, conta. Tamanho talento é o que faz Dagmar acreditar que a desportista está pronta para a Rio­2016. “Tenho certeza que a vitória será dela. Penso até que pode quebrar o próprio recorde”, opina.

Paixão de família
Dentre os medalhistas há também aqueles que já nasceram em berço esportivo. É o caso de Caio Bonfim. Treinado pelos pais, o atleta defende as cores do Brasil em Olimpíadas pela segunda vez. Na última sexta-­feira, conquistou a quarta colocação na disputa de 20 quilômetros da marcha atlética. O bronze escapou por pouco — a diferença entre ele e o terceiro colocado foi de apenas cinco segundos. Sem muito descanso e em ritmo olímpico, Caio ainda enfrenta uma nova disputa em busca do   ouro — desta vez, nos 50 quilômetros do esporte. A trajetória do garoto de 24 anos é narrada pelo seu maior entusiasta: o pai. Com brilho nos olhos e emoção na voz, João Sena, 60 anos, conta que, desde cedo, sabia que Caio seria um campeão nato. “Ele sempre se comprometia a ser o melhor em tudo que fazia. Com a marcha, não foi diferente”.
O motorista Dagmar Coelho trabalhou dobrado para garantir que Shirlene continuasse no atletismo

Sena conta que Caio sempre se dedicou aos esportes. Durante a adolescência, jogava futebol pelo Brasiliense. Mal aproveitado no time, ele decidiu seguir os passos do pai e aderir ao atletismo. O talento para a marcha atlética, no entanto, é resultado da influência da mãe — Gianetti Oliveira é octacampeã brasileira na categoria. “Ele sequer precisou que alguém o ensinasse a marchar. Foi natural. Quando percebermos que ele tinha um dom, eu e a minha esposa começamos a elaborar os treinos”, comenta. A parceria deu certo e, hoje, o professor Sena, como é conhecido, acompanha de perto as vitórias do filho. “Ser treinador de um atleta olímpico já é emocionante. Imagine, então, ser o técnico do seu filho e vê­lo conquistar o mundo”, complementa.

A bela história, porém, não é composta apenas por bons momentos. O custo para manter um atleta de alto nível é alto. Ainda mais no Brasil, onde as oportunidades são escassas. As quantias recebidas do governo, muitas vezes, não são suficientes, e o esportista precisa de uma fonte extra. Neste momento, muitos decidem abandonar a carreira e ingressar no mercado convencional. Caio passaria pela mesma situação, não fosse o constante esforço de do pai. “Me transformei em um verdadeiro “pai-trocinador”. Vendi itens pessoais, aumentei minha jornada de trabalho, fiz o que foi necessário. Eu não podia deixar um esportista tão bom passar sem ser reconhecido. E deu certo: hoje ele tem bons apoiadores e é considerado o melhor atleta masculino brasileiro da categoria”, comemora.

Após a conquista da quarta colocação na Rio­2016, emocionado, Caio exaltou o apoio dos pais. "Foram eles que fizeram com que eu chegasse até aqui. Não foi o país, não foram os patrocinadores, porque ninguém me apoiou direito. Foram eles, com suor, vendendo as coisas deles, se dedicando". 

Superação
Para outros, o esporte é uma forma de superação e reerguimento. O paratleta Sérgio Froes, praticante de hipismo na categoria de adestramento, ingressou na modalidade de forma discreta — a necessidade de equoterapia para o tratamento dos danos causados por uma paralisia cerebral o aproximou dos cavalos. A prática, porém, caiu nas graças do esportista após alguns treinos. Ao observar o gosto do filho pelo animal, Wilson Ribeiro ficou entusiasmado. Ele ajudou o pequeno hipista a comprar um cavalo corcel com a venda de rifas. A estratégia deu certo, mas os altos custos para manter o animal obrigou pai e filho a vendê­lo.

A perda, no entanto, não desanimou a família. Sérgio começou a passar mais tempo no clube em que treinava. A rotina árdua valeu a pena. Atualmente, ele coleciona medalhas e é referência aos que possuem quaisquer limitações e temem ingressar no esporte. “Meu garoto me mostrou que tudo é possível. Enquanto muitos pensavam que a deficiência o deixaria estagnado, ele trabalhava duro e se mostrava cada vez melhor. Hoje, é campeão mundial”, emociona-se.

Para a Rio­2016, a expectativa dos dois é positiva. Sérgio Froes garante que se preparou mais do que nas outras oportunidades olímpicas que teve, Pequim e Londres. “Estou pronto. Devido ao apoio dos meus patrocinadores tive todo o dinheiro e infraestrutura necessários”, afirma. O pai, que já viu a participação do rapaz em mais de cem campeonatos, garante que o frio na barriga ainda é o mesmo. “Ele é um exemplo. Tenho certeza que Sérgio voltará de lá com o único prêmio que falta na estante”, finaliza.


Fonte: Ana Viriato – Especial para o Correio Braziliense – Fotos: Helio Montferre/Esp.CB/D.A.Press – Arquivo Pessoal 

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