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#Entrevista: Maurício Miranda Promotor de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-Vida)

Maurício Miranda

Como o senhor avalia a investigação da Operação Mister Hyde?
A gente, primeiro, tem de esgotar tudo que diz respeito a OPMs (órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção). É claro que, à medida que as investigações vão andando, outros ramos da medicina especializada também têm aparecido, mas a gente não pode ampliar a investigação para todos os ramos, porque não há nem Ministério Público nem polícia suficiente para averiguar tudo. Mas eu digo que, a longo prazo, nós temos um caminho árduo a ser percorrido e estenderemos a todos os ramos.

E quanto aos suspeitos?
Nós estamos, agora, com a certeza de que existem mais médicos envolvidos, porque nós temos prova documental daquilo que foi apreendido na empresa TM Medical. Além disso, temos a documentação do Hospital Daher, que já tinha sido entregue de forma sigilosa. Quanto a outros hospitais, nós também temos notícia, até porque os próprios funcionários dessas empresas, nas oitivas que foram feitas nessas delegacias, disseram que esse sistema existe em quase todos dos hospitais de Brasília. Poucos, se for um ou outro só, que não estariam envolvidos.

E também há unidades da rede pública envolvidas?
Na rede pública, é outra investigação. Existe uma investigação que está sendo levada em conjunto com o Tribunal de Contas do Distrito Federal e com o Ministério Público do Tribunal de Contas do Distrito Federal.

Ou seja, não está descartada a possibilidade da participação de hospitais da rede pública no escândalo da Mister Hyde?
Não seria participação dos hospitais, mas dos gestores na compra de equipamentos superfaturados de OPMs. Ou seja, junto com as empresas, fazendo o superfaturamento.

No total, quantos profissionais vocês acreditam que estejam envolvidos, tanto na rede pública quanto na particular?
Essa quantificação só será feita no fim da investigação. Qualquer número, hoje, é totalmente imprevisível e difícil de dizer. Por enquanto, nós temos aqueles que foram denunciados. Temos a pretensão de fazer outras denúncias e agregar mais médicos ao crime de organização criminosa e vamos andando cada vez que a documentação e a prova se mostrarem nesse sentido.

O faturamento desses profissionais é superior a R$ 30 milhões?
Tem de considerar os parâmetros, mas, levando em conta um grupo desses, só de plano de saúde — eu perguntei quanto eles gastam com OPMs — eles disseram que o gasto nesse último ano foi em torno de R$ 200 milhões a R$ 250 milhões. Imagina que um custo desse, em que apenas 30% daria para fazer o efetivo pagamento, o resto tudo a gente pode considerar como superfaturamento.

Quais os crimes atrelados ao esquema?
Nós temos lesão corporal, que pode ser grave ou gravíssima, ou pode até ser levada a homicídio, se for considerado algum evento morte; crime contra a saúde, aquele que diz respeito à troca indevida de material e ao oferecimento de material fora do prazo; crimes de fraude, que correspondem ao superfaturamento; estelionatos, que serão denunciados; e organização criminosa, que já foram denunciados, em relação ao Hospital Home. E está sendo analisado pela Polícia Civil o crime de lavagem de dinheiro.

Quantos suspeitos devem ser denunciados à Justiça depois da segunda fase da operação, deflagrada na semana passada?
Não tem previsão. Na primeira fase, foram 19 denunciados, a Justiça acatou 17. E nós vamos ter de aumentar.

E qual é a quantidade de vítimas?
Vítimas não são só aquelas que estão lá. Considerando que houve superfaturamento em quase todos os procedimentos, então, em todos os casos, nós temos vítimas: ou o plano de saúde ou o próprio paciente. Nós temos, hoje, 100 vítimas que reclamam dos procedimentos realizados e dos insucessos, mas nós temos as vítimas financeiras do superfaturamento.

Mais envolvidos com a máfia das próteses
Investigação da Polícia Civil e do Ministério Público aponta para a participação de vários hospitais particulares do Distrito Federal no esquema criminoso, além de elo entre as redes pública e privada. Provas confirmam as suspeitas

O aprofundamento das investigações da Operação Mister Hyde revela um esquema maior do que o previsto. O promotor de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-Vida), Maurício Miranda, afirmou que “quase todos os hospitais particulares de Brasília” podem estar envolvidos de alguma forma no escândalo da máfia de próteses e órteses. “Poucos, se for um ou outro só, que não estariam envolvidos”, afirmou (leia Entrevista). Investigadores apuram, ainda, a suposta participação de gestores de hospitais da rede pública na compra de equipamentos superfaturados. Segundo a Polícia Civil, o médico Antônio Márcio Catingueiro Cruz, preso na primeira fase da ação, conectava as duas redes.

O titular da Delegacia de Combate ao Crime Organizado (Deco), Luiz Henrique Sampaio, confirmou que as evidências indicam o pagamento de propina como prática difundida na maioria das unidades privadas de Brasília. Há provas testemunhais fundamentadas que levantam essa suspeita. Apesar da investigação, o Sindicato Brasiliense de Hospitais, Casas de Saúde e Clínicas (SBH) considerou a informação do promotor e do delegado “generalista”. De acordo com a entidade representativa, há em torno de 40 hospitais particulares no DF e, segundo a superintendente Danielle Feitosa, nem todos fazem cirurgia com próteses e órteses.

Ela garantiu que cada unidade tem a própria prática comercial interna, e o SBH não interfere em relações comerciais em razão da proibição de alguns órgãos, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “O sindicato não tem conhecimento, não coaduna e não interfere em questões comerciais. As coisas devem ser apuradas e comprovadas. A sociedade, em uma situação como essa, fica muito fragilizada. Colocar todo mundo na mesma condição, considerando hospitais que nem cirurgia fazem, é muito abrangente e triste”, destacou.

O promotor Maurício Miranda destacou que a máfia das próteses é nacional, e Brasília está no topo. Uma das justificativas é a condição econômica na unidade da Federação. O delegado Luiz Henrique explicou que um levantamento mais abrangente no DF nos últimos cinco anos mostrou que o esquema movimentou cerca de R$ 40 milhões — R$ 10 milhões a mais do que o previsto inicialmente. “É um cálculo bastante conservador e se refere ao que foi repassado para médicos e clínicas criadas por eles. O aporte entra para as empresas fornecedoras de órteses e próteses pelos hospitais e planos de saúde, que compram os materiais. E saem para os fabricantes, no caso fornecedores, e empregados, para pagamento de impostos e participação em lucros. Mas um grande volume é receita para médicos e clínicas”, esclareceu o titular da Deco.

Provas
Só a TM Medical, de propriedade do médico Jhonny Wesley, movimentou cerca de R$ 2 milhões com a fraude nos últimos dois anos, segundo a apuração. “A nossa expectativa é que essa postura e comportamento venham a ser alterados e que os médicos se tornem mais cautelosos”, destacou o delegado. No entanto, ele confirmou que alguns alvos destruíram provas, e um inquérito está instaurado para investigar esse caso.

O advogado do médico Antônio Márcio, Getúlio Humberto Barbosa de Sá, alegou que a suspeita de o cliente dele ser o elo entre os hospitais públicos e particulares é “absurda”. “Ele nunca trabalhou com a rede pública. Sempre atuou na rede privada. Não é verdadeira essa informação. O Márcio não fazia intermediação. Ele chefiava um setor que era burocrático no contato com paciente, médico e planos de saúde”, argumentou.

A Secretaria de Saúde informou que, até o momento, não houve na investigação nada que atingisse a pasta, mas, caso apareça, o órgão está à disposição para apoiar no que for possível a investigação e, no âmbito interno, tomar as providências necessárias.
Entenda o caso
O Hospital Home (613 Sul) foi alvo na primeira fase da Operação Mister Hyde: evidências recolhidas

Cirurgias e propina
A investigação da Polícia Civil e do Ministério Público apura irregularidades em cirurgias com órteses e próteses em hospitais particulares do Distrito Federal. Há suspeita de mais de 100 pacientes submetidos a procedimentos operatórios desnecessários ou com material vencido e de baixa qualidade.

Até agora, estão identificados quatro grupos, todos eles com a participação clara de empresas e médicos. No primeiro, havia profissionais que encaminhavam pacientes para cirurgias sem necessidade. Em outro, especialistas e empresas trocavam os equipamentos. No terceiro, aqueles que acrescentavam equipamentos desnecessários para que a operação rendesse mais. E, no último, ficavam os que agiam no pagamento de propina aos envolvidos. 

A Operação Mister Hyde já teve duas fases. Em 1º de setembro, promotores e agentes cumpriram 21 mandados de busca e apreensão e 12 mandados de prisão. Médicos e empresários do ramo de órtese e prótese foram alvo da ação e atuavam no Hospital Home (613 Sul). Entre os fornecedores, estava o dono da empresa fornecedora dos materiais, a TM Medical, além de funcionários. Em 6 de outubro, promotores e investigadores da Delegacia de Combate ao Crime Organizado (Deco) cumpriram a segunda etapa da ação no Hospital Daher, no Lago Sul.
A segunda etapa se concentrou no Hospital Daher, no Lago Sul, um dos mais famosos da capital


Fonte: Isa Stacciarini – Fotos: Ed Alves/CB/D.A.Press – Ed Alves/CB/D.A.Press – Carlos Moura/CB/D.A.Press – Correio Braziliense 

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