E continua o drama da ponte que
liga o Plano Piloto e o Lago Sul: ela já foi Ponte Costa e Silva, Ponte Bezerra
da Silva (por conta de uma intervenção de artistas plásticos), Ponte Honestino
Guimarães e, agora, a Ponte Sem Nome. A Justiça do DF suspendeu o nome
Honestino Guimarães e, ao mesmo tempo, proibiu que o monumento volte a ser
chamado de Ponte Costa e Silva. E a justificativa é que ambas as escolhas não
foram precedidas de audiências públicas. Caberá à Câmara Legislativa abrir o
debate.
Por isso, desde já, gostaria de
lançar o meu candidato para nomear a ponte: Joaquim Cardozo! Oscar Niemeyer e
João Cabral de Melo Neto o consideravam o homem mais culto que conheceram.
Joaquim Cardozo, o engenheiro calculista parceiro de Niemeyer nos principais
projetos de Brasília, era um personagem singular. Lia em mais de uma dezena de
idiomas.
Oscar
Niemeyer, Joaquim Cardozo e Paulo Werneck na Pampulha, em 1944
Multiplicou-se nas figuras de
poeta, contista, dramaturgo, topógrafo, dramaturgo, professor universitário,
editor, crítico de arte, pianista e chargista. A arquitetura de Brasília
provocou espanto mundial, não apenas pela beleza de suas curvas barrocas, mas
também pela tecnologia das construções, que parecem desafiar a lei da
gravidade. Quando Niemeyer apresentou pela primeira vez os seus desenhos aos
engenheiros convencionais, eles sentenciaram que seria impossível transformar
aqueles croquis em edifícios sólidos e seguros. Só poderia encontrar parceria
afinada em um poeta do cálculo estrutural. Cada desenho do arquiteto era um
desafio que ele tentava resolver como se fosse encontrar a fórmula ideal de um
poema.
“As estruturas planejadas pelos
arquitetos modernos são verdadeiras poesias”, dizia Cardozo. Trabalhar para que
se realizem esses projetos é concretizar uma poesia. Para solucionar os
problemas, Cardozo teve de transgredir as normas vigentes. Na época em que
Brasília foi construída, os manuais de engenharia recomendavam o uso de, no
máximo, 6% de barras de ferro nas estruturas de concreto. Nas cúpulas do
Congresso Nacional, a sustentação se tornou possível por meio do recurso de
inserir uma trama de anéis de aço no concreto. No Palácio da Alvorada, ele
inseriu 20% de ferro nas colunas. Em vez de concreto armado, usou uma malha
interna de aço. Apesar de toda a relevância nacional e internacional, Joaquim Cardozo
está completamente esquecido, não existe nenhuma menção a seu nome em nenhum
monumento da cidade. É uma injustiça absurda.
“Não visualizo qualquer incompatibilidade entre
poesia e a arquitetura. As estruturas planejadas pelos arquitetos modernos são
verdadeiras poesias. Trabalhar para que se realizem esses projetos é
concretizar uma poesia.” (Joaquim Cardozo)
No poema Salto tripartido, o
engenheiro-poeta escreveu: “Havia um arco projetado no solo/Para ser recomposto
em três curvas aéreas,/Havia um voo abandonado no chão/À espera das asas de um
pássaro”. Os versos de Cardozo foram escritos em homenagem ao atleta Ademar
Ferreira, mas constituem a melhor argumentação em defesa dos seus méritos na
construção da cidade modernista. Sem a colaboração de um poeta do cálculo
estrutural, os voos de Niemeyer permaneceriam abandonados no chão. Ponte
Joaquim Cardozo seria um nome bonito e justo.
Por Severino Francisco -
Jornalista, colunista do Correio Braziliense - Fotos/Ilustração: Blog - Google