Em sua primeira
entrevista em dois anos e meio de Lava Jato, juiz descarta entrar na vida
política e defende restringir o foro privilegiado
Em sua primeira entrevista em dois anos e meio de Lava Jato, o
juiz Sérgio Moro descartou qualquer possibilidade de se candidatar a algum
cargo eletivo. “Sou um homem da Justiça e, sem qualquer demérito, não sou um
home da política”, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo na edição
deste domingo (6/11).
Responsável pelos processos em primeira instância da operação, Moro
falou sobre foro privilegiado, abuso de autoridade, caixa 2 em campanhas, além
de suas pretensões na carreira. Confira as principais declarações
do titular da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba (PR):
Lava Jato
“Considerando
os casos já julgados aqui, o que nós vimos foi um caso de corrupção sistêmica,
corrupção como uma espécie de regra do jogo. O que mais me chamou a atenção
talvez tenha sido uma quase naturalização da prática da corrupção. Empresários
pagavam como uma prática habitual e agentes públicos recebiam como se fosse
algo também natural. Isso foi bastante perturbador”.
“Um dos casos que chamou muito a atenção, um caso
já julgado, por isso posso afirmar mais livremente, de um pagamento de propina
a um membro da CPMI da Petrobras, instalada em 2014. Então, se instalou uma
comissão parlamentar de inquérito para apurar os fatos e, depois, se constatou
que o vice-presidente da comissão [numa referência ao ex-senador Gim Argello]
solicitou e recebeu propina dos investigados. Por isso tenho dito: precisa
aplicar remédios amargos. A Justiça precisa ser efetiva para demonstrar que
essa prática não é tolerada”.
Foro
privilegiado
“O ideal
seria realmente restringir o foro privilegiado, limitar a um número menor de
autoridades. Quem sabe, os presidentes dos três Poderes e retirar esse
privilégio, essa prerrogativa, de um bom número de autoridades hoje
contempladas. Acho que seria a melhor solução”.“O foro privilegiado não é sinônimo de impunidade”.
Projeto de Lei de Abuso de Autoridade - “Vai colocar autoridades
encarregadas da aplicação da lei, juízes, polícia e Ministério Público numa
situação em que possivelmente podem sofrer acusações, não por terem agido
abusivamente, mas, sim, porque adotaram uma interpretação que eventualmente não
prevaleceu nas instâncias recursais ou superiores”.
"Tem de se
deixar claro na lei que a interpretação do juiz ou do Ministério Público ou do
agente policial não significa prática de crime de abuso de autoridade. O
projeto não garante isso."
Caixa 2
“No caso
da Operação Lava Jato, o foco não tem sido propriamente no caixa 2 de campanhas
eleitorais, mas no pagamento de propinas na forma de doações eleitorais
registradas ou não registradas, ou seja, crime de corrupção”.
“Sobre eventual proposta de anistia, creio que é prudente aguardar
eventual formulação concreta antes de opinar. Seria impensável, porém, anistia
de crimes de corrupção ou de lavagem”.
Corrupção no Brasil - “Não existe uma salvação nacional; não existe
um fato ou uma pessoa que vai salvar o país. Um caso, pela escala que ele tem,
como esse da Lava Jato, pode auxiliar a melhorar a qualidade da nossa
democracia”.
Interesses
político-partidários -“Acho que
o mundo da Justiça e o mundo da política não devem se misturar”.
"Jamais sairia
candidato a um cargo eletivo. Sou um homem de Justiça e, sem qualquer demérito,
não sou um homem da política. Acho que a política é uma atividade importante,
não tem nenhum demérito, muito pelo contrário, existe muito mérito em quem atua
na política. Mas eu sou um juiz, eu estou em outra realidade, outro tipo de
trabalho, outro perfil. Então, não existe jamais esse risco."
Futuro - “Sou um juiz de primeira instância fazendo meu trabalho no momento.
Então, claro que se pensa na carreira, como algo natural, pelo menos na
carreira ordinária, mas isso não é algo que não está no meu horizonte próximo.
Não fico meditando sobre isso”.
Por: Maria Eugênia - Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom - Agência
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