General
Villas Bôas critica os “malucos e tresloucados”
O
comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, diz que há “chance zero”
de setores das Forças Armadas, principalmente da ativa, mas também da reserva,
se encantarem com a volta dos militares ao poder. Admite, porém, que há
“tresloucados” ou “malucos” civis que, vira e mexe, batem à sua porta cobrando
intervenção no caos político. “Esses tresloucados, esses malucos vêm procurar a
gente aqui e perguntam: ‘Até quando as Forças Armadas vão deixar o País
afundando? Cadê a responsabilidade das Forças Armadas?’” E o que ele responde?
“Eu respondo com o artigo 142 da Constituição. Está tudo ali. Ponto”.
Pelo
artigo 142, “as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas
com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente
da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes
constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
LEMBRANDO 1964 – O que o general chama
hoje de “tresloucados” corresponde a uma versão atualizada das “vivandeiras
alvoroçadas” que, segundo o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco,
primeiro presidente do regime militar, batiam às portas dos quartéis provocando
“extravagâncias do Poder militar”, ou praticamente exigindo o golpe de 1964,
que seria temporário e acabou submetendo o País a 21 anos de ditadura. “Nós
aprendemos a lição. Estamos escaldados”, diz agora o comandante do Exército.
Ele
relata que se reuniu com o presidente Michel Temer e com o ministro da Defesa,
Raul Jungmann, e avisou que a tropa vive dentro da tranquilidade e que a
reserva, sempre mais arisca, mais audaciosa, “até o momento está bem, sob
controle”. De fato, a crise política, econômica e ética atinge proporções
raramente vistas, mas os militares da ativa estão mudos e os da reserva têm
sido discretos, cautelosos.
PANELA DE PRESSÃO – “Eu avisei (ao
presidente e ao ministro) que é preciso cuidado, porque essas coisas são como
uma panela de pressão. Às vezes, basta um tresloucado desses tomar uma atitude
insana para desencadear uma reação em cadeia”, relatou o general Villas Bôas,
lembrando que há temas mais prosaicos do que a crise, mas com igual potencial
de esquentar a panela, como os soldos e a Previdência dos militares.
Na
sua opinião, Temer “talvez por ser professor de Direito Constitucional,
demonstra um respeito às instituições de Estado que os governos anteriores não
tinham. A ex-presidente Dilma (Rousseff), por exemplo, tinha apreço pelo
trabalho das pessoas da instituição, mas é diferente”.
INSTABILIDADE – Em entrevista ao
Estado, na sua primeira manifestação pública sobre a crise política do País, o
comandante do Exército admitiu que teme, sim, “a instabilidade”. Indagado sobre
o que ele considerava “instabilidade” neste momento, respondeu: “Quando falo de
instabilidade, estou pensando no efeito na segurança pública, que é o que, pela
Constituição, pode nos envolver diretamente”.
Aliás,
já envolve, porque “o índice de criminalidade é absurdo” e vários Estados estão
em situação econômica gravíssima, como Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande
do Sul, Minas Gerais. Uma das consequências diretas é a violência.
Ao
falar sobre a tensão entre o Judiciário e o Legislativo, depois que o ministro
Marco Aurélio Mello afastou o senador Renan Calheiros da presidência do Senado
por uma liminar e Renan não acatou a ordem judicial, o comandante do Exército
admitiu: “Me preocupam as crises entre Poderes, claro, mas eles flutuam, vão se
ajustando”.
INVASÃO DA CÂMARA – O general disse que
se surpreendeu ao ver, pela televisão, que um grupo de pessoas havia invadido o
plenário da Câmara pedindo a volta dos militares. “Eu olhei bem as gravações,
mas não conheço nenhuma daquelas pessoas”, disse, contando que telefonou para o
deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) para se informar melhor e ouviu dele: “Eu não
tenho nada a ver com isso”.
Bolsonaro,
um capitão da reserva do Exército que migrou para a vida política e elegeu-se
deputado federal, é uma espécie de ponta de lança da direita no Congresso e não
apenas capitaneia a defesa de projetos caros às Forças Armadas, como tenta
verbalizar suas dúvidas, angústias e posições e se coloca como potencial
candidato à Presidência em 2018.
POLITICAMENTE CORRETO – “No que me diz
respeito, o Bolsonaro tem um perfil parlamentar identificado com a defesa das
Forças Armadas”, diz o general, tomando cuidado com as palavras e tentando
demonstrar uma certa distância diplomática do deputado.
É
viável uma candidatura dele a presidente da República em 2018, como muitos
imaginam? A resposta do general não é direta, mas diz muito: “Bolsonaro, a
exemplo do (Donald) Trump, fala e se comporta contra essa exacerbação sem
sentido do tal politicamente correto”.
NOTA
DA REDAÇÃO DO BLOG – Infelizmente, não existe solução mágica para a
crise. Há quem julgue que uma intervenção das Forças Armadas resolveria tudo,
mas os próprios chefes militares não pensam assim. Embora seja bagunçado, o
Brasil é um dos países mais importantes do mundo. É o quinto maior em população
e extensão territorial, com a sétima maior economia. Sofrer intervenção
militar, como diz o general Villas Bôas, somente nos termos do artigo 142.
Qualquer outra hipótese significará retrocesso e desmoralização. A democracia
precisa ser preservada, os militares têm essa noção. (C.N.)
Por Eliane
Cantanhêde - Estadão - Tribuna da Internet