Em tempos de festas carnavalescas e com a
popularidade no chão, políticos precisam pensar bem na fantasia para conquistar
o eleitorado no ano que vem
*Por Paulo de Tarso Lyra,
Uma das mais belas músicas sobre a folia
carnavalesca, a Noite dos mascarados, de Chico Buarque, diz exatamente assim,
em seus versos: “Quem é você? Adivinha, se gosta de mim! Mas é carnaval! Não me
diga mais quem é você! Amanhã tudo volta ao normal. Deixa a festa acabar, deixa
o barco correr. Deixa o dia raiar, que hoje eu sou da maneira que você me
quer.” Em tempos nos quais a classe política está com a popularidade no chão,
quais fantasias os nossos representantes usariam para sensibilizar foliões e
eleitores? O que eles usariam para serem exatamente da maneira como a população
quer que eles sejam?
Quando
foi eleito em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva vestiu uma fantasia que lhe caiu
bem: o Lulinha paz e amor, pacificado, paciente, disposto a governar o país em
harmonia com mercados e os contratos vigentes. O acirramento da Lava-Jato fez
com que o petista tirasse da cartola a metáfora da jararaca, que estava mais
viva do que nunca. Mas, evidentemente, o que Lula menos quer é envenenar as
pessoas neste momento. Por isso, especialistas ouvidos pelo Correio sugerem a
fantasia de vítima, perseguido por todos. Um dos entrevistados propôs um Cristo
crucificado, mas voltou atrás, prudentemente, pois acharia que Lula compraria
uma briga desnecessária com a Igreja e os conservadores.
No mesmo
caminho apostólico, há quem sugira à senadora Marina Silva a fantasia de
Madelena arrependida. Bastaria acrescentar ao xale que já usa tradicionalmente
o longo véu. Ela se postaria em um monte e conversaria com seus seguidores, os
marineiros, que sempre estão à espera do momento em que ela vai se pronunciar
sobre os assuntos do momento. A espera agora é acrescida pelos políticos da
Rede que, mascarados ou não, reclamam que sua mentora política demora a se
posicionar sobre as coisas.
Nem só de
candura se faz um bloco carnavalesco. O nosso também tem os brigões e os
valentões. E os dois que melhor se enquadram nesse figurino são os
pré-candidatos ao Planalto em 2018, Ciro Gomes e Jair Bolsonaro. O deputado
carioca ficaria bem caracterizado de Capitão Caverna, com um porrete na mão,
pronto para, aos berros, destruir tudo o que está à sua volta e lhe causa
contrariedade. Já Ciro é o clássico brigão de rua, com chinelo, calça jeans e
camiseta regata — tatuagem no braço — pronto para esmurrar quem discorda de
suas teses. Um especialista consultado se lembra do personagem Seu Saraiva, da
Escolinha do Professor Raimundo, imortalizado pelo ator Francisco Milani:
“Tolerância zero”.
Vaias
Recém-chegado
no meio político, após a surpreendente vitória na eleição para a prefeitura de
São Paulo, o tucano João Doria já ganhou até marchinha. Pela mania de se vestir
de gari para varrer as ruas pelo programa Cidade Limpa, ele foi homenageado no
pré-carnaval paulistano com o samba do grupo Molejo: “Diga onde você vai que eu
vou varrendo”. Doria, contudo, não consegue enganar as origens.
Tentou
passar a imagem de uma infância humilde, mas não vivenciou sérias dificuldades
nos primeiros anos de vida — hoje, menos ainda. Por isso, cairia bem para ele a
fantasia de Riquinho, um personagem americano lançado originalmente em quadrinhos
em setembro de 1953. Curiosamente, quatro anos antes de Doria nascer. O
presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), não teria muitas
dificuldades de se fantasiar do mineirinho tradicional, que fala pouco, de
maneira pontual, e evita entrar em contendas.
“A classe
política está com a credibilidade muito baixa. Por isso, precisa de muita
criatividade para melhorar a imagem”, afirma o professor de ciência política
Carlos Mello, do Insper. Mesmo assim, apesar do risco de vaias, o diretor de
documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap),
Antonio Augusto de Queiroz, não acha que políticos seriam agredidos na avenida.
“Carnaval é contestação e crítica. Mas no humor, não na violência”, acrescenta.
"A classe política está com a credibilidade muito baixa. Por isso, eles
precisariam de muita criatividade para melhorar a imagem”
(Carlos Mello, professor de ciência política)
(*) Paulo de Tarso Lyra – Arte:
Caio Gomes – Júlio Lapagésse _ Maurenilson Freire/CB/D.A.Press - Correio
Braziliense