*Por Circe Cunha,
Ainda nos anos 1960, Brasília deu
mostras para todo o Brasil e para o mundo de sua capacidade empreendedora e
criativa de nossos profissionais. A construção de uma capital, no espaço de
apenas um governo, com todas as dificuldades e limitações da época, foi
acompanhada com admiração e até mesmo com um certo grau de ceticismo por muita
gente. Eram outros tempos e naquela ocasião, era possível sentir, no próprio
ar, um clima contagiante de forte otimismo e crença de que o país finalmente
tinha entrado nos trilhos do desenvolvimento com democracia. Tudo parecia ser
plenamente realizável, bastando, para isso, vontade e força.
Em 1964, a fase de otimismo cedeu lugar ao pragmatismo cartesiano
castrista e Brasília ficou como que suspensa no ar por longos anos, como uma
ilha cercada por um imenso continente adormecido. No plano ideal, Brasília
seria disposta conforme concebeu seu idealizador. Lucio Costa, o inventor da
capital, era um homem muito adiante de seu tempo. Quando pensou em Brasília,
não quis criar uma cidade apenas no seu aspecto urbanístico.
Para ser uma cidade realmente revolucionária, dentro dos preceitos
humanistas que professava, a futura capital deveria inovar não só no seu
aspecto de espacial, mas, sobretudo, no seu ambiente social. Neste sentido, a
cidade nova iria acolher e ser a casa do homem novo, fraterno, cordial e
magnânimo. Para Lucio Costa, seu projeto para Brasília ia além de uma proposta
de cidade. Era um projeto de nação, desbravador e feito nos moldes da tradição
colonial. “Brasília, dizia ele, não é um gesto gratuito de vaidade pessoal ou
política à moda da Renascença”… Testemunha a maturidade intelectual do povo que
a concebeu, povo então empenhado na construção de um novo Brasil, voltado para
o futuro e já senhor do seu destino.”
No clima de euforia daqueles anos, resultado, em parte, do fim da 2ª
Grande Guerra, da industrialização crescente e do processo de urbanização do
Brasil, a cidade que brotava do lápis de LC seria uma “cidade planejada para o
trabalho ordenado e eficiente, mas, ao mesmo tempo, cidade viva e aprazível,
própria ao devaneio e à especulação intelectual, capaz de se tornar, com o
tempo, além de centro de governo e administração, num foco de cultura dos mais
lúcidos e sensíveis do país”.
Talvez o maior exemplo da perseverança e ânimo que marcou aquela fase e
que poderá servir de modelo para estes tempos de incertezas nos quais vivemos
agora, seja o fato de, como diz seu inventor, “tudo aquilo, apesar da
maquinaria empregada, foi feito com as mãos — infraestrutura, gramados, vias,
viadutos, edificações, tudo à mão. Mãos brancas, mãos pardas: mãos dessa massa
sofrida — mas não ressentida que é o baldrame desta nação”.
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A frase que não foi pronunciada
“O que fazer com o direito de votar quando não há candidatos que nos
representem?
(Murilo Silva, 15 anos, pensando nas próximas eleições.)
(*) Por Circe Cunha – Coluna
“Visto, lido e ouvido” – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração:
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