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Dom Bosco e o leite e mel da Caesb


*Por Circe Cunha, 

Mesmo para um país que, por séculos, tem convivido com as mais flagrantes desigualdades sociais e econômicas, causa espanto que, em tempos de crise profunda, o governo insista, abertamente, em eleger, como prioridade, o atendimento das necessidades da elite. De outra forma, como explicar que, em meio à séria crise hídrica que assola a capital, o GDF inclua no sistema de racionamento e corte de água as escolas públicas, prejudicando milhares de estudantes e, ao mesmo tempo, permita o abastecimento normal para os palácios e outros prédios que abrigam o alto escalão da república? É esse tipo de prioridade que faz com que o Brasil permaneça eternamente estagnado nos rankings mundiais quando o assunto é desenvolvimento humano.

O certo é que, em países normais e em tempos de aflição, as primeiras a serem protegidas contra os flagelos sejam, justamente, as populações formadas por crianças, idosos e mulheres. Se há falta de água, os últimos a sentirem seus efeitos deveriam ser os pequenos. Troca de informações eletrônicas sugerem que político algum faria falta se parasse de trabalhar e deixasse de receber seus gordos proventos. Por isso, o corte de água e de luz deveria começar nas residências dos que detêm o poder.

Para fazer frente aos altíssimos e injustos salários que adornam os contracheques dos empregados da Caesb, essa triste empresa não demonstra constrangimento algum, nem em meio à maior crise hídrica da atualidade, em aumentar os preços das tarifas de água e aplicar porcentuais extraordinários nas contas dos consumidores. Vale ressaltar que, na mesma medida da falta de cuidado em prestar um bom serviço, não há o mínimo de atenção em relação à qualidade do produto oferecido à população. A Caesb proíbe e retira o equipamento comprado pela clientela para anular o ar que dispara o ponteiro acusando consumo de água na volta do líquido depois da interrupção do fornecimento, quando, na verdade, o que veio pelo cano foi ar.

“Quando se vierem a escavar as minas escondidas no meio destes montes, aparecerá aqui a terra prometida, de onde jorrará leite e mel. Será uma riqueza inconcebível.” Parece que dom Bosco vislumbrava a Caesb. A água cheia de barro da cor de um bom mel ou cheia de químicos, da cor de leite, além do lucro de alguns funcionários da companhia que reina sem concorrência.

Enquanto, para a população, o abastecimento de água é visto como uma necessidade vital básica, para esses “novos empresários públicos”, o líquido é garantia de altos rendimentos, principalmente a sua escassez.

A água não pode ser encarada como um bem econômico qualquer, sujeito às leis flutuantes da oferta e da procura, próprio dos mercados . Trata-se do maior e mais estratégico bem, sem o qual as possibilidades de colapso da sociedade são patentes. Por isso mesmo, a administração desse precioso líquido, desde a coleta, o tratamento e a distribuição, deveria se submeter a critérios absolutamente transparentes, se possível, dentro dos princípios que regem a própria segurança nacional. José Walter Vasquez, da Adasa, declarou, em audiência pública, que “ a população está sendo penalizada demais pela taxa e pelo não fornecimento de água”. Mas, mesmo sendo o regulador da companhia, não foi efetivamente além disso. A sociedade não irá permitir que a água continue a ser negociada como uma mercadoria qualquer e, ainda mais, por uma empresa que tem encarado, desde sempre, o fornecimento desse produto apenas sob o aspecto de lucro fácil e certo .

***
A frase que foi pronunciada
“Aprendi que a seca não é só quando falta água, é quando sobra corrupção.”
(Raimundo Nonato, pensando no sertão)


Por Circe Cunha – Coluna “Visto, lido e ouvido” – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google

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