Por Marianne Peretti,
Com três ou quatro riscos, Oscar
Niemeyer criou obras geniais, majestosamente simples. Mas, além disso, ele teve
o mérito de convidar artistas de grande talento para colaborar na integração
entre arte e arquitetura, que transformaram Brasília em uma referência
internacional.
Em alguns casos, essa integração se
plasmou de maneira tão indivisível que os nomes dos artistas se apagaram. Fica
a impressão de que tudo é criação de Niemeyer. O paisagista Burle Marx ou os escultores
Maria Martins, Alfredo Cheschiatti e Bruno Giorgio já eram reconhecidos. No
entanto, existem também aqueles que foram forjados a partir da experiência de
Brasília. É o caso de Athos Bulcão e Marianne Peretti: se Athos inventou uma
nova linguagem do azulejo, essa pernambucana francesa inventou uma linguagem do
vitral para a arquitetura moderna, uma linguagem para filtrar a luz tropical.
Véronique David, especialista em
vitrais e pesquisadora do Centro André Chastel da Universidade Sorbonne, coloca
Marianne ao lado de Henri Matisse e Marc Chagall na lista dos mais importantes
vitralistas do século 20. Nem sempre nos damos conta, mas as obras de Peretti
estão espalhadas pela cidade: na Catedral Metropolitana, na Câmara Mortuária do
Memorial JK, no Panteão da Pátria, no STJ e no Teatro Nacional.
Suas esculturas-totens fundem árvores e
pássaros, figuras e abstrações, a concretude e o movimento. Sempre procura a
depuração da forma até o essencial. Elas estão impregnadas de um sentido do
sagrado. O ponto comum é a herança de Brasília: a sabedoria para harmonizar,
valorizar ou sacralizar os espaços da arquitetura.
Na Catedral Metropolitana de Brasília,
obra-prima da arquitetura moderna, ela criou um vitral que é uma espécie de
abóbada cósmica para filtrar a luminosidade tropical do céu de Brasília.
Imagino que seja difícil a um fiel se concentrar no eventual sermão de um padre
que fale do púlpito, à altura do corpo. Ali, nosso olhar está sempre dirigido
para o alto. Para ser ouvido, o pregador precisaria falar do ponto em que voam
os anjos de Cheschiatti. Lá, o nosso olhar só se dirige para o alto e para o
infinito.
No STJ, a escultura de Peretti mostra
uma mão com um olho; no Teatro Nacional, a escultura de um pássaro, símbolo da
liberdade, é vazada pelo voo; no Memorial JK, um vitral carregado de figuras
simbólicas coroa a câmara mortuária. O painel Araguaia estava inexplicavelmente
esquecido nos depósitos do Senado Federal. A gente sai de uma visita aos
prédios que têm intervenções de Marianne Peretti com a sensação de
transparência, de leveza, de ritmo, de luminosidade e de voo. Elas enriqueceram
muito as obras concebidas por Niemeyer.
Memorial JK - câmara mortuária
Teatro Nacional - Escultura de um pássaro, símbolo da liberdade, é vazada pelo voo
Correio Braziliense – Foto/Ilustração:
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