O Departamento de Estradas de Rodagem (DER), em
parceria com professores da UnB, fez ações educativas ontem e na terça-feira no
Câmpus Darcy Ribeiro, na Asa Norte
*Por Isa Stacciarini » Adrina Bernardes
Apesar da redução no total de mortes na travessia
de ruas do DF, a distração, o excesso de velocidade e o uso de celular
contribuem para aumentar a vulnerabilidade. Estimativa mostra que, em duas
décadas, o equipamento salvou 875 pessoas
A faixa de pedestre completa duas décadas amanhã.
São 20 anos marcados pelo espaço de proteção a quem anda a pé. E o resultado
são vidas poupadas. Desde 1º de abril de 1997, a população de Brasília começou
a escrever uma história inédita de respeito aos mais frágeis no trânsito. Mudou
o próprio comportamento, construiu uma cultura de respeito e inspirou outras
cidades. No período, pelo menos 875 vidas foram salvas pela faixa. O número
considera só a proporção de pedestres mortos sobre o total de vítimas do
trânsito. Um ano antes de a lei vigorar, os pedestres eram 43,6% das vítimas —
esse percentual caiu para 33,7%.
Mas, ao
longo do tempo, a capital federal assiste, com certa apreensão, à oscilação dos
números e ao comportamento agressivo e imprudente de quem insiste em
desrespeitar o espaço destinado à travessia segura. O resultado da má conduta
aparece nas estatísticas. Apesar de a análise a longo prazo revelar a redução
considerável de pedestres mortos no trânsito, 2016 terminou com o aumento do
número de casos comparados com o resultado de 2015. Foram 132 vítimas mortas,
contra 112 no ano anterior (leia quadro). O número de óbitos durante a
travessia na faixa também piorou. No ano passado, seis pessoas morreram
atropeladas sobre o equipamento de segurança, contra quatro em 2015.
Entre as
possíveis causas das tragédias estão condutores que descumprem a lei, pedestres
que atravessam sem sinalizar, frequente uso de celular, distração ao volante e
excesso de velocidade. O casal Ana Beatriz Rodrigues, 22 anos, e Alan Canuto,
28, vivencia diariamente a experiência de recorrer às faixas em Brasília. “Às
vezes, ficamos parados bastante tempo na faixa, fazendo o sinal de vida, e tem
muita gente que não para, principalmente nas satélites. No Plano Piloto, os
condutores ainda param. No Pistão, em Taguatinga, a gente fica muito tempo
tentando passar, mesmo com a sinalização e com o pé na faixa. Depende do
local”, acredita o analista de geoprocessamento.
Alan mora
em Águas Claras, e Ana Beatriz, em Taguatinga. Apesar de enfrentarem desafios
na hora da travessia, eles comparam as dificuldades às de quando viajaram para
a Paraíba. “Brasília ainda é referência e contribui bastante para a cultura. Em
João Pessoa, os motoristas buzinavam para a gente sair da faixa”, conta a
estudante de pedagogia da Universidade de Brasília (UnB).
Na
avaliação do doutor em estudos em transporte do Departamento de Engenharia
Civil e Ambiental da UnB Paulo César Marques, a faixa é uma conquista
histórica, que, para se perpetuar, necessita de investimento em campanhas
educativas constantes. “Temos nas ruas uma geração que não viveu a campanha Paz
no Trânsito. Aos poucos, os valores vão se perdendo. E, nos últimos anos, não
tivemos campanhas que consolidassem esse comportamento de respeito ao pedestre
na faixa. Há 20 anos, o meu filho tinha 1. Hoje, é motorista. Em outras
cidades, ele vê que a faixa não é respeitada. Isso pode contaminar essa geração
ou quem chega a Brasília após o processo de conscientização”, cita.
Conscientização
Ontem e
na terça-feira, o Câmpus Darcy Ribeiro da UnB, na Asa Norte, recebeu ações
educativas para a consciência do uso e do respeito à faixa. A iniciativa,
encabeçada pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER), com a participação
de professores da instituição, chamou a atenção de quem passava pelo local. Uma
faixa andante também acompanhava os passos de pedestres. Jhene Costa, 24 anos,
estudante de arquitetura de uma universidade particular da Asa Sul incorporou a
personagem fantasiada para alertar sobre a importância da lei. “Aqui é a única
unidade federativa em que, realmente, se cumpre a lei. Precisamos continuar
chamando a atenção para essa necessidade. Condutores não podem só parar na
faixa quando veem a polícia ou porque é bonito”, alerta.
Professora
de engenharia civil e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Transportes
da UnB, Michelle Andrade avalia que a faixa de pedestre no DF é referência
nacional em relação ao respeito. No entanto, na visão dela, a valorização não é
mais a mesma. “Um desses elementos é o uso do celular, que coloca em risco
caminhar. Nem sempre se associa esse perigo ao pedestre, mas, em muitas
ocasiões, ele está digitando e não dá a devida atenção na hora de atravessar. É
fundamental estabelecer contato visual com o motorista para ter certeza de que
ele vai parar”, destaca.
Segundo
ela, campanhas educativas frequentes e o sucesso na fiscalização são
fundamentais para o cumprimento da lei. “O respeito à faixa em Brasília é um
ganho diferencial da cidade e, efetivamente, precisa ser comemorado para
conscientizar a comunidade local”, ressalta.
O gerente
de Campanha Educacional do DER no DF, Paulo Victor de Araújo, reforça que o
desrespeito está relacionado à imprudência, à falta de cordialidade e de
atenção, à distração ao volante e à alta velocidade. “Apesar disso, o respeito
está maior. Podemos constatar isso com os raros casos de acidentes nas faixas
se comparado ao que acontecia antes. Ela se tornou sinal de vida”, analisa.
"É fundamental estabelecer contato visual com
o motorista para ter certeza de que ele vai parar" Michelle Andrade,
coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Transportes da UnB
Três perguntas para: Silvain Fonseca, diretor-geral do Detran
Nas últimas duas décadas, é inegável saldo positivo do respeito à faixa
de pedestres. Mas ainda morre gente no espaço destinado à travessia de quem
anda a pé. Quais são os projetos do Detran para a faixa?
Estamos
modernizando as campanhas e programando ações educativas para o ano todo. A
primeira peça publicitária, com foco no respeito à faixa, será veiculada até a
segunda quinzena de abril. Vamos alertar motoristas e pedestres sobre os riscos
e a conduta segura. A faixa de pedestre é, para o governador, uma política de
Estado. Dia e noite, circulamos a cidade para renovar a pintura daquelas que
estão apagadas. Também fazemos um estudo sobre as causas dos acidentes nas
faixas. Nesses casos, voltamos a colocar o agente de trânsito no local, como no
princípio da Paz no Trânsito. A viatura fica na frente e para o motorista que
não parou. Além da multa, é orientado a respeitar a faixa. Isso acontece no
Gama, Riacho Fundo e em Planaltina.
O estudo dos acidentes na faixa apontaram alguma falha?
Em alguns
deles, houve aumento do número de casos onde as barreiras eletrônicas foram
desligadas ou onde não há barreira eletrônica. Estamos instalando esses
equipamentos em locais que antecedem a faixa, em pontos estratégicos, de modo
que elas obriguem o motorista a reduzir a velocidade antes da travessia de
pedestre. Das 124, 40 estão funcionando. As demais estão em fase de aferição.
O levantamento mostra que a W3 Norte é a via urbana campeã de
atropelamentos fatais. Por quê?
Os casos
são mais recorrentes da 508 Norte à 515 Norte. O que percebemos nesse local é
que os pedestres atravessam fora da faixa e, muitas vezes, distraídos. Em um
dos casos, o rapaz entrou correndo na via, falando ao celular, mesmo com o
semáforo verde para os carros. No centro de Ceilândia, estudamos canalizar a
passagem do pedestre, como fizemos também no centro de Taguatinga.
(*) Isa Stacciarini » Adrina Bernardes – Fotos: Bruno
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