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O futuro do sindicalismo brasileiro


*Por Almir Pazzianotto Pinto

O sindicalismo pode ser definido como ação coletiva para proteger e melhorar o próprio nível de vida por parte de indivíduos que vendem a sua força de trabalho (Allen, 1968:1). Mas é difícil ir além desta definição abstrata e indeterminada, porque o sindicalismo é um fenômeno complexo e contraditório. Ele nasce, de fato, como reação à situação dos trabalhadores na indústria capitalista, mas constitui, também, uma força transformadora de toda uma sociedade.

O parágrafo pertence ao Dicionário de Política, de Bobbio, Matteucci e Pasquino (EdunB, Brasília). Sintetiza o significado da palavra sindicalismo, exceto em relação ao Brasil, onde surgiu como resposta das classes trabalhadoras ao capitalismo selvagem das primeiras décadas do século passado, até ser submetido ao controle do governo durante o período conhecido como era Vargas (1930-1945). A intromissão do Estado na organização dos trabalhadores inicia-se em1931, até tornar-se absoluta com a aprovação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1º de maio de 1943. A partir daí, o movimento sindical perde forças, para se sujeitar ao rígido controle do Ministério do Trabalho.

Vinculadas ao governo pela Constituição de 1937 e pela CLT, as organizações sindicais reagiram de forma distinta. Boa parte se apelegou e aceitou com agrado o regime de completa submissão, mas outra parcela, controlada por partidos políticos de esquerda, lutou para conservar certo grau de dignidade e independência. Durante mais de 40 anos poucos foram os movimentos grevistas e todos, duramente, reprimidos pela polícia.

Porém, nos períodos mais repressivos, como no governo do general Dutra (1946-1950) e nos anos de regime militar (1964-1985), a sociedade civil reconheceu o relevante papel desempenhado pelo sindicalismo autêntico na defesa dos salários e de melhores condições de vida para as classes trabalhadoras. O movimento operário não é apenas uma reação a uma situação dada, uma das peças indispensáveis do equilíbrio social, é também um fator original novo que constitui, para o conjunto da sociedade, um fator de mudança, escreveu Michel Crozier (1922-2013) no Tratado de Sociologia do Trabalho (Editora Cultrix, 1973).

Atualmente, nos países ocidentais, a função essencial dos sindicatos é a negociação coletiva, isto é, a discussão dos salários, das condições de trabalhos e, eventualmente, de todo e qualquer problema que se relacione com tais assuntos, prosseguiu o sociólogo francês, na opinião de quem o sindicato sempre supõe uma revolução contra a ordem estabelecida e a greve não é uma doença (...) na medida em que fornece aos assalariados a garantia mais segura de sua posição econômica. Não podemos subestimar a presença das organizações sindicais na história. 

A força sempre foi fator crucial nas relações entre capital e trabalho, escreveu o historiador Edward Hallet Carr. Sem contar com a presença atuante de organizações sindicais livres, os trabalhadores estariam à mercê dos apetites da economia capitalista.

O fim da contribuição obrigatória, provocado pela reforma trabalhista, produzirá efeitos em toda estrutura, mas não lhe provocará o desaparecimento. O primeiro consistirá na redução do número de sindicatos. Os artificiais, ou de carimbo, desaparecerão por falta de sócios, de legitimidade e de dinheiro. Sobrevirão aqueles que forem aptos a arregimentar trabalhadores e trazer os empregadores à mesa de negociações. O segundo é a aquisição de liberdade da qual estiveram privados durante o Estado Novo, o governo Dutra e o regime militar. Trata-se, todavia, de liberdade incompleta, uma vez que no art. 8º da Constituição, não obstante afirme ser livre a associação sindical ou profissional como já o fizeram as constituições de 1946 e de 1967 (Emenda nº 1/69), sobrevivem as raízes corporativo-fascista da Carta Constitucional de 1937.

A perda de receita exigirá medidas de reestruturação das entidades. As mais afetadas serão as federações e confederações, dependentes da contribuição obrigatória. Estou convencido de que um novo mundo se descortina diante dos trabalhadores. Ao Estado de direito democrático, fundado nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, é essencial a presença de entidades sindicais que negociem e, se necessário, recorram ao direito de greve, previsto na Constituição.


(*) Almir Pazzianotto Pinto  - Advogado. Foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

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