Em 6 de julho, a presidente Dilma sancionou o Estatuto da Pessoa com
Deficiência e vetou sete de seus artigos. O projeto de lei havia demorado 15
anos em tramitação no Congresso Nacional, anos de debates, confrontos, muitas
propostas e pouco consenso. Por fim, a Câmara e, pouco depois, o Senado
aprovaram o estatuto. Um texto desnecessário em formato superado, criando
legislação em separado para quem a exclusão e o preconceito marcam de diferença
a vida do dia a dia, e fazem da discriminação prática tão comum que nem é
percebida como tal.
Mas o mais estranho estava por vir e aconteceu na mensagem de veto
enviada ao Congresso pelo governo federal, e logo em um dos poucos artigos que
poderiam trazer mudança concreta para a vida das pessoas com deficiência. A Lei
nº 8.213/91 acaba de completar 24 anos. E o veto atingiu acréscimo ao artigo
93, que incluía a seguinte mudança: “As empresas com 50 ou mais empregados são
obrigadas a preencher seus cargos com pessoas com deficiência e com
beneficiários reabilitados da Previdência Social, na seguinte proporção: I — de
50 a 99 empregados, 1 empregado”.
Acontece que, entre as razões dos vetos, encontramos sem disfarce o
preconceito. Lá está escrito: “Apesar do mérito da proposta, a medida poderia
gerar impacto relevante no setor produtivo, especialmente para empresas de mão
de obra intensiva de pequeno e médio porte, acarretando dificuldades no seu
cumprimento e aplicação de multas que podem inviabilizar empreendimentos de
ampla relevância social”.
Por quê? Por que uma única pessoa com deficiência empregada vai ser
prejudicial ao funcionamento e à produtividade dessas empresas? Por que seriam
inviabilizadas pelo fato de empregarem um, apenas um, cidadão brasileiro com
deficiência, que só deve ser empregado por sua competência? E nem a desculpa de
que é difícil contratar pessoas com deficiência deve ser levada a sério —
milhares estão desempregadas e inúmeras ONGs trabalham em sua colocação. E por
que essas empresas seriam “empreendimentos de ampla relevância social”, e a
tentativa de aumentar o até hoje iníquo número de pessoas com deficiência
empregadas não teria relevância?
A Constituição determina no art. 3º: “Constituem objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil, IV — promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação”. E no art. 7º, XXXI: “Proibição de qualquer discriminação no
tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de
deficiência”. Ainda mais, jurisprudência do Supremo estabelece que a
Constituição veda a discriminação em geral, mas institui a discriminação
positiva. Infelizmente foi o preconceito velado e sua naturalização que
passaram despercebidos e marcaram preto no branco a posição do governo federal.
Está assim assinada pela presidente Dilma e por nove de seus ministros,
por meio da Lei nº 13.146/15, a oficialização do desrespeito à Constituição, da
discriminação, do preconceito e da exclusão da pessoa com deficiência no
Brasil.
Por:
Teresa Costa Amaral - Superintendente do Instituto Brasileiro
dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD) – Fonte: Correio Braziliense
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