O conflito entre o Executivo e o Congresso e os
impactos da Operação Lava-Jato, envolvendo parlamentares e grandes empresas,
retardam o debate sério e a aprovação do pacote fiscal elaborado pela equipe do
ministro Joaquim Levy. Minguam as expectativas da equipe da Fazenda de virar a
página do rombo fiscal e realinhar o país na rota da recuperação econômica. No
Legislativo, o Orçamento da União prevê cortes de recursos em setores sensíveis
como saúde e educação.
Na proposta enviada aos parlamentares, programas
sociais, entre eles o Bolsa Família, estariam imunes à lâmina que impõe limites
aos gastos públicos. Para o relator do Orçamento, deputado Ricardo Barros (PR),
não há como poupar as ações sociais do Executivo. É preciso cortar para, se
possível, eliminar o rombo inicialmente calculado em R$ 30,5 bilhões, que pode
chegar a R$ 76 bilhões.
Para isso, o relator propõe reduzir o Bolsa Família
em R$ 10 bilhões — passaria dos atuais R$ 28,8 bilhões para R$ 18,8 bilhões. O
anúncio provoca inquietação entre os beneficiários e, principalmente, no
Ministério do Desenvolvimento Social, que tem como eixo principal de trabalho o
combate à fome e à miséria. Em 10 anos (2002/2012), a iniciativa diminuiu em
28% parcela da população em extrema pobreza. A ideia é inaceitável em face da
conquista social que o programa representa para o Brasil. A ação mereceu, até,
reconhecimento internacional como exemplo de transferência de renda.
Entre os quase 14 milhões de beneficiários, estão
indivíduos que precisam e devem ser protegidos pelo Estado. São crianças e
adolescentes na faixa de 6 a 15 anos que compõem famílias sem renda ou que
percebem por mês entre R$ 70 e meio salário mínimo. São menores que
correspondem a 88% dos atendidos pelo Bolsa Família. Reduzir o volume de
recursos a eles destinados é agravar a vulnerabilidade social a que estão
submetidos. Além de preservar o programa, é indiscutível a necessidade de
reforçar mecanismos de fiscalização e controle para que fraudes, comuns em
iniciativas do gênero, não ocorram.
Entre as possibilidades de enxugamento dos gastos
públicos, o relator poderia rever o volume de recursos destinados ao custeio
dos Três Poderes, eliminando despesas com imóveis funcionais, cartões
corporativos, veículos oficiais, viagens, mordomias, construção de prédios
públicos com elevado padrão de luxo e outros benefícios que elevam em demasia o
custo operacional da máquina administrativa. Ou seja, há uma larga avenida a
ser percorrida cujo trajeto passa longe do Bolsa Família, que assegura
minimamente dignidade aos que sempre foram invisíveis aos olhos do Estado e
excluídos das políticas públicas.
Fonte: “Visão” do Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog-Google