Declarações do ministro do Supremo Luís Roberto Barroso ao
Correio sobre as dificuldades financeiras de estados e municípios servirão de
mote para fórum de administradores. Políticos e especialistas avaliam
entrevista do magistrado
O ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto
Barroso deu fôlego aos governadores. A análise que ele fez em entrevista ao
Correio, de que é necessário mais sociedade e menos Estado, especialmente pelo
fato de que União, estados e municípios não apresentaram condições de investimento
para sair da atual crise econômica, servirá como argumento para que alguns
administradores estaduais levantem a bandeira de mudanças no atual sistema de
distribuição de impostos e responsabilidades entre as esferas de poder.
Governador de uma unidade da federação que passa por uma saraivada de
dificuldades e greves em quase todos os setores, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) se
prepara para lançar em seu partido e no fórum dos chefes dos estados uma
discussão profunda sobre reforma administrativa. Para isso, levará na bagagem
da próxima reunião a entrevista de Barroso.
“Foi uma das coisas mais lúcidas que vi nos últimos
tempos. Se não enfrentarmos esse debate de menos estado e mais sociedade a que
o ministro se refere, vamos virar uma Grécia, vamos sucumbir”, disse o
governador. Depois de quase um ano como governador do Distrito Federal,
Rollemberg considera que o Estado hoje vive mais para si mesmo do que para a
sociedade, diante das pressões de todas as categorias por aumento de salário
sem levar em conta o todo. “O Estado não pode viver mais para si mesmo, e sim
para a sociedade. Tem que ser indutor das medidas de combate às desigualdades
sociais e não agravador dessas desigualdades. Não temos serviços nem capacidade
de investimento. A gente tem que debater em profundidade, serenidade e
honestidade. Mas as coisas no Brasil tem sido debatidas no sentido de
desqualificar o interlocutor. O ministro lança um conceito muito simples, menos
estado e mais sociedade. É por aí o rumo”, disse o governador.
O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) concorda: “O
Brasil precisa discutir esse tema. Vivemos uma situação trágica que pode sair
da crise entrando na decadência”, diz Cristovam, que se mostra preocupado ao
ver um ministro do Supremo Tribunal Federal abordando temas políticos. “Todas
as vezes que vejo uma entrevista de ministro do Supremo me preocupo com a nossa
democracia, que não está bem. Mas, sempre que leio, me alegro em saber que
temos juízes competentes e sérios”, comenta Cristovam. “Não vai aqui uma crítica
ao juiz, mas ao momento político que estamos vivendo, que começa a misturar
todo mundo. Tem político querendo julgar a presidente da República, munindo-se
da tarefa de juiz. E tem juiz legislando no vazio deixado pelo Legislativo”,
diz o senador.
Cristovam diz concordar com a visão do ministro
sobre os movimentos em torno de um processo de impeachment: “Temos uma
presidente que não se mostra capaz de conduzir o país nos próximos três anos.
E, ao mesmo tempo, não temos hoje argumentos legais absolutamente seguros para
justificar o impeachment. Baixa popularidade não está prevista como razão para
o afastamento da presidente, pedaladas também não. Essa é a tragédia que
vivemos”, diz ele. O senador, que se diz presidencialista, começa a achar que a
saída é o parlamentarismo, “que permite unir legalidade e legitimidade”. E
reforça: “Dilma tem legalidade, que foi conferida pelo voto, mas não tem mais
legitimidade, pelas mentiras ditas na campanha”, diz ele.
Contas
Para o presidente e fundador da Organização Não
Governamental Contas Abertas, Gil Castelo Branco, a sociedade ainda tenta fazer
o seu papel, reivindicando seus direitos e pressionando o poder público. “Não é
fácil colocar, a cada três meses, um milhão, um milhão e meio de pessoas nas
ruas. Mas é isso que está acontecendo. A sociedade está fazendo sua parte, os
governantes é que não estão”, disse Gil. Para ele, a situação quase falimentar
de governadores e prefeitos é, em boa parte, responsabilidade do próprio
governo federal. “Como está com o caixa apertado, a União deixou de transferir
recursos voluntários e realizar o pagamento de convênios. Além disso, dentro da
nova matriz econômica adotada ao longo do primeiro mandato da presidente Dilma,
foram concedidas diversas isenções fiscais que impactaram no caixa das
prefeituras e dos governos estaduais”, completou o economista.
O professor de Ciência Política da UnB Ricardo
Caldas concorda com a situação difícil de estados e municípios. Mas discorda de
Barroso quanto à atuação do STF na concessão de liminares suspendendo o rito de
tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma. “O procedimento
adotado pela Câmara (mais especificamente pelo presidente Eduardo Cunha) não
alterou nenhum preceito constitucional. E seguiu o procedimento adotado em uma
lei ordinária. Por isso, não cabe a interpretação de que o processo não seja
interna corporis do Congresso”, disse Caldas.
Fonte: Denise
Rothenburg – Paulo de Tarso Lyra – Correio Braziliense – Fotos: Carlos
vieira/CB/D.A.Press – Breno Fortes/CB/D.A.Press – Rodrigo Nunes – Esp.CB/D.A.Press