"O consumidor até entende que o reajuste é necessário,
mas se você não dá uma contrapartida de qualidade para ele, ele não aceita.
Agora quando o consumidor percebe que ele está pagando e a qualidade melhorou e
o atendimento também, ele entende e aceita."
Novo presidente da companhia herda
missão de sanear as contas. Mais um reajuste de tarifas não é descartado,
porém, há outros planos
Ari Joaquim da Silva, 65 anos, é o novo presidente da Companhia Energética de Brasília (CEB). Embora tenha mudado de cargo, a rotina não alterou muito — até a sala continua a mesma. Ari chegou à CEB com o então presidente, Francisco Santiago, em 7 de janeiro deste ano, a convite do governador Rodrigo Rollemberg (PSB). Era o braço direito de Santiago no cargo de diretor-geral. Até a sala da presidência os dois dividiam. A dupla se conhece desde o tempo em que trabalhavam no segmento de telecomunicações. Ao assumirem a CEB, o desafio era tirar a companhia da grave crise financeira — o deficit da empresa é de R$ 360 milhões — e de qualidade no serviço.
Alegando motivos pessoais, Santiago
pediu para sair da presidência neste mês. Ari herdou a missão de recuperar a
CEB, seguindo o projeto de gestão desenhado pelos dois. Em entrevista exclusiva
ao Correio, o novo presidente faz uma análise dos últimos meses. Ele destaca que
a companhia continua operando no vermelho, embora o prejuízo semestral tenha
diminuído de R$ 147,9 milhões para R$ 36,5 milhões. Por isso, não descarta a
hipótese de mais aumentos na conta de energia elétrica — nos últimos 12 meses,
os incrementos na fatura somaram 73,74%.
Para o futuro da CEB, Ari destaca a
importância da capitalização da empresa. O comunicado mostrando interesse de
injeção de capital foi publicado em 30 de setembro. A ideia é vender ativos da
parte de geração da holding e alienar imóveis da companhia.
O senhor está na CEB desde janeiro
deste ano, como diretor-geral, e agora assumiu a presidência. A gestão do
senhor será uma continuidade do trabalho que vinha fazendo com o Santiago
ou terá uma marca mais pessoal?
Quando nós assumimos a empresa em
janeiro, fizemos um plano juntos. Eu vou continuar o plano que definimos em 7
de janeiro de 2015.
Uma das dificuldades apontadas para a
administração da CEB é o deficit da empresa, calculado em R$ 360 milhões. Vocês
conseguiram amenizar esse deficit em nove meses?
A CEB está passando uma crise
financeira muito severa. É lógico que estruturamos muita coisa no sentido de
contornar essa crise, mas ela não está contornada. A CEB só será saneada
financeiramente quando houver a organização societária do grupo CEB. Esses
projetos ainda vão levar um ano.
As medidas adotadas pela
administração surtiram algum efeito nesses meses?
Sim. A companhia ainda opera com
prejuízo, mas ele já diminuiu bastante. No primeiro semestre de 2015, foi de R$
36,5 milhões. No primeiro semestre de 2014, ele era de R$ 147,9 milhões.
Diminuiu muito.
Essa recuperação se deve às medidas
saneadoras ou já é efeito do aumento do preço da energia e das bandeiras
tarifárias?
É um conjunto de medidas. Tivemos o
efeito das bandeiras, o reajuste extraordinário que a Aneel deu; em agosto,
tivemos o reajuste ordinário de tarifa.
Este ano a tarifa de energia elétrica
subiu muito e incomodou o consumidor, não só na CEB, mas em todo o país…
Em função daquela redução tarifária de
2013, o setor energético ficou em uma situação muito difícil. Por isso, o setor
está passando por uma recuperação tarifária, que não está completa.
Isso significa que o setor precisa de
mais reajustes para equalizar as contas? Ou seja, a tarifa de energia elétrica
ainda pode subir…
Sim. Mas não é o momento de falar sobre
isso.
No início da gestão do Santiago, a
CEB estava tentando um empréstimo para a reestruturação, mas encontrava
dificuldade por causa da imagem desgastada da empresa no mercado. Vocês
conseguiram esse empréstimo?
Chegamos a fechar uma operação que tem
dois momentos. O primeiro já aconteceu: contratamos R$ 130 milhões. Agora
estamos esperando o aditamento do contrato de concessão para entrar com a segunda
parte.
Esse contrato de concessão é o da
própria CEB?
O governo acabou não conseguindo fazer
o processo em tempo certo. A nossa concessão expirou em 7 de julho deste ano. E
estamos sem concessão até hoje.
Vocês estão operando sem a concessão?
Estão ilegais?
Estamos em um limbo regulatório. Não é
só a CEB que está nessa situação, outras 37 concessionárias passam pela mesma
questão. O processo de renovação das concessões foi feito de forma atabalhoada.
Por isso, o Tribunal de Contas da União (TCU) fez recomendações à Aneel de
mudanças nos contratos e a agência está nesse processo. A expectativa do
próprio ministro que foi o relator do processo é a de que os contratos devem
estar prontos no fim do ano.
Qual é o impacto de operar sem
concessão? Consegue fechar contratos, por exemplo?
Contratos de fornecimento, sim. A
empresa continua operando normalmente. A questão que complica é do ponto de
vista de a empresa contratar empréstimos bancários. O banco precisa de
garantia. O que é a CEB sem concessão? A razão de ser da CEB é explorar a
concessão.
Em abril, a CEB teve que apresentar
um plano de reestruturação para a Aneel. Tiveram alguma resposta da
agência?
A própria Aneel já reconhece uma
melhora substancial no atendimento ao consumidor e na qualidade do serviço;
diminuímos a frequência e a duração das interrupções. Houve queda substancial
de consumidores, que, insatisfeitos com o serviço da CEB, procuravam a
Ouvidoria da Aneel. A Aneel tem os dados, eles mesmos cumprimentaram a empresa
pelas melhorias.
Mesmo com os constantes prejuízos que
a CEB vem apresentando, houve investimento em infraestrutura?
Investimos R$ 40 milhões nesses nove
meses. Estamos apostando em uma gestão mais focada. Dos 400 circuitos que
temos, 50 eram mais problemáticos. Então, focamos nesses. Além disso, estamos
automatizando a rede de tal forma que pode ter um desligamento, mas o
religamento será automático. Você não depende que uma equipe vá para lá e faça
manualmente; o sistema faz remoto.
A empresa precisava também mostrar
melhorias para justificar os aumentos?
O consumidor até entende que o reajuste
é necessário, mas, se você não dá uma contrapartida de qualidade para ele, ele
não aceita. Agora, quando o consumidor percebe que ele está pagando, a
qualidade melhorou e o atendimento também, ele entende e aceita.
A energia elétrica foi uma das
despesas domésticas que mais subiram. A CEB sentiu queda no consumo relacionada
ao preço?
O exercício de 2015 é um ano de ajuste
no setor. A desaceleração da economia este ano, tem, pelo menos, um efeito
positivo: o risco de apagão desapareceu. Deu um tempo para as concessionárias
se reorganizarem. Do ponto de vista do consumo per capita, ele caiu em torno de
6% por conta de um uso mais racional da energia.
Na tentativa de sanear a empresa,
vocês fizeram um trabalho cirúrgico, mexendo, inclusive, em cargos e
adicionais. Como foi a negociação com os funcionários e com o sindicato?
Encontraram resistências?
Ninguém fica satisfeito em perder
remuneração. Mas não houve contestação ou movimento contrário porque as
decisões eram justas. Se você perguntar para as pessoas individualmente, elas
vão responder que não ficaram satisfeitas, mas entenderam. Nós estamos agora em
um momento delicado, que é o da convenção coletiva de trabalho. Nós fizemos uma
proposta de aumento zero com a filosofia de que, para sanear a CEB, o trabalho
tem que ser conjunto.
Como vai funcionar esse
desinvestimento da CEB? No fim de setembro, foi publicado o fato relevante
comunicando a possibilidade de abrir o capital da CEB...
Nós publicamos o fato relevante para
informar ao mercado que a empresa está iniciando os estudos relativos à
capitalização da CEB, que passa por alienação de imóveis e venda da
participação da CEB geração. Hoje, o holding é sócio de várias empresas de
geração, como a de Corumbá e a do Lajeado.
Algumas distribuidoras, como a Celg,
em Goiás, venderam o braço de geração e tiveram problemas. Qual será o caminho
da CEB para evitar maus negócios?
Em sua história, a CEB foi conseguindo
sobreviver via aporte de recursos do GDF. A CEB é um filho perdulário de pai
rico. Ela se encalacrava e o GDF ia lá e colocava dinheiro. Mas isso não dá
mais. Por isso, antes de vendermos participação da geradora e alienar imóveis,
temos que deixar a empresa saneada para que a injeção de capital seja na
empresa e não para tampar os ralos. É importante ressaltar que a CEB
Distribuição vai continuar 100% com capital fechado.
Fonte: Flávia Maia – Correio
Braziliense – Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press