A acareação entre Paulo Roberto Costa e Alberto
Youssef foi um dos poucos pontos altos da CPI, segundo especialistas: o outro
foi a fala de Eduardo Cunha
CPI da Petrobras inicia votação do relatório hoje.
Saldo da comissão mostra ausência de convocações de parlamentares envolvidos no
esquema de corrupção e vista grossa às denúncias contra empreiteiras
A terceira CPI da Petrobras no Congresso nos
últimos cinco anos deve encerrar seus trabalhos esta semana, com a votação do
relatório do deputado Luiz Sérgio (PT-RJ). O texto começa a ser analisado hoje,
às 18h30, e os trabalhos não devem ser prorrogados, apesar dos bate-bocas em
torno do tema na última reunião do colegiado, na semana passada. Criada pela
Câmara dos Deputados em fevereiro, a comissão ignorou um dos principais alvos
da Operação Lava-Jato: políticos investigados por suspeita de receberem propina
do esquema de desvios e lavagem de dinheiro. No Supremo Tribunal Federal (STF)
e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, cerca de 50 nomes, entre
governadores, ministros, deputados e senadores estão sob investigação. Mas
apenas um deles depôs. Ainda assim, de forma espontânea. O presidente da
Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), apareceu no plenário e falou por horas. Por
ironia, a atitude agora ameaça custar o mandato do peemedebista.
Poderosos empreiteiros — costumeiros financiadores
de campanha de parlamentares, vários deles com assento na CPI — também foram
poupados. Muitos foram dispensados até de ouvir as perguntas dos parlamentares.
Outros receberam elogios por gerarem empregos no país, como o presidente da
maior construtora do Brasil, Marcelo Odebrecht. Segundo a Polícia Federal e o
Ministério Público, foi o dinheiro das empreiteiras que bancou propinas
distribuídas no meio político.
Na opinião de Mauro Márcio Oliveira, ex-professor
da Universidade de Brasília (UnB) especialista em CPIs, houve blindagem de
políticos do PT, PSDB e PMDB. Da base à oposição, diversas figuras desses
partidos foram alvos da Operação Lava-Jato. A opinião é corroborada pelo
deputado Ivan Valente (PSol-SP). Oliveira disse ao Correio ontem à tarde que o
maior trunfo da comissão foi abrir as condições para que Eduardo Cunha seja
cassado. “Para a oposição a Cunha, a CPI foi ultraeficiente, porque ele disse
que não tinha contas no exterior”, avaliou o ex-consultor do Senado que
participou de oito comissões de inquérito e criou um manual de métodos de
trabalho desse tipo de comissão.
Um deputado chegou a insistir para ser ouvido pela
comissão, mas não conseguiu. Jerônimo Göergen (PP-RS) nega fazer parte da lista
de deputados do partido que recebiam propina do esquema, abriu seus sigilos
bancários às autoridades e pediu ao presidente da CPI, deputado Hugo Motta
(PMDB-PB), para prestar depoimento. Não conseguiu. “O que comentavam lá na CPI
é que a fala do presidente serviria para ser uma fala em nome de todos”, disse
Göergen. “Eles não deixaram porque não marcaram. Até hoje não marcaram. Eu
continuo à disposição.”
Motta nega blindagem aos políticos e a PT, PSDB e
PMDB. Ele afirmou que Göergen e o deputado Waldir Maranhão (PP-MA), outro que
pediu para falar à CPI, não foram ouvidos por decisão dos parlamentares, embora
também não tenham sido convocados pela comissão. “Eles se ofereceram e depois
não foram mais. (Não foram) porque não quiseram mesmo.” No entanto, ele
acredita que os depoimentos de políticos seriam infrutíferos. “Você vai expor o
parlamentar e ele não vai colaborar porque está se defendendo na Justiça.”
Prioridade
Para Oliveira e para o presidente da CPI, a comissão teve dificuldades
de investigar parlamentares porque esse assunto é atribuição do Conselho de
Ética. Normalmente, comissões de inquérito focam no Executivo. No entanto,
governadores, ministros e políticos sem mandato sob a mira da Lava-Jato também
não foram ouvidos. Motta disse que não tem responsabilidade por essa omissão do
plenário porque pautou todos os pedidos de convocação. “É uma situação que o
colegiado tem que responder. Desse presidente, não houve (blindagem). Houve
outras prioridades, trouxemos outras pessoas importantes e acho que isso foi a
avaliação do colegiado.”
Para Hugo Motta, os personagens importantes do caso
foram ouvidos, e os deputados deram o seu melhor, apesar das limitações do
trabalho, como os vários depoimentos em que os investigados ficaram calados.
“Todos os que foram importantes tiveram a presença.” Ele defende a continuidade
dos trabalhos, mas entende que isso será difícil.
Por telefone, Eduardo Cunha disse ao Correio ontem
que já emitiu a sua opinião sobre a prorrogação da comissão. No dia 12, ele
afirmou ser “indiferente” à continuidade da CPI. E negou operar para encerrar
os trabalhos. “Tudo que acontece sou eu. É impressionante.” Ele nega ter contas
no exterior. Segundo Márcio Oliveira, a CPI foi nula para o PMDB, PT e PSDB
porque eles viveram à sombra do Ministério Público e da PF. Entretanto, é
preciso saber que as comissões de inquérito têm limites de investigação. “Para
o cidadão, a CPI não foi eficiente. Muitos não falaram”, disse o analista.
Motta espera que o relatório de Luiz Sérgio seja
apresentado “com pedido de punição de pessoas”. Além disso, ele espera
sugestões de leis para combater a corrupção, proibir a Petrobras de contratar
sem licitação e obrigar delatores premiados a colaborarem com as CPIs quando
seus acordos já estiverem confirmados pelo Judiciário.
“Desse presidente, não houve
(blindagem). Houve outras prioridades, trouxemos outras pessoas importantes”
(Hugo Motta (PMDB-PB), presidente da CPI)
Oito meses depois - O que a CPI fez de bom
» Depoimento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha
» Acareação de Paulo Roberto Costa
e Alberto Youssef
» Depoimento do ex-gerente da Petrobras Pedro
Barusco
O que não foi investigado
» Como o dinheiro saiu dos corruptores e chegou aos
políticos
» Quebras de sigilos bancário e fiscal de
empreiteiras e análise das transações
» Contas bancárias no exterior usadas para lavar e
esconder dinheiro
» Revelação das contas identificadas pela Kroll
dentro e fora do país
Eles não foram chamados
» Ministros e ex-ministros acusados em delações,
como Aloizio Mercadante, Edinho Silva e Antônio Palocci
» Governadores e ex-governadores, como Tião Viana
(PT-AC), Sérgio Cabral (PMDB-RJ) e Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ)
» Réus que incriminam Eduardo Cunha, como o lobista
Júlio Camargo e o policial Jayme “Careca” Alves
» Senadores, como Edison Lobão (PMDB-MA), Fernando
Collor (PTB-AL), Ciro Nogueira (PP-PI) e Benedito de Lira (PP-AL)
» Deputados, como o presidente da Comissão de
Constituição e Justiça, Artur Lira (PP-AL), Eduardo da Fonte (PP-PE) e José
Mentor (PT-SP)
» Oposicionistas acusados por investigados, como os
senadores Aloysio Nunes (PSDB-SP) e José Agripino (DEM-RN)
Relatório polêmico
Já sob os efeitos da Lava-Jato, a CPMI da
Petrobras, a última criada para investigar a estatal, teve dois relatórios. No
primeiro, o relator, Marco Maia (PT-RS), não citou partidos nem pediu
indiciamentos. Com a repercussão negativa do texto, o petista alterou o
documento e apresentou um novo, com pedido de indiciamento de 52 pessoas e o
apontamento de prejuízos milionários em negócios da estatal em Pasadena e Abreu
e Lima (PE).
Alto custo
As despesas da CPI da Petrobras com a acareação de dois réus da
Lava-Jato em Brasília custaram mais do que duas viagens da comissão inteira
para Curitiba. É o que mostram informações obtidas pelo Correio com deputados e
com dados da Câmara por meio da Lei de Acesso à Informação. Na reunião em que
foram ouvidos o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto
Youssef, os parlamentes informaram que o custo da viagem de ambos foi de R$ 180
mil. O primeiro veio do Rio de Janeiro. O doleiro, de uma cela na
Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, em jato da corporação.
Na reunião, eles esclareceram pontos obscuros do caso, segundo o deputado Ivan Valente (PSol-SP). Youssef afirmou que outro delator — que seria o lobista Fernando Baiano — é quem operou um pagamento de R$ 2 milhões para o ex-ministro Antônio Palocci em 2010, em favor da campanha da presidente Dilma Rousseff.
Nas duas viagens a Curitiba, em maio e no fim de agosto, o custo foi de R$ 145,2 mil — R$ 35 mil na primeira missão e R$ 110 mil na segunda. Pouco mais da metade do total gasto foi dispendido em diárias: R$ 76 mil. O restante, R$ 45 mil, com passagens e taxas de embarque.
Mas as viagens foram improdutivas. A maioria dos depoentes saiu da cadeia para não dizer nada aos deputados — que acabaram por elogiar os empreiteiros. Marcelo Odebrecht era um “jovem executivo de uma das mais importantes empresas brasileiras” segundo o relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ), que não retornou os contatos da reportagem. Ele ainda afirmou que a “importância da empresa para o desenvolvimento e as obras e empregos que geram no país” justifica usar “o instrumento de leniência”. (EM)
Na reunião, eles esclareceram pontos obscuros do caso, segundo o deputado Ivan Valente (PSol-SP). Youssef afirmou que outro delator — que seria o lobista Fernando Baiano — é quem operou um pagamento de R$ 2 milhões para o ex-ministro Antônio Palocci em 2010, em favor da campanha da presidente Dilma Rousseff.
Nas duas viagens a Curitiba, em maio e no fim de agosto, o custo foi de R$ 145,2 mil — R$ 35 mil na primeira missão e R$ 110 mil na segunda. Pouco mais da metade do total gasto foi dispendido em diárias: R$ 76 mil. O restante, R$ 45 mil, com passagens e taxas de embarque.
Mas as viagens foram improdutivas. A maioria dos depoentes saiu da cadeia para não dizer nada aos deputados — que acabaram por elogiar os empreiteiros. Marcelo Odebrecht era um “jovem executivo de uma das mais importantes empresas brasileiras” segundo o relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ), que não retornou os contatos da reportagem. Ele ainda afirmou que a “importância da empresa para o desenvolvimento e as obras e empregos que geram no país” justifica usar “o instrumento de leniência”. (EM)
Fonte: Eduardo Militão – Correio Braziliense –
Foto: Lula Marques/Agência PT