Não será atuando apenas nas questões táticas (como o uso progressivo
diferenciado da força em questão de ordem pública) que iremos aumentar a
efetividade da prática policial como um todo, pois existem outras variáveis no
plano estratégico e no campo gerencial, além das questões exógenas até à
própria policia. Numa nação onde a corrupção e a impunidade, hoje, são quase
dogma social e político, como podemos querer acabar com a violência apenas
fazendo uma reengenharia no comportamento tático de uma operação policial que
exigiu o uso da força? Não será certo também que agindo somente nesse plano que
obteremos padrões aceitáveis da letalidade policial ou da letalidade resultante
da criminalidade que no Brasil que já se tornou endêmica e com níveis
alarmantes. Quero lembrar-lhe que o enfrentamento da criminalidade e da
violência não se faz apenas com operações policiais e programas de mapeamento
de crimes, mas com o desenvolvimento de politicas públicas, principalmente, nos
campos sociais e econômicos.
Já como ex-secretário e no seu papel social de sociólogo e especialista
em politicas de combate a criminalidade você fez o seguinte diagnóstico à
coluna eixo capital: “No Distrito Federal, o secretário de Segurança é a rainha
da Inglaterra”. “E revela que um programa de redução da violência na capital do
país nunca vai obter o sucesso esperado sem um fortalecimento da figura do
secretário de Segurança”. Se você não aceitava o papel constitucional dos
órgãos de Segurança Pública do DF não tivesse aceitado o cargo. Seria mais
honesto. Mas creditar seu fracasso gerencial somente a isso é muito
reducionismo para minha inteligência. Ademais quem precisa de fortalecimento
não é o secretário em si, mas todo o sistema responsável pela manutenção da
ordem pública. Precisamos de instituições fortes e respeitadas e, mais que
isso, legitimadas pela sociedade.
O verdadeiro papel da Secretaria de Segurança Pública deve ser o de
orientar e coordenar a atuação operacional dos órgãos da secretaria, criar
sistemas informacionais e de gestão modernos para compartilhar com todas as
outras instituições, criar a doutrina de segurança pública de estado e não de
governo devidamente formalizada, aprovar leis que formalizem protocolos policiais,
instituir centros de auxilio online para subsidiar as investigações online,
criar sistemas de séries históricas de crimes e de criminosos e compartilha-lo
para todos os órgãos, criar mecanismos de controle da atividade policial com
participação da sociedade civil e todos os órgãos do sistema criminal, criação
de um centro de gestão integrada de segurança pública aproveitando o
conhecimento gerado na gestão de todos os outros serviços públicos, criação de
uma Fundação Pública para desenvolver novas tecnologias de apoio à atividade
policial e à investigação de cenas de crimes e, também o fomento de
intercâmbio entre a academia e empresas produtoras de novas tecnologias que
agregam valor à atividade policial e de várias outras ações que não foram
desenvolvidas na sua gestão e que dariam uma dimensão de relevância à
Secretaria de Segurança Pública e com chances de apresentar resultados
positivos na redução da criminalidade. Isso era de sua exclusiva
competência e você não fez nem propôs.
Para seu conhecimento o Ex-Secretário de Segurança Pública do DF, o
Coronel do Exército João Manoel Simch Brochado, criou um programa muito bem
sucedido de redução da criminalidade no DF que foi o projeto ROCAM e, não
precisou copiar como senhor copiou (porém sem os mesmos resultados que alcançou
em Recife) o programa de redução da criminalidade de Pernambuco (governo
Eduardo Campos) “Pacto pela vida,” como também não precisou interferir na
gestão interna dos órgãos policiais. Ele só precisou de liderança e do seu exemplo.
Ele conquistou o respeito e a admiração de todos os policiais do DF e não
precisou se impor como um secretário poderoso, ele usou o exemplo como
ferramenta de persuasão e de colaboração. Resultado: foi bem sucedido!
Lembro-lhe que as atividades de investigação e do inquérito da Polícia
Civil são conduzidos autonomamente pelos Delegados de Polícia e são balizados
pelo código penal e de processo penal e por um conjunto de conhecimento sobre
investigação e de tecnologias que um secretário não iria dominar em cinco anos
que é o período do seu governo. Então como o senhor iria interferir taticamente
nessa atividade? Que tudo que eles fossem fazer e fossem de natureza critica
deveriam, antes lhe ligar? As atividades da Polícia Militar são
altamente peculiares, criticas e também técnicas, pois as suas operações têm de
estar calcadas na sua formação e treinamento (como exigir algo de um
profissional que não foi formado para atuar dentro da sua perspectiva?), além
dessa nuance a prática policial da PMDF é balizada pela lei, no conceito
operacional estipulado nas macro politicas de segurança pública do DF, em
protocolos internacionais, em diagnósticos precisos da criminalidade e em suas
avaliações, em técnicas de policiamento ostensivo (incluindo o vídeo monitoramento)
e policiamento preditivo (resultado do mapeamento criminal), e de várias outras
técnicas que não dá para uma secretário que nunca foi do sistema criminal
entender em pouco tempo a ponto de querer modifica-los e interferir no seu
fazer tático. O senhor propôs mudanças nas grades curriculares dos
cursos de formação da PMDF? Não! E errou por não faze-lo, pois se é para mudar
comportamento e prática policial esse é o local onde o senhor deveria ter
investido, porém através de lei que fixaria os currículos de formação de todos
os cursos da PMDF.
Que você mesmo diz na mesma entrevista que não existe escassez de
recursos, que tem profissionais muito bem qualificados e teve um forte apoio do
governador para realizar o seu trabalho, mas mesmo assim você não conseguiu
deslanchar o seu programa. Então custo a acreditar que foi só por falta de
apoio da PMDF que você não teve o sucesso esperado por todos do Governo e da
Sociedade Civil. Creio que tenha lhe faltado liderança, humildade e talvez
credibilidade para desenvolver com sucesso a sua tarefa. Junto com essas suas
deficiências a sua pouca experiência de gestão pública para mim foi um fator
determinante do seu insucesso gerencial. Coloco sua designação para o cargo
como uma aposta equivocada e que não poderia dar certo e não somente por falta
de colaboração da PMDF. Para ser gestor na segurança pública não basta apenas
ser um brilhante acadêmico em sociologia e direitos humanos. Esse gestor não
pode ter a prepotência de querer ser um onipresente Deus tático, gerencial e
estratégico de todas as organizações que compõem a Secretaria de Segurança
Pública do GDF. Não é esse o papel do Secretário de Segurança da capital de
todos os Brasileiros. Se você não aceitava o papel constitucional dos órgãos de
Segurança Pública do DF não tivesse aceitado o cargo. Seria mais honesto.
O perfil do principal gestor da Segurança pública do DF tem de ser o de
um líder nato e saber administrar organizações complexas como é o caso das
instituições policiais, de defesa civil e de trânsito. Tem de saber administrar
idiossincrasias, vaidades e conflitos. Para ser um bom secretário, antes de
tudo, o titular da pasta tem de ter muita hora de voo em gestão pública. Saber
desenvolver uma perfeita articulação dentro de sua própria pasta e com outras
secretarias de estado e com outros órgãos e instituições públicas e privadas. O
Secretário deve ser um hábil articulador, um bom negociador e um exímio gestor
para poder liderar todos as organizações de segurança pública do DF, para
potencializar seus meios com a finalidade de alcançar-se os objetivos da macro
politica de segurança estabelecida pelo Governador do DF. Insistir em apontar
apenas a Polícia Militar pela pífia (como você mesmo diz) efetividade no
controle da criminalidade do DF é muito temerário e beira o ridículo. Como uma
secretaria de estado pode atingir índices, metas e resultados positivos com
essa visão centralista, personalista e minimalista como a sua?
Na sua visão o Comandante ideal da PMDF deveria ser um robô que deveria
lhe ligar para saber como proceder até numa simples operação de nível tático,
onde segundo o Ministério Público afirmou não ter havido exagero nem uso
desproporcional da força. Depois dessa visão nem quero imaginar o seu modelo de
comandante ideal nos planos gerencial e estratégico, pois se numa corriqueira
operação de rua você acha que deveria ser consultado. Imagino nas outras
situações. Hipoteticamente, imaginemos um médico que faz uma cirurgia num
centro cirúrgico ter de ligar para o secretário de saúde para que este lhe diga
quais procedimentos ele deve adotar durante a cirurgia. Creio que para isso
existem os protocolos e outros mecanismos e ferramentas gerenciais. Você alguma
vez tentou criar ou mudar os protocolos existentes? Tentou aprovar leis
estabelecendo esses protocolos? Pelo que sei, não! Você não criou nada nem
mudou nada. Aliás, nunca foi divulgado as políticas públicas desenvolvidas pela
sua secretaria nem pelo governo como um todo.
Somente isso demonstra o seu despreparo e expõe uma prepotência sem
medidas que alguém queira ser o tudo e o todo poderoso (você mesmo falou na sua
entrevista sobre a necessidade de empoderamento do secretário) na administração
pública. Gestores que sabem descentralizar e cobrar resultados têm nesse
processo um dos melhores caminhos para o sucesso de sua gestão. Todos têm os
seus papéis e limitações legais. Não é a sua visão personalista que tem de
prevalecer, mas sim a visão legal e legitima da boa técnica policial que sempre
deve imperar em toda a prática policial. Isso me parece mais uma atitude de uma
mente ditatorial ou uma ingenuidade de quem nunca sentou numa cadeira de gestor
público.
Existe um verdadeiro acervo de vídeos de todas as fases dessa operação
que vão desde as negociações até o seu desfecho. Em todas ficou explicito o
caráter de legalidade, da boa técnica e do espirito democrático dos agentes da
PMDF envolvidos. Por acaso você viu alguns deles? Além disso, O Dr. Paulo
Gomes, Promotor Militar do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios divulgou uma nota pública dizendo da legalidade e da boa técnica da
operação. O pronunciamento do Promotor colocava um ponto final na questão, mas
sua carta cheia de mágoas e ressentimentos reavivou o problema, tentou culpar
uma instituição pelo seu fracasso gerencial e colocou os professores e parte da
opinião pública contra o governo do Distrito Federal.
Achei que a sua carta e sua entrevista foram de um raro oportunismo
politico que não acrescentou nada a ninguém, pois não lhe eximiu do insucesso
da politica que você criou e administrou enquanto Secretário. Pelo que pude
deduzir lendo sua carta e sua entrevista comparando com o que você falou
enquanto secretário que os índices da criminalidade no DF caíram a níveis
aceitáveis e que estavam no caminho certo. Lembra? Na carta você falou dos
baixos índices no controle de determinados crimes e culpou a Polícia Militar
pelo fracasso do não atingimento das metas estabelecidas, em qual das duas ocasiões
você falou a verdade? Oi foi um momento de descontrole e de retaliação porque o
Governador não exonerou o Comandante da PMDF?
Em suma, sua carta foi ruim para você, pois expôs uma faceta da sua
personalidade que a sociedade não conhecia, foi ruim para a segurança pública
porque também não acrescentou em nada e só desacreditou mais o setor e foi
muito ruim também para uma instituição que serve à cidadania há mais de 200
anos. Se alguém me perguntar se a PMDF está totalmente certa na prestação dos
seus serviços eu direi que não, pois ninguém tem o condão da perfeição visto
que é uma organização composta de seres humanos e a nenhum de nós e dado a
perfeição porque ela é divina. Porém, se forem bem conduzidos eles podem
melhorar ao melhor nível que alguém possa conduzi-los através da liderança, do
conhecimento e do exemplo.
Mas, especificamente para o cidadão sua carta foi altamente danosa.
Mostrou a face de um Secretário despreparado para o cargo e gerou um sentimento
de desconfiança do cidadão no seu governo e na sua polícia. Acirrou a descrença
da população na efetividade do Estado no controle da criminalidade. E para o
Governo foi um desastre. Você deu condições para que sindicalistas
irresponsáveis pensem que podem fazer tudo que quiserem e prejudicar a maioria
da população restringindo-lhe o direito de ir e vir e, que também podem
prejudicar a ordem pública, pois a tentativa de fechamento de todas as saídas
rodoviárias do plano piloto foi mais um ato de baderna e de vandalismo do que
de reivindicação de professores que eu acho justa e válida. Os verdadeiros
professores não fizeram parte dessa bagunça dos sindicatos. Mas, sempre vai ter
um falso político que vai se aproveitar da situação para tentar angariar votos.
No final foi muito ruim para os profissionais da educação e da polícia, pois
passou para a sociedade uma imagem destorcida das duas categorias
profissionais. E por último, um conselho de alguém que já viveu mais que você:
quando alguém se auto avaliar despreparado para assumir determinado cargo
público seja honesto consigo mesmo e não aceite, pois é muito feio culpar os
outros pela nossa própria incompetência. Volte para sua cátedra e para seu
ambiente de pesquisa porque lá você é brilhante e não precisa culpar ninguém
pelos seus fracassos.
Atenciosamente,
Wellington Corsino do
Nascimento.