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#URBANISMO » Banca da 116 Norte ameaçada

Maura Melo Machado é proprietária da banca há 11 anos e criou relação de amizade com os clientes

A construção do último bloco da superquadra pode acabar com o ponto de venda de jornais e revistas, que lá funciona há 30 anos. Moradores defendem a realocação do espaço, que ainda não tem destino certo e foi engolido pelos tapumes da obra.

A banca de jornais e revistas de Maura Melo Machado, 45 anos, faz parte do cenário da 116 Norte há três décadas. Em meio aos exemplares e às notícias a mulher aprendeu o gosto de cada leitor da superquadra. “Alguns reservam mais edições no fim de semana. Outros pedem jornais de outras praças como Rio e São Paulo”, conta. Os anos de experiência darão lugar nos próximos meses ao bloco C — onde apartamentos funcionais do Ministério da Defesa e do Exército serão erguidos. Os tapumes da obra engoliram o comércio  e a possibilidade da típica banquinha brasiliense deixar de habitar a rotina da quadra desencadeou uma comoção entre os moradores. Os picolés e os doces  pararam  de ser vendidos, mas os periódicos ainda podem ser adquiridos — só não se sabe até quando. O espaço, que outrora era ponto de encontro, agora está sucumbindo na poeira vermelha da construção. 

Antes mesmo de Maura se tornar proprietária da banca, ela já estava lá, em frente ao  bloco A, havia até uma árvore que foi arrancada e a história se perdeu no tempo. A jornaleira é a segunda dona do espaço. Ao todo ,são 11 anos de dedicação diária ao ofício. As lágrimas ao falar da banca revelam a angústia de procurar um novo rumo. “Minha vida é pautada por isso aqui. Minha família sobrevive com os recursos da banca. Além do mais, criei uma relação de amizade com todos aqui. Alguns são confidentes”, afirma Maura. 

Ao perceberam a movimentação da reportagem, os  moradores da quadra e os prestadores de serviço da redondeza logo saíram em defesa da banca. “Não existe razão para tirar. Hoje pela manhã (ontem), levei meu neto para comprar revistas de colorir e adesivos. Ali é onde os moradores se encontram. Não se pode mexer nas referências de um lugar. A banca é um patrimônio da quadra”, considera a professora de inglês Magna Teixeira Andrade, 64 anos. “O mínimo que deve ser feito é o remanejamento da banca”, defende a cabeleireira Aldenira Alves, 53, que mora no bloco A há 8 anos. 

Jailson da Silva Alves, 31, trabalha há pelo menos 10 anos  nos blocos da quadra e reclama da retirada do comércio. “Antes mesmo de abrir ,os moradores de aglomeram lá”, conta. Francisco Normade, 20 , compra diariamente revistas e jornais semanais. Com a retirada da banca, ele terá que andar mais para encontrar as publicações. “É uma pena que a história desse espaço não seja respeitada”, lamenta o jovem que trabalha na quadra há dois anos e meio. 

Adaptações ao tempo
As 97 bancas que existem no Plano Piloto tiveram de se adequar com o  passar das décadas. Quase todas as superquadras contam com uma banca de pelo menos 20 metros quadrados. Hoje, muitas trabalham com outras atividades além da venda de jornais e revistas: criatividade para cultivar público à revelia da legislação. A regulamentação do segmento surgiu em meados de 1992.  Depois disso, outros dois decretos em 1994 e 1998 consolidaram as regras vigentes até hoje. A lei distrital em vigor diz que jornais e revistas devem ser a atividade-fim das bancas, mas o texto abre precedente para relojoarias e sapatarias. 

Em  toda a capital federal existem pelo menos 200 bancas, segundo dados do Sindicato dos Jornaleiros (SindJor-DF). Em 2010 o segmento chegou a ter 1,1 mil pontos. “O problema é que a regularização é alterada toda vez muda o governo. O certo no caso da 116 Norte seria a realocação em outro espaço da quadra. As bancas se tornam vítimas da interpretação da lei. Não se pode acabar com a representatividade dos jornaleiros dessa maneira. Falta incentivo”, reclama José Maria Cunha, presidente da entidade.

A vice-governadoria, que coordena as administrações regionais, pediu para a Administração de Brasília e a Secretaria de Gestão do Território e Habitação (Segeth), responsáveis pelo ordenamento da cidade, estudarem a possibilidade de realocação da banca. Mesmo com a iniciativa, não há garantias de que permaneça na quadra.  A Agência de Fiscalização (Agefis), por meio da assessoria de comunicação, garantiu que não houve nenhum despacho do órgão referente à demolição da banca. Até o fechamento desta edição, a Administração de Brasília e a Segeth não responderam à reportagem.  

"Não se pode mexer nas referências de um lugar. A banca é um patrimônio da quadra”. 
(Magna Teixeira Andrade, professora de inglês)


Por: Otávio Augusto – Foto: Hugo Gonçalves/Esp/CB/D.A.Press - Correio Braziliense.

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