Uma das ações mais polêmicas foi a derrubada em
Vicente Pires
Em clara pressão contra a atuação da Agefis, a maioria dos distritais critica as derrubadas de ocupações ilegais sob o argumento de estarem ao lado do povo. E chega a ameaçar a criação de uma CPI para investigar o órgão
A cidade que prosperou e fez a fortuna de muitos por meio da grilagem de terras públicas assiste, em pleno 2015, a um movimento da maioria dos deputados distritais para alimentar a ilegalidade. Desde que o governo iniciou as desocupações irregulares, parlamentares têm se declarado abertamente contrários às ações desencadeadas pela Agência de Fiscalização (Agefis), a ponto de pedirem “a cabeça” da presidente da agência, Bruna Pinheiro. Ameaçam também a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o órgão. O Ministério Público do DF e Territórios acompanha de perto os trabalhos do GDF e afirma que “a desocupação de área irregular não é uma opção de governo, é uma obrigação legal”.
Na última sessão do ano, o tema foi tratado
freneticamente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), no qual tramitava o
PDL 53/2015, da deputada Liliana Roriz (PRTB) — uma tentativa da parlamentar de
interromper as derrubadas por seis meses. A matéria, no entanto, foi barrada na
CCJ. Chico Leite (Rede) fez um parecer contrário à proposta e recebeu o apoio
de 22 distritais. Segundo ele, foge da competência do Legislativo.
A tentativa de instalar a CPI da Agefis também não
vingou. Por volta das 19h, Cristiano Araújo (PTB) garantiu ao Correio que pelo
menos 10 parlamentares haviam assinado o documento de apoio à criação da
comissão. A proposta, porém, não entrou em pauta porque, segundo a assessoria
do deputado Wellington Luiz (PMDB), não houve acordo no colégio de líderes. O
deputado Rodrigo Delmasso (PTN) chegou a assinar o requerimento, mas decidiu
retirar o nome após saber que o pedido de CPI partia de moradores. Já o petista
Ricardo Vale garantiu não ter apoiado a iniciativa em respeito a um suposto
acordo feito com o governo de que nenhuma derrubada seria feita até janeiro. A
assessoria da Agefis nega tal acordo e cita a retomada das derrubadas na orla
do lago na terça-feira, quando os fiscais removeram, em um dos lotes da QL 10
do Lago Sul, 345 metros de cerca-viva e de alambrado e 80 metros de base de
alvenaria.
Guerra
Faz pelo menos seis meses que integrantes do
Legislativo local têm se dedicado a desqualificar as ações da Agefis. Parte dos
parlamentares chegaram a chamar de “fascista” a atuação da agência e criaram
uma Frente pela Regularização de Vicente Pires. Tentou-se, inclusive,
protocolar um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para impedir as derrubadas
na orla do Lago Paranoá, apesar da decisão judicial.
Em audiência pública com moradores de Vicente Pires,
distritais ouviram pessoas que tiveram casas derrubadas na Chácara 200 da Rua
8. Sandra Faraj (SD) se declarou do lado dos moradores, negou ter indicado
Bruna Pinheiro para o cargo. Sob os gritos de “pede a cabeça dela”, a
parlamentar retrucou: “Já pedi”.
Na sessão de terça-feira, o deputado Bispo Renato
Andrade (PR) criticou as ações da Agefis e defendeu que a Câmara Legislativa
“precisa ser informada do que vai acontecer”. “Sou contra a invasão, contra a
grilagem, mas também sou contra a derrubada de casas habitadas” afirma. Telma
Rufino (sem partido) também criticou as derrubadas. “Nós, desta Casa, somos
contra as ações truculentas da Agefis, mas também somos contra todo e qualquer
tipo de grilagem.”
A tentativa de Liliane Roriz (PRTB) de impedir as
derrubadas temporariamente foi frustrada pelo parecer do deputado Chico Leite.
Pela proposta, seriam beneficiadas as construções consolidadas, “assentamentos
informais com características urbanas declarados de interesse social”. Entre os
terrenos, está Vicente Pires, local de diversas demolições no atual governo. A
proposição também incluía Paranoá, Itapoã, Santa Maria, Fercal, Sobradinho,
entre outros lugares. Regimentalmente, a parlamentar tem cinco dias para
recorrer. Como os trabalhos foram encerrados ontem, o prazo passa a contar em
fevereiro do próximo ano.
Se politicamente o governo é bombardeado pela
Câmara Legislativa para postergar as ações de desocupação das áreas ocupadas
ilegalmente, de outro é pressionado pelo MPDFT a tomar providências no sentido
de coibir as invasões. Somente este ano, há pelo menos quatro procedimentos
encaminhados ao GDF cobrando o combate ao parcelamento irregular do solo. Entre
os documentos, estão os casos do Setor Habitacional Vicente Pires e de três
núcleos rurais de Brazlândia: o Maranatha, Incra 7 e Alexandre Gusmão. Por meio
de nota, as promotorias de Justiça e Defesa da Ordem Urbanística e de Defesa do
Meio Ambiente afirmaram que acompanham os trabalhos da Agefis. “A desocupação
de áreas irregulares não é uma opção de governo, é uma obrigação legal.
Cobramos com rigor que isso seja feito, sob pena de responsabilizar o gestor
responsável por omissão.”
Sobre as críticas da CLDF, a diretora da Agefis,
Bruna Pinheiro, diz considerar legítimos todos os questionamentos da Casa que
representa o povo e legisla sobre as questões da cidade. “Como não poderia
deixar de ser, a Agefis pauta suas ações na legalidade, baseando-se notadamente
nas leis distritais que tratam do assunto. Infelizmente, ainda há perspectiva
de novas derrubadas, uma vez que continuam existindo novas grilagens de terra
pública”, diz. Segundo Bruna, os critérios continuam os mesmos: prioridade para
derrubadas de construções novas, não passíveis de regularização, e construídas
a partir de julho de 2014.
Fonte:
Adriana Bernardes – Matheus Teixeira – Foto: Carlos Vieira/CB/D.A.Press –
Correio Braziliense