Em decisão histórica, Supremo decide que réus condenados em segunda
instância podem ser detidos enquanto recorrem a tribunais superiores
Sob os ecos da Operação Lava-Jato, o plenário do
Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão histórica ontem. Por sete
votos a quatro, os ministros decidiram que réus condenados em segunda instância
podem ficar presos enquanto recorrem às Cortes superiores. A medida representa
uma “guinada” a um direito mais repressivo às organizações criminosas, mas
também mais limitador do direito de defesa dos acusados. Em 2009, num outro
julgamento considerado histórico, o Supremo tomou decisão inversa. Agora, com
mudança em sua composição, atende a um projeto de lei patrocinado pela
Associação dos Juízes Federais (Ajufe), pelo ex-ministro do STF Cézar Peluso e,
de certa forma, às “10 medidas” anticorrupção propostas pelo Ministério
Público.
Não se sabe ao certo quantas pessoas serão
atingidas pela decisão, um cálculo que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
tenta concluir até o ano que vem. Lewandowski, contrário à medida, afirma que
vai aumentar o número de presos provisórios no país. Hoje, eles são 191 mil,
43% do 446 mil detidos no país.
O juiz da Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro,
comemorou a decisão de ontem. “O Supremo, com respeito à minoria vencida,
fechou uma das janelas da impunidade no processo penal brasileiro”, disse ele
ao Correio. Ele destacou que as garantias dos réus não estão sendo minimizadas.
“Não há violação da presunção de inocências pois a prisão opera após o
julgamento, com a consideração de todas as provas, e ainda por um Tribunal de
Apelação. Reinsere a prática jurídica brasileira nos parâmetros internacionais
sobre a matéria. O Supremo só merece elogios.”
O relator foi Teori Zavascki, para quem a prisão
imediata após condenação em segunda instância não ofende o princípio da
presunção da inocência. Votaram com ele Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz
Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Em 2009, o STF definiu que só
cabia prisão após o chamado “trânsito em julgado”, o término completo do
processo, no Supremo, quando não cabe mais nenhum recurso. Ontem, foram
derrotados os ministros Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio, Rosa Weber e Celso
de Mello.
Fux afirmou que “ninguém consegue entender” a
situação brasileira: “O cidadão tem a denúncia recebida, é condenado em
primeiro grau, é condenado no juízo da acusação, é condenado no STJ (Superior
Tribunal de Justiça) e ingressa presumidamente inocente no Supremo”.
Lewandowski se disse “perplexo” com a “guinada”, depois de os ministros terem
considerado que “o sistema penitenciário brasileiro está absolutamente falido”.
Repercussão
O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida
Castro disse que, em um dia “triste” para o Judiciário, o sistema brasileiro se
assemelhou ao norte-americano, menos garantista. Ele destacou informação de que
o STF modificou 25% das condenações no ano passado. “De cada quatro pessoas
condenadas, uma teria cumprido pena ilegalmente se essa decisão estivesse em
vigor.”
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
comemorou a decisão. “Trata-se de um passo decisivo contra a impunidade no
Brasil”, avaliou.
Já a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) divulgou
nota em que “respeita a decisão do STF, mas entende que a execução provisória
da pena (...) produzirá danos irreparáveis na vida das pessoas que forem
encarceradas injustamente”.
Juristas que foram ouvidos em séries de entrevistas
do Correio nos últimos meses defenderam que uma das principais medidas para
reduzir a impunidade no país era justamente permitir a prisão após duas
condenações judicial.
O presidente da Associação dos Juízes Federais
(Ajufe), Antônio César Bochenek, também defendeu a mudança de postura do
Supremo, argumentando que havia uma nova composição na Corte. O coordenador da
força-tarefa da Lava-Jato no Ministério Público do Paraná, Deltan Dallagnol,
disse que os procedimentos se acumulam nas Cortes superiores em “volume
gigantesco de casos a serem julgados”. “O Judiciário funciona como uma
pirâmide”, afirmou, em 28 de dezembro. O número de julgadores da primeira para
a segunda instância diminui drasticamente. Agora, o volume de casos não diminui
na mesma proporção, em forma de pirâmide.”
Tietagem na Câmara
O agente Newton Ishii, mais conhecido como “Japonês
da Federal”, viveu um dia de estrela de cinema na Câmara dos Deputados. Em
visita ao parlamento, recebeu tratamento de celebridade. Fez fotos com
deputados, assessores e servidores nos corredores e no plenário. Ishii ficou
famoso por ter acompanhado as detenções dos principais políticos e empresários
presos na Operação Lava-Jato. Fez sucesso também no carnaval, como tema de
marchinha, máscara personalizada e até um boneco gigante de Olinda. À noite, o
Japonês da Federal participou da posse da nova diretoria da Federação Nacional
dos Policiais Federais.
Fonte: Eduardo Militão – Correio Braziliense – Fotos: Jorge William/Agência O Globo – Blog-Google