Apesar do fechamento de bares e da pressão de alguns moradores, os
artistas brasilienses continuam resistindo à censura da Lei do Silêncio
Há mais de 10 anos no cenário musical de Brasília, o grupo Bejazz tem o bar Pinella como a principal casa de shows, onde toca todas as terças há dois anos e meio. Com a aplicação da Lei do Silêncio, a trupe teve de adaptar as apresentações para atender às reclamações dos moradores, que alegavam ultrapassagem do limite sonoro.
“Nosso repertório é muito tranquilo e sempre tocamos relativamente baixo, até para não incomodar quem está querendo conversar nas mesas”, explica o baterista, Gafanhoto. Mesmo assim, não foi o suficiente para a vizinhança. O bar está isolado acusticamente, as caixas de som foram redirecionadas e o BeJazz não utiliza amplificadores. “A qualidade do som fica horrível e toda semana o público reclama que não consegue ouvir direito”, ressalta o baterista. “Mas melhor assim que não poder tocar”, suspira.
Além da restrição à liberdade para fazer boa música, as mudanças trouxeram prejuízos financeiros, porque a arrecadação de couvert diminuiu com a baixa rotatividade de clientes no bar. É o que também aconteceu com o grupo de samba Filhos de Dona Maria, que perdeu metade da renda mensal com o fechamento do Balaio Café, na 201 Norte. O grupo tocava todas as quintas antes de a casa ser fechada por não conseguir arcar com as multas.
Atualmente, grupo se apresenta no Círculo Operário, no Cruzeiro, “o único lugar que sobrou”, lamenta Khalil Santarém, vocalista do Filhos de Dona Maria. Uma alternativa que funciona para eles, que têm certa estrada no samba em Brasília, mas que o vocalista não considera a mais viável. “Nós tiramos o dinheiro do próprio bolso para organizar os eventos e arcamos com todas as perdas”, explica.
Carência de espaço
Separadamente, os integrantes também sofreram com as mudanças. Khalil tocava com frequência no Café da Rua 8, no Senhoritas e no bar Tartaruga, na Asa Norte. Todos fechados. “Isso me afetou muito profissionalmente, porque foram os lugares onde aprendi a tocar, onde tive a vivência da rua, que é essencial”, queixa-se.
O Feitiço Mineiro, o Bar Brahma e o Bar do Ferreira, onde o percussionista Vinícius costumava se apresentar, tiveram de retirar as caixas de som após terem as programações musicais temporariamente suspensas. “Você toca acústico em um ambiente que não é propício a esse tipo de show”, expõe.
Mais recente no cenário e com dois discos lançados, a banda de rock Marrakitá teve perspicácia e um pouco de sorte para ganhar o reconhecimento que alcançou em dois anos de estrada. O grupo gravou o primeiro álbum ao vivo e o lançou no YouTube para facilitar a divulgação do trabalho autoral.
Hoje, eles costumam fazer shows em teatros, porque “é onde funciona melhor”, como explica João Pedro Mansur, vocalista e guitarrista da banda.Ele também é guitarrista e compositor da banda caloura CineMondatta, de rock alternativo. A bordo das duas, tocou nos extintos pub 10 0 13 e no Balaio, e lamenta a atual situação: “A música autoral não encontra mais espaço em Brasília”.
Há mais de 10 anos no cenário musical de Brasília, o grupo Bejazz tem o bar Pinella como a principal casa de shows, onde toca todas as terças há dois anos e meio. Com a aplicação da Lei do Silêncio, a trupe teve de adaptar as apresentações para atender às reclamações dos moradores, que alegavam ultrapassagem do limite sonoro.
“Nosso repertório é muito tranquilo e sempre tocamos relativamente baixo, até para não incomodar quem está querendo conversar nas mesas”, explica o baterista, Gafanhoto. Mesmo assim, não foi o suficiente para a vizinhança. O bar está isolado acusticamente, as caixas de som foram redirecionadas e o BeJazz não utiliza amplificadores. “A qualidade do som fica horrível e toda semana o público reclama que não consegue ouvir direito”, ressalta o baterista. “Mas melhor assim que não poder tocar”, suspira.
Além da restrição à liberdade para fazer boa música, as mudanças trouxeram prejuízos financeiros, porque a arrecadação de couvert diminuiu com a baixa rotatividade de clientes no bar. É o que também aconteceu com o grupo de samba Filhos de Dona Maria, que perdeu metade da renda mensal com o fechamento do Balaio Café, na 201 Norte. O grupo tocava todas as quintas antes de a casa ser fechada por não conseguir arcar com as multas.
Atualmente, grupo se apresenta no Círculo Operário, no Cruzeiro, “o único lugar que sobrou”, lamenta Khalil Santarém, vocalista do Filhos de Dona Maria. Uma alternativa que funciona para eles, que têm certa estrada no samba em Brasília, mas que o vocalista não considera a mais viável. “Nós tiramos o dinheiro do próprio bolso para organizar os eventos e arcamos com todas as perdas”, explica.
Carência de espaço
Separadamente, os integrantes também sofreram com as mudanças. Khalil tocava com frequência no Café da Rua 8, no Senhoritas e no bar Tartaruga, na Asa Norte. Todos fechados. “Isso me afetou muito profissionalmente, porque foram os lugares onde aprendi a tocar, onde tive a vivência da rua, que é essencial”, queixa-se.
O Feitiço Mineiro, o Bar Brahma e o Bar do Ferreira, onde o percussionista Vinícius costumava se apresentar, tiveram de retirar as caixas de som após terem as programações musicais temporariamente suspensas. “Você toca acústico em um ambiente que não é propício a esse tipo de show”, expõe.
Mais recente no cenário e com dois discos lançados, a banda de rock Marrakitá teve perspicácia e um pouco de sorte para ganhar o reconhecimento que alcançou em dois anos de estrada. O grupo gravou o primeiro álbum ao vivo e o lançou no YouTube para facilitar a divulgação do trabalho autoral.
Hoje, eles costumam fazer shows em teatros, porque “é onde funciona melhor”, como explica João Pedro Mansur, vocalista e guitarrista da banda.Ele também é guitarrista e compositor da banda caloura CineMondatta, de rock alternativo. A bordo das duas, tocou nos extintos pub 10 0 13 e no Balaio, e lamenta a atual situação: “A música autoral não encontra mais espaço em Brasília”.
Os Filhos de Dona Maria: renda reduzida pela metade
com o fechamento dos bares
Músico e proprietário da casa de shows O’Rilley, na
409 Sul, Gustavo Gondim organiza eventos esporádicos nas quartas-feiras para
promover bandas autorais, porque sabe “como é difícil a luta para se
estabelecer”. O cachê depende da arrecadação da bilheteria, cujos ingressos são
entregues às bandas antecipadamente para venda.
Boicote à cultura
Brasília é reconhecida como um celeiro
musical — especialmente de instrumentistas — que exporta talentos Brasil afora.
Nomes como Renato Russo, Éllen Oléria, Hamilton de Holanda e Cássia Eller
tocaram em bares e restaurantes da capital antes de se tornarem grandes
expoentes da música brasileira. “O que está acontecendo vai contra a história
da música brasileira. O samba, o maracatu, o frevo e toda a nossa cultura
musical foram criadas nas ruas”, ressalta Gafanhoto.
Há dois anos na estrada, a banda Marrakitá lançou o
primeiro disco no YouTube
Como muitos outros músicos de Brasília, ele teme
que a única solução para a atual conjuntura seja o fechamento das casas que
ainda mantém a música como atração. “Gostem ou não, a produção cultural está
ligada à boemia. Quem paga para ouvir um grupo tocar em um bar o faz quando não
está trabalhando”, reforça.
Diante das circunstâncias, a agenda do Velvet Pub, na 102 Norte, está
lotada até o fim de março, afinal “a oferta de lugares para tocar vem
diminuindo”, como atesta o proprietário, Gustavo Schettini. No ano passado, a
casa recebeu 34 bandas autorais e mantêm a programação com shows ao vivo de
quinta a sábado.
Isolada acusticamente desde a inauguração, as reclamações dos vizinhos
costumam errar o alvo. “Já ligaram achando que o som era do Velvet, mas vinha
de um show no Estádio Mané Garrincha”, conta Gustavo, que ressalta o fato de
eventos patrocinados pelo GDF não terem os decibéis controlados.
Para bandas de forró, que tradicionalmente tocam em clubes, isolados de
áreas residenciais, o incômodo de moradores não é frequente. Mesmo assim, o
trio pé de serra Zabumbazul, formado há 15 anos, começou a produzir os
próprios eventos, como o baile semanal na AABB, para combater a redução de
atividades musicais da cidade.
Bruno Gafanhoto destaca a intolerância dos moradores do Plano Piloto e a
tendência a reclamar de eventos esporádicos como se fossem constantes. “O que
me deixa apreensivo é que essa situação parece uma queda de braço que não vai
acabar. Nunca vejo a vizinhança ficar satisfeita”, desabafa. Ele lembra ter
ouvido de um morador que o maior incômodo eram as conversas de bar, “o que é um
absurdo. Como você vai multar as pessoas ou os estabelecimentos por isso?”.
Queda de braço
Para Khalil Santarém, dos Filhos de Dona Maria, além de o limite sonoro
determinado pela lei ser muito abaixo do razoável, a fiscalização arbitrária é
o que tem gerado mais problemas. “Chega a ser ridícula a forma como é feita a
medição, porque não existe regra”, destaca. Ele conta que, quando ainda tocava
no Balaio, um representante do Ibram mediu os decibéis a 10 metros da caixa de
som. Segundo ele, quem opta por morar no Plano deve ter a consciência de que é
uma zona mista: “Sempre vivi próximo a bares, mas fecho minha janela e vou
dormir”.
Na visão de Vinícius, também integrante do grupo, a imagem da cultura
musical da cidade está deturpada por conceitos equivocados que tendem a
classificar o som tocado em bares como ruidosos. “Quem aparece nas mídias faz
música; quem não, faz barulho”, exemplifica.
Fonte: Correio Braziliense – Foto: Guto Amorim, Karen Cardoso, Ítalo Amorim
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