"O
que se quer é uma garantia de direitos, de que do Amazonas até o Rio de Grande
do Sul todos tenham os mesmos direitos. Mas, para um país continental como o
Brasil, esse é um grande desafio" (Vânia Leila, professora da
Escola Classe 64 de Ceilândia)
Universidade é responsável por compilar as sugestões que
farão parte das diretrizes de uma base curricular unificada no país. Após
análise preliminar do documento, associação de pais e alunos do DF defende
maior ênfase nos objetivos relacionados à alfabetização
O Brasil começou a discutir, no ano passado, um dos pontos
cruciais do Plano Nacional de Educação: a Base Nacional Comum Curricular (BNC).
O primeiro grande desafio, depois da redação da proposta inicial, feita pelo
Ministério da Educação (MEC), será compilar as contribuições enviadas pela
internet. São quase 10 milhões, de acordo com o último balanço divulgado pela
pasta, e o processo de análise será essencial para garantir que pais,
professores e gestores sejam ouvidos com relação ao que esperam da aprendizagem
dos filhos e estudantes. Assim, também será mais fácil o acompanhamento da
trajetória escolar durante toda a educação básica.
Segundo Hilda Micarello, coordenadora da equipe de redação da
proposta e professora do Departamento de Educação da Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF), língua portuguesa e educação física foram os componentes
que tiveram o maior número de participações por meio do portal até o momento. A
análise foi feita a partir dos primeiros relatórios entregues pela Universidade
de Brasília (UnB) e pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
(PUC-Rio), no fim de janeiro. Para ela, o documento permitirá a elaboração de
políticas públicas essencias à educação brasileira (leia Para saber mais).
Na UnB, uma equipe de aproximadamente 40 profissionais já começou
a analisar os dados recebidos até 15 de dezembro. A equipe é dividida em dois
grupos, uma da área de estatística e outra que engloba profissionais de letras,
geografia, pedagogia, economia, engenharia, informática e auxiliares de
pesquisa. Além disso, conta com a colaboração de mais de 10 especialistas da
PUC-Rio e de outras instituições federais.
Thérèse Hofmann afirma que a UnB trabalhará para garantir
que a participação seja efetiva
A decana de Extensão da UnB, Thérèse Hofmann Gatti, destaca que
esse tipo de consulta pública é inédita no país. A equipe está trabalhando na
tabulação e na categorização dos dados e fará o mesmo nos dois próximos
recortes da consulta, um ainda neste mês e outro no fim do prazo, em março.
Serão analisados os termos mais utilizados, quais os objetivos de maior
discordância, quais tiveram maior sugestão de exclusão e quais foram as
sugestões de inclusão. Será possível computar ainda as unidades da Federação
que mais participaram, bem como a participação por escola, indivíduo,
associação, entre outros. “Nosso papel nesse processo é garantir que toda
colaboração seja computada e considerada devidamente”, resume Thérèse.
Todos participam
A colaboração do DF no processo de elaboração da Base começou já
na composição do documento inicial. Quatro professores da UnB e dois da rede
pública de ensino da capital, indicados pelo Conselho Nacional de Secretários
de Educação (Consed), participaram da construção do texto em diversas áreas do
conhecimento nas diferentes etapas do ensino. A lista completa está disponível
no link bit.ly/1PNSrHp para consulta. Agora, professores, escolas, pais, alunos
e toda a sociedade também podem contribuir pela internet (leia Participe).
“O que se quer é uma garantia de direitos, de que do Amazonas até
o Rio de Grande do Sul todos tenham os mesmos direitos. Mas, para um país
continental como o Brasil, esse é um grande desafio”, avalia a professora Vânia
Leila de Castro, da Escola Classe 64 de Ceilândia. Ela, que dá aula para
crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, percebe que muitas chegam a
essa fase com lacunas que podem ser irreparáveis, como a falta de capacidade de
compreender operações de multiplicação. “Nós, que recebemos alunos do Brasil
inteiro, sofremos na pele e sentimos como esse direito é retirado das
crianças”, relata. “Se tivermos uma base, haverá várias pessoas zelando por
essa aprendizagem: o professor, o pai, o gestor”, resume.
O documento, apesar de trazer orientações voltadas para o trabalho
em sala de aula, será um guia importante também para que toda a população,
especialmente os pais, entendam e acompanhem o que os filhos devem aprender a
cada etapa do ensino, da infância à adolescência. “Hoje, eles (os pais) não têm
parâmetros para saber se a escola do filho está no caminho correto ou não.
Principalmente os das escolas privadas investem no escuro, porque a única
avaliação que existe é o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Não temos a
Prova Brasil aplicada de forma censitária”, observa Luis Claudio Megiorin,
presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF
(Aspa-DF).
Mudanças e adaptação
Alguns pontos do texto preocupam a associação, como pouca ênfase
nos objetivos relativos à alfabetização durante a educação infantil e a
presença tímida do conteúdo de gramática em língua portuguesa. No entanto, Luis
Claudio acredita que os debates marcados para os próximos meses, tanto na
esfera federal quanto na local, devem dar conta de melhorar esses elementos
para a próxima versão da BNC. Segundo Daniel Crepaldi, subsecretário de
Educação Básica da Secretaria Adjunta de Educação do DF, a pasta está se
preparando para promover, até maio, seminários com o objetivo de discutir o
documento com toda a rede de ensino da cidade.
Até o momento, das cerca de 700 escolas do Distrito Federal, 400
se cadastraram pelo site para enviar contribuições ao texto. Dessas, apenas 20
são particulares. A partir deste mês, a secretaria deve concentrar esforços,
com apoio do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino (Sinepe-DF)
e do Sindicato dos Professores nos Estabelecimentos Particulares de Ensino
(Sinproep-DF), para aumentar essa participação. Depois de todo o processo de discussão,
será a hora de começar a pensar na implementação, já com o documento final em
mãos. “Precisamos capacitar e discutir com todas as áreas de conhecimento do
nosso currículo para que a gente consiga adequar a Base à nossa realidade”,
explica Crepaldi.
Para saber mais - Diversidade de currículos
A Base Nacional Comum Curricular não é o mesmo que um currículo,
mas sim um instrumento para a construção de currículos, conforme explica a
professora Hilda Micarello, coordenadora da equipe de redação da Base. “Ela
trará aquilo que é comum a diferentes contextos a despeito da sua diversidade.
O que é específico a cada um deles caberá à parte diversificada definir, nos
estados, nos municípios e nos projetos pedagógicos das escolas”, detalha.
Segundo ela, o documento é importante porque se coloca como referência
fundamental para elaboração de outras políticas, como a de formação de
professores, de produção de material didático e de avaliações. “Esse caráter de
integração entre essas políticas é fundamental para que possamos vir a
construir um sistema nacional de educação”, finaliza.
Participe
Participe
As sugestões de mudanças na BNC devem ser enviadas pelo site
basenacionalcomum.mec.gov.br, onde o documento está disponível, até 15 de
março. As contribuições podem ser individuais, por organizações ou por escolas.
Informações pelos telefones 2022-9307 e 2022-9286 ou pelo e-mail basenacionalcomum@mec.gov.br.
Por:Mariana
Niederauer - Especial para o Correio –
Fotos: Emilia Silberstein/UNB-Agência – Correio Braziliense