Leão Dengo espera a construção de uma jaula para ele, responsabilidade
da Mistral: presidente da Fundação destituiu comissão que fiscalizava contrato
com o GDF
Partido da base aliada, que vive debandada, é responsável pela fundação
que toma conta do órgão, uma das apostas de Rodrigo Rollemberg para lucrar com
as PPPs. Gravação mostra que integrante da sigla, sem qualquer ligação com o
Zoo, participa de reuniões internas
O Jardim Zoológico de Brasília, menina dos olhos do
atual governo para a Parceria Público-Privada prevista para este ano, sofre com
falta de estrutura e como cabide de empregos para agradar a aliados. O comando
da fundação que toma conta do local está na cota do PDT, e a ingerência
política chega a ponto de militantes trabalhistas não vinculados ao órgão
participarem de reuniões internas e cobrarem resultados de servidores
concursados.
Além disso, o centro recreativo enfrenta problemas
com a não prestação de serviços por parte da Mistral, empresa contratada por R$
9 milhões para fazer a manutenção dos equipamentos. Mesmo assim, o presidente
da fundação, José Vieira, destituiu a comissão de fiscalização do contrato
entre a companhia e o GDF, formada por cinco pessoas, e, em setembro, nomeou
somente uma pessoa para responder pela função. O Zoológico é um dos espaços que
o Palácio do Buriti pretende ceder para a administração privada.
Folha mostra as quantias pagas por filiados ao PDT: presidente local
nega iniciativa
Na contramão, após o anúncio de que os dois
principais nomes do PDT estão de saída, a sigla trabalha para conter uma onda
de deserções. Cristovam Buarque, senador e ex-governador do DF, está de malas
prontas para se filiar ao PPS e sonha em concorrer à Presidência da República
em 2018. José Antônio Reguffe tem sete anos de mandato no Senado Federal e deve
se desligar do PDT e ficar sem partido por um tempo. A presidente da Câmara
Legislativa do DF, Celina Leão, é outra que pode trocar de legenda de olho nas
próximas eleições. O partido ainda tem outros dois políticos com mandato na
capital, os distritais Joe Valle e Reginaldo Veras.
Documento em papel timbrado do PDT a que o Correio
teve acesso mostra o recolhimento de dinheiro de integrantes do partido que
ocupam cargo de confiança na entidade. O nome de 11 comissionados aparece ao
lado de quantias com que cada um contribuiu para a sigla. Embora a lista esteja
em um papel com a logomarca da legenda, o presidente do PDT-DF, Georges Michel,
afirma que o partido não cobra pagamento de filiados em função comissionada.
Ele garante que nunca teve acesso aos recursos mencionados no documento. “Isso
não existe. Ninguém colaborou com o partido. Fui secretário de Trabalho no ano
passado, havia assessores pedetistas e ninguém tinha de colaborar
financeiramente”, alega.
Discussão
Um dos nomes do PDT que aparece com frequência no
Zoológico é Alceir Dionísio. Ele não é servidor do órgão, mas um áudio de
reunião interna realizada em janeiro demonstra o poder dado por José Vieira ao
companheiro de partido. “Aqui tem muito técnico, muito professor gabaritado que
não é operacional, só teórico. Aqui, cada um só está preocupado com ele mesmo,
ninguém preocupado em trabalhar. Quem quiser sair vai na diretoria e pede pra
sair (sic)”, adverte Alceir, em tom de ameaça. Servidores comentam que não foi
a primeira vez que ele interveio em encontros internos.
Nesse caso, no entanto, um funcionário de carreira
não aceitou as ordens e interpelou o presidente da fundação. “Presidente
Vieira, eu queria que ele (Alceir) se apresentasse. Ninguém sabe quem ele é
aqui dentro”, alerta, indignado. Ao rebater, Alceir expôs o poder político que
tem. “Esta pasta cabe ao partido. E sou uma pessoa que estou representando o
partido. Sou cidadão e estou aqui pra fiscalizar (sic)”, diz.
A resposta, no entanto, não satisfez o servidor.
“Pelo estatuto, você não tem autoridade nenhuma para falar aqui: não representa
o Zoológico, não é funcionário do quadro. Cidadão participa de audiência
pública. Lá, você pode ir e falar, mas aqui é reunião interna, gerencial, administrativa.
Você não deveria estar aqui.” No fim do bate-boca, José Vieira tenta acalmar os
ânimos e se justifica: “Temos que buscar solução para melhorar,
independentemente de qualquer coisa. É ingenuidade pensar que quem está sentado
aqui não tem força política”.
Presenteado
Alceir tem três parentes que trabalham no órgão: um
filho e um sobrinho comissionados, e outro filho vinculado à empresa
terceirizada. No PDT, ele também tem prestígio. Na festa de fim de ano da
legenda, a sigla presenteou o militante que mais realizou filiações naquele
ano. Alceir ganhou uma smarTV pelo feito, com cerca de 300 novas pessoas
vinculadas à legenda. De acordo com servidores do Zoológico, parte dos novos
trabalhistas atuam no órgão e foram convidados por Alceir para entrar no
partido.
O contrato com a empresa terceirizada é outro ponto
que prejudica os trabalhos no Zoológico. A Mistral Serviços Ltda. recebe R$ 9
milhões por ano para cumprir diversas funções no local. A manutenção de todo o
parque, o cuidado dos animais e o fornecimento de equipamentos são
responsabilidades da empresa. Apesar de ser bem paga, a companhia não fornece
todos os serviços que deveria. O gramado, por exemplo, não é cortado com tanta
frequência. A construção de uma nova jaula para o leão Dengo, que tem Aids
felina, deveria ser feita pela firma, mas até agora não está pronta. Os
funcionários da Mistral também sofrem. Não são raros salários e benefícios,
como tíquete-alimentação, atrasarem. No total, há 219 funcionários da empresa
lotados no Zoológico.
Empresas interessadas
O Zoológico é um dos espaços públicos que o
governador Rodrigo Rollemberg (PSB) pretende ceder para ser administrado por
uma firma privada. Duas demonstraram interesse em gerenciar o local. Uma delas,
a Cataratas do Iguaçu SA, é responsável pela administração das cataratas no sul
do país e da EcoNoronha, em Fernando de Noronha, entre outros pontos
turísticos.
"Providências necessárias"
Georges
Michel, presidente do PDT, admite que José Vieira é filiado ao partido, mas
afirma que o correligionário chegou à presidência do órgão por méritos
próprios. Segundo Michel, o Zoológico não está na cota trabalhista na
distribuição de cargos do governo. Quanto à intromissão de Alceir nas reuniões,
ele garante que a sigla não teve qualquer participação. “O PDT não põe ninguém
em nenhum órgão, a não ser como funcionário”, argumenta. Sobre distribuir
prêmios para estimular a busca por novas filiações, ele garante que não é uma
prática da sigla.
Vieira, presidente da Fundação Zoo, afirma
desconhecer a lista de comissionados que contribuíram com o PDT, embora o nome
dele seja um dos que aparecem no documento. Também nega a participação de
pessoas de fora do órgão em encontros internos, apesar da gravação do encontro
em que houve o bate-boca entre Alceir e um servidor. Segundo ele, aquela não
era uma reunião técnica. “Ele (Alceir) vai lá esporadicamente, entrega alguns
documentos. Não foi a nenhuma reunião executiva, de alinhamento. A gente tomou
as providências necessárias”, explica.
Sobre a relação com a Mistral, Vieira garante que
recorreu ao Ministério Público do Trabalho. Após intermediação do órgão, o
Zoológico ficou autorizado a pagar os salários dos terceirizados — e assim o
fez, garante o presidente. Ele também diz que todas as falhas na execução do
contrato foram apuradas e que a nomeação de apenas uma pessoa para a comissão
“está de acordo com a lei”. A respeito do novo recinto do felino, Vieira
justifica estar em fase de conclusão e que o atraso se deu por causa da “chuva
e do reduzido quadro de funcionários na instituição”. Sobre as nomeações de
familiares de Alceir, ele ressalta que ocorreu conforme a legislação.
O Correio procurou a Mistral pelo telefone que
consta no endereço eletrônico da empresa. Um funcionário afirmou que somente o
Departamento Jurídico da companhia poderia esclarecer o caso. Após insistência
da reportagem, ele passou o contato de dois integrantes da empresa que
prestariam esclarecimentos, mas não houve retorno nos dois números informados.
Ontem, a reportagem tentou novamente uma posição da empresa, mas não obteve
retorno.
Fonte:
Matheus Teixeira – Fotos: Carlos Vieira/CB/D.A.Press – Correio Braziliense