Darcy mediúnico
Bomba! Com exclusividade, esta coluna
publica mediúnica exclusiva com o professor Darcy Ribeiro, criador da
Universidade de Brasília. Fiat lux, mestre (tradução livre: Dá uma luz,
mestre!)
Qual o papel da universidade em um país
como o Brasil?
Nenhum país civilizado pode viver sem
uma universidade, porque ela é o útero onde se reproduzem as classes dirigentes
e os corpos profissionais. Aqui se atrasou muito. Só se começou a fazer escolas
em 1800 e tanto, quando a América Espanhola em 1950 já tinha universidades.
Antes, a ditadura era o grande inimigo.
Agora, quem é o inimigo da universidade?
A universidade está sendo questionada
no mundo inteiro. A UnB não pode esperar que alguém venha consertá-la, tem que
consertar a si mesma. Não pode chamar nenhum Darcy para colocar meia-sola. É
preciso ver se esses professores estão todos ocupados mesmo, estão engajados na
pesquisa ou se estão simulando esse engajamento.
E os alunos?
O caso dos alunos é exemplar. A maioria
dos alunos brasileiros é analfabeta, porque eles querem aprender só com o que o
professor diz em sala de aula, como se fosse suficiente para aprender de
verdade. Isso é uma estupidez.
O que atrapalha a aprendizagem na UnB?
Há uma mania, na UnB, de assembleismo,
de clientelismo, por colocar gente demais, de corporativismo e de grevismo.
Mas, algumas vezes, não é importante
fazer greve?
Seria ideal a greve japonesa, aquela
que vai das 18h às 18h15. Nessa hora, eles quebram a reitoria, berram pra
burro, fazem o diabo e depois, como eles não são bestas, voltam a estudar, ou
seja, aquele tempo é precioso para eles se formarem e eles não podem jogar fora
com a greve.
O que o senhor faria se fosse reitor?
A primeira coisa que eu faria se fosse
reitor da UnB seria arranjar dinheiro para importar 100 sábios, do Brasil e de
fora, porque você só faz sábios com instrução de sábios. Toda despesa é
dispensável, mas não essa.
O que o senhor acha da interferência
dos funcionários nas decisões da universidade?
Eu acho que o funcionário da
universidade é um assalariado. Tem direito a fazer um sindicato, fazer greve e
se defender como assalariado. Mas não tem direito de dar palpite na vida
acadêmica. Eles não entendem disso e podem matar a universidade.
E o papel do estudante no processo
político?
Estudante mandar na universidade é um
caminho para matá-la. O estudante está em uma casa hierárquica e hierarquizada.
O sábio é o sábio e tem que ensinar ao aprendiz. O aprendiz pode exigir do
sábio que ensine a ele. Mas não pode querer substituir o sábio.
Então, os inimigos da universidade são
pessoas que estão lá dentro?
São. As pessoas têm de estar ao nível
da universidade. Ela é a Universidade Nacional do Brasil, tem que ser melhor do
que Oxford, que Cambridge. Porque ela foi pensada para isso.
PS.: Na verdade, a entrevista
supostamente mediúnica foi concedida aos repórteres Eliane Gonçalves e Mario
Zanato e publicada no jornal Câmpus, do Departamento de Comunicação da UnB, em
1995.
Por: Severino Francisco - Correio Braziliense - Foto/Ilustração: Blog -
Google