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Estrago de R$ 1,3 bi no cofre da Terracap

Inicialmente, o convênio para a construção da arena esportiva previa o repasse de R$ 500 milhões. No fim da construção, o custo ficou três vezes superior ao estimado à época

*Por Helena Mader

Estatal registra prejuízo bilionário com a construção do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha. Polícia Federal investiga supostas irregularidades na obra. Conselho Administrativo da empresa se reúne na terça-feira

A construção do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha gerou um rombo de mais de R$ 1,3 bilhão nos cofres da Agência de Desenvolvimento de Brasília (Terracap). A contabilização do prejuízo da empresa foi confirmada pela diretoria colegiada da companhia e, agora, está em análise no Conselho de Administração. Entre 2010 e 2014, durante o governo Agnelo Queiroz,  a Terracap repassou R$ 1,575 bilhão à Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) para as obras do estádio.

Estudos mostram que a arena esportiva só tem potencial de gerar R$ 171 milhões de retorno financeiro, durante toda a vida útil. Como levantamentos técnicos comprovam que houve uma depreciação de R$ 80 milhões no valor estimado do Mané Garrincha, isso representa um prejuízo patrimonial de mais de R$ 1,3 bilhão para a empresa.

O debate sobre o rombo gerado à Terracap ocorre no momento em que a Polícia Federal investiga irregularidades na construção do estádio. Neste mês, a PF requisitou à diretoria da empresa toda documentação relativa ao empreendimento. Os investigadores também solicitaram informações ao Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) e à Novacap. Segundo a Polícia Federal, a apuração é decorrente da delação premiada de executivos da construtora Andrade Gutierrez, que, ao lado da Via Engenharia, ganhou a licitação para a empreitada.

Contratações

Os procedimentos para a obra começaram em 2009, quando houve a assinatura do Convênio nº 323/2009. O acordo previa que a Terracap ficaria responsável por reembolsar os pagamentos feitos à empreiteira contratada. A Novacap, por sua vez, realizou as licitações e as contratações para a construção do Mané Garrincha.

Inicialmente, o convênio previa o repasse de R$ 500 milhões para construir a arena brasiliense para a Copa do Mundo de 2014. Quando ficou pronta, o custo final era três vezes superior ao estimado à época do acordo. Isso ocorreu graças à assinatura de vários aditivos e de outros acordos, que permitiram a contratação de serviços que não estavam previstos originalmente. Só em 2012, a Terracap repassou R$ 670,9 milhões à Novacap — valor quase quatro vezes maior do que os investimentos feitos em urbanização em todo o Distrito Federal. No ano seguinte, o montante dos repasses ficou em R$ 470,4 milhões.

Recursos
Como todos os gastos foram contabilizados como investimento, entre 2010 e 2014, a empresa registrou vantagens contábeis expressivas, sem que isso se traduzisse em ganho financeiro. Um exemplo disso é o fato de que, em dezembro de 2014, a Terracap divulgou um lucro líquido de R$ 785 milhões, mas, no início de 2015, o comando da companhia não tinha sequer recursos suficientes para pagar os tributos e salários dos servidores. No último relatório de administração da Terracap, referente a 2015, as estatísticas indicaram um lucro líquido de R$ 19 milhões — o que representa uma redução de 97,52% em comparação com o ano anterior.

Esses lucros, em tese, deveriam gerar dividendos aos acionistas da Terracap, que são o GDF e a União (leia Para saber mais). No último relatório de administração da agência, havia uma estimativa de pagamento de dividendos sobre o ganho do exercício no total de R$ 46,3 milhões. Mas esses valores nunca foram pagos. A partir de 2010, auditores independentes contratados para fazer um relatório sobre as demonstrações financeiras começaram a cobrar a apresentação de estudos de viabilidade econômica do Estádio Nacional Mané Garrincha, o que não ocorreu.

Nos últimos três anos do governo Agnelo, nenhuma das auditorias externas anteriores, obrigatórias para cumprir a  lei das sociedades anônimas, aprovou os números da empresa. 

Auditoria
No último relatório independente, os auditores lembraram que a arena custou R$ 1,575 bilhão, e a Terracap ainda gastou R$ 83,337 milhões com a construção da Torre de TV Digital, em Sobradinho. “Todavia, a auditada, até 31 de dezembro de 2015, não havia concluído a análise de recuperabilidade desses ativos, conforme preceitua a Comissão de Valores Mobiliários”, menciona um trecho do documento.

Entre 2012 e 2014, houve abstenção por parte dos auditores independentes, com a alegação de que faltaram estudos de viabilidade econômica que justificassem a dimensão dos investimentos realizados. Em 2015, no último relatório apresentado, essa abstenção de opinião foi convertida em ressalva, pois a Terracap havia se comprometido em fazer os estudos de recuperação dos investimentos.

No ano passado, esse levantamento foi finalmente realizado. O estudo teve como base o modelo de negócios apresentado pela empresa RNGD Consultoria, responsável pelos estudos de viabilidade da parceria público-privada do Estádio Nacional. Esse estudo, chamado teste de recuperabilidade, indicou um potencial de arrecadação de R$ 171 milhões ao longo da vida útil da construção. Com base nesse valor, a Terracap chegou à redução do patrimônio líquido de R$ 1,3 bilhão.

Procurada, a Agência de Desenvolvimento de Brasília informou que não comentará as informações relacionadas ao rombo nos cofres da empresa. “A Terracap não se manifestará enquanto não houver um pronunciamento formal do Conselho de Administração, previsto para a próxima terça-feira, 18 de abril”, explicou, em nota, a companhia.

Crise econômica
Além do rombo gerado pela obra, a Terracap ainda sofre os impactos da crise econômica nacional e da retração no setor imobiliário — principal área de atuação da empresa. Desde 2012, o número de lotes ofertados e vendidos pela companhia cai de forma expressiva. De acordo com o último relatório de administração, referente a 2015, o total de lotes incluídos em editais passou de 1.699, em 2012, para 906, em 2015. 

A quantidade de terrenos vendidos diminuiu de 589 para 318 no período. Em termos de recursos arrecadados, essa queda é ainda mais expressiva. Em 2012, a Terracap licitou lotes que somaram R$ 1 bilhão. Três anos depois, esse valor despencou para R$ 196 milhões. A agência também enfrenta um grave problema de inadimplência. Em 2015, 46,6% dos contratos estavam em atraso com pagamentos.

Para saber mais - Ações divididas
A Terracap foi criada em 1976 e tem o capital social dividido entre a União e o GDF. O governo federal tem 49% das ações da empresa e o Palácio do Buriti, 51%. O Conselho de Administração da companhia é formado por nove integrantes, dos quais cinco são indicados pelo Governo do Distrito Federal e quatro, pela União. Os integrantes têm mandato de dois anos, permitida a reeleição. Os conselheiros se reúnem ordinariamente uma vez por mês e, extraordinariamente, sempre que convocados pelo presidente do conselho.

Projetos estratégicos - Para minimizar o rombo nos cofres da empresa, a Terracap aposta em 27 projetos estratégicos. Confira alguns deles:


* Setor Noroeste
* Setor Taquari, Trecho 2
* Regularização dos condomínios do Setor São Bartolomeu
* Legalização dos lotes dos parcelamentos da Etapa 4 do Jardim Botânico
* Regularização dos setores Dom Bosco, Ponte de Terra, Arniqueiras e Vicente Pires
* Mapeamento aerofotogramétrico do território do Distrito Federal
* Parcelamento rural da Fazenda Barra Alta e da Fazenda Boa Vista
* Regularização de 120 terrenos de igrejas ou de entidades sociais
* Parque Tecnológico Cidade Digital
* Parque Capital Saúde
* PPP do Estádio Nacional
* Modelo de gestão da Torre de TV Digital
* Venda da SAB


(*) Helena Mader – Fotos: Antonio Cunha/CB/D.A.Press – Lula Lopes-Esp/CB/D.A.Press – Correio Braziliense 

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