Delator revela que quatro empreendimentos do DF -
estádio, centro administrativo, setor habitacional e sistema de transporte -
tiveram, à época, pagamento de propina a agentes públicos do GDF
*Por Helena Mader
Quatro das obras mais caras da história do Distrito
Federal estão citadas nas delações de ex-executivos da Odebrecht. Além do
Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha e do Centro Administrativo do
Distrito Federal, a construção do Setor Habitacional Jardins Mangueiral e a do
sistema de transporte do BRT Sul aparecem nos relatos dos empresários. No
total, os empreendimentos representam um investimento total de R$ 4,5 bilhões.
Os depoimentos prestados no âmbito da delação premiada foram tornados públicos,
na última quarta-feira, pelo relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal,
ministro Edson Fachin.
Quase todos os projetos mencionados superam a cifra de R$ 1 bilhão cada
um. A obra do BRT Sul é mencionada na delação premiada do ex-executivo João
Antônio Pacífico. Ele declarou que a Odebrecht só tinha interesse na PPP do
Centro Administrativo do DF, mas foi procurado por representantes da OAS e da
Via Engenharia, com um pedido para que a Odebrecht participasse da licitação do
BRT Sul e apresentasse uma proposta maior do que a das outras empreiteiras. O
objetivo era simular uma concorrência no empreendimento. Pacífico aceitou a
proposta diante da possibilidade de “compensação mediante a apresentação de
propostas de coberturas futuras em favor da Odebrecht”.
Centro Administrativo do DF R$ 1,05 bilhão
O BRT Sul foi a principal obra do governo de Agnelo
Queiroz (PT) e Tadeu Filippelli (PMDB) na área de transporte e também dos
últimos anos. Licitado em 2008, o sistema liga as regiões do Gama, de Santa
Maria e do Park Way ao centro de Brasília. O corredor de 27,5km começou a ser
construído em dezembro de 2011, com conclusão em março de 2014. A estimativa
inicial era que o empreendimento custasse R$ 587 milhões, mas a obra saiu por
R$ 704 milhões.
Outras obras citadas nas delações da Odebrecht são o Centro
Administrativo e o Estádio Mané Garrincha. A arena não foi erguida pela
construtora, mas, segundo delatores da empreiteira, houve conluio com as
vencedoras da licitação: Andrade Gutierrez e Via Engenharia. A pedido das
empresas, a Odebrecht teria apresentado uma proposta maior na licitação apenas
para simular a concorrência e justificar o sobrepreço imposto ao contrato.
Sistema BRT Sul R$ 704 milhões
A obra do Centro Administrativo é uma das mais
citadas nos depoimentos. A PPP teve investimentos de R$ 1,05 bilhão da
Odebrecht e da Via Engenharia. Como o Correio mostrou ontem, houve negociação
de pagamento de propina para acelerar a liberação do empreendimento e o início
do pagamento das contrapartidas do GDF.
PPP habitacional
Outra obra em xeque é a do Jardins Mangueiral.
Trata-se da primeira parceria público-privada habitacional do Brasil.
Localizado entre São Sebastião e o Jardim Botânico, o setor destinado a 30 mil
habitantes foi licitado em novembro de 2008. As empresas ganhadoras da
concorrência pública foram a Odebrecht Realizações Imobiliárias e o Consórcio
Vida Nova, grupo formado pela Silco Engenharia, Cidade Jardins Incorporação,
Vilela e Carvalho, Soltec, Emplavi e Geológica Consultoria Ambiental.
Em declarações prestadas a procuradores da força-tarefa da Operação
Lava-Jato, o executivo Paul Elie Altit detalhou o pagamento de propina a
agentes públicos do GDF. Esses pagamentos estavam associados ao projeto
habitacional Jardins Mangueiral. A PPP recebeu investimentos de R$ 914 milhões.
Segundo o delator, o ex-governador José Roberto Arruda teria cobrado R$ 8
milhões dos empresários para viabilizar o empreendimento.
Jardins Mangueiral R$ 914 milhões
Paul Altit contou aos investigadores que o
empresário Adalberto Valadão, da Soltec, era o intermediário das tratativas.
Não há menções a encontros diretos entre Arruda e representantes da Odebrecht.
“Esses pagamentos solicitados por Arruda tiveram como contrapartida específica
o bom desenvolvimento do projeto, sem qualquer entrave”, contou Paul. Ele
entregou aos procuradores comprovantes de pagamento nos valores de R$ 318 mil e
de R$ 180 mil.
O ex-deputado federal e ex-secretário de Habitação Geraldo Magela também
é citado. Segundo Paul, Magela teria solicitado recursos para a sua campanha ao
Senado, em 2013. O delator garante que ele foi beneficiado com R$ 1,4 milhão —
parte repassada por Adalberto Valadão e parte com recursos não contabilizados,
em espécie. Na licitação do Jardins Mangueiral, só houve uma concorrente, além
do consórcio vencedor: a Via Engenharia. Para Paul, existe a possibilidade de
que a empresa tenha entrado no certame de forma combinada para simular disputa
pela PPP.
O advogado do ex-governador Arruda, Paulo Emílio Catta Preta, nega
qualquer solicitação de vantagem indevida. “Isso não aconteceu, em absoluto.”
Paulo Emílio diz que a versão de Paul é “inconsistente”. “Ele declara que a
licitação ocorreu e, posteriormente, já com contrato assinado com o consórcio,
houve uma reunião das consorciadas com essa pessoa (Adalberto), que teria
falado em nome do governador Arruda. O próprio delator afirma também que a
mesma pessoa seria intermediária de Geraldo Magela. Tudo é muito sem nexo, há inconsistência
nas narrativas”, afirma.
O ex-secretário Magela disse que teve acesso ao vídeo, mas não ao
inteiro teor da investigação. “Aquelas declarações não correspondem à
realidade, e os meus advogados tomarão providências”, explicou. O empresário Adalberto
não foi localizado.
(*) Por Helena Mader – Fotos: Ed Alves/CB/D.A.Press
– Antonio Cunha/CB/D.A.press – Gustavo Moreno/CB/D.A.Press – Correio
Braziliense