Os olhos do mundo estarão voltados para Brasília do próximo domingo
(18/3) até o dia 23. A capital da República vai sediar, pela primeira vez,
o Fórum Mundial da Água, que está em sua oitava edição. O momento não
poderia ser mais apropriado: o palco das discussões enfrenta, há um ano e meio,
uma crise hídrica sem precedentes, desencadeada por secas atípicas,
desperdícios e, sobretudo, falhas de gestão e planejamento.
Historicamente,
a cidade-sede do evento trienal ocupa o centro das discussões. Por isso, com
lições colhidas dos próprios erros, o Distrito Federal vai mostrar a
representantes do Brasil e do exterior um manual sobre como não esperar a crise
atingir níveis alarmantes para se agir. E mais: ensinará soluções viáveis
capazes de mudar, de casa em casa, a cultura de uma população e, assim, reduzir
o desperdício da água.
Especialistas
ouvidos pelo Metrópoles afirmaram que a crise no DF serve de alerta
para o mundo, pois remete à necessidade de prevenção contra o problema, em
detrimento das medidas para remediá-lo.
“A falta
de investimento durante décadas é um dos fatores que originaram a crise. O
reservatório do Descoberto, por exemplo, foi feito na década de 1970, não
estava preparado para atender à demanda que há hoje. Ficamos 40 anos sem
investimento e dependentes de chuvas”, explicou o professor Oscar de Moraes
Cordeiro Netto, do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia Ambiental e Recursos
Hídricos da Universidade de Brasília (UnB).
Planejamento
O
pesquisador acrescentou que a estiagem prolongada em 2016 e 2017 principiou a
escassez, pois reduziu o aporte dos principais reservatórios do Distrito
Federal, Descoberto e Santa Maria. Apesar disso, segundo ele, os órgãos que
deveriam preparar as cidades para uma possível crise não estavam alinhados.
“Num
primeiro momento, não houve muito envolvimento da Caesb [Companhia de
Saneamento Ambiental do DF] e da Adasa [Agência Reguladora de Águas, Energia e
Saneamento Ambiental do DF], que foram pegas de surpresa. Agora, caso o
cenário se repita, estarão muito mais atentas e preparadas”, disse.
De acordo
com o diretor-presidente da Adasa, Paulo Salles, não havia como prever a crise.
Disse ainda que a agência agiu no momento exato. “Certas coisas são
imprevisíveis, a gente vai reagindo a elas. Mas, já vimos indícios desde abril
de 2016, quando irrigantes na região do Rio Preto [divisa leste entre DF e
Goiás] identificaram pouca água”, relembrou.
Eduardo
Cyrino, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa)
nas áreas de qualidade de água e ecotoxicologia, discordou. Ele afirma que os
órgãos responsáveis pela distribuição e regulação da água deveriam ter
implementado ações pelo menos um ano antes.
“A
maioria das pessoas entende que a água é um recurso infinito, que a crise é
mentira do Estado e que está cheio de água embaixo da terra”, explicou. “A
partir do momento em que se percebeu redução de chuvas, já era possível se
pensar na possibilidade de crise”, afirmou Cyrino.
O volume anual de chuva no Distrito Federal desde 2015 reforça a
afirmação do especialista. O nível de precipitações nesse período tem ficado
aquém das previsões do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Em 2015,
choveu 18,6% abaixo da média. No ano seguinte, 25,3% a menos e, em 2017, houve
redução de 15,3%. Neste ano, contudo, tem chovido mais, e a expectativa é de
que a situação melhore.
O próprio
governador Rodrigo Rollemberg (PSB) disse,
pela primeira vez, que o racionamento acabará ainda neste ano. Na
sexta-feira (9), por exemplo, a Barragem do Descoberto fechou o dia
com 61% do volume total, o maior percentual registrado desde
agosto de 2016. O reservatório de Santa Maria estava com 43,8% – a maior
marca desde setembro de 2017.
Soluções
Segundo admitiu o presidente da Caesb desde 2015, Maurício Luduvice, a ação dos órgãos responsáveis foi tardia, pois a companhia havia elaborado estudos que sinalizavam a crise hídrica. Porém, essas pesquisas ficaram engavetadas. Ainda, conforme destacou, as medidas adotadas para abrandar a situação podem servir de lição para o mundo.
Segundo admitiu o presidente da Caesb desde 2015, Maurício Luduvice, a ação dos órgãos responsáveis foi tardia, pois a companhia havia elaborado estudos que sinalizavam a crise hídrica. Porém, essas pesquisas ficaram engavetadas. Ainda, conforme destacou, as medidas adotadas para abrandar a situação podem servir de lição para o mundo.
Reduzimos a dependência do Descoberto de 60% para
52%, por exemplo. Ampliamos a captação com mais fontes, como o Bananal e o Lago
Paranoá, e diminuímos a pressão d’água, além de transferir o recurso entre os sistemas."
- (Maurício Luduvice, presidente da Caesb)
Luduvice
também salientou o sistema de Corumbá IV. O projeto é uma “dobradinha” dos
governos goiano e brasiliense, e deve ser concluído até agosto, garantindo o
abastecimento no DF por pelo menos 30 anos. A partir de dezembro, a população
da capital da República deve começar a receber a água captada no Lago Corumbá.
Arte: Moisés Dias
- Metrópoles Economia
- Além das lições aprendidas com os equívocos causadores da crise
hídrica no Distrito Federal, os representantes estrangeiros vão encontrar no
fórum soluções simples e baratas desenvolvidas por adolescentes em escolas.
Uma delas
foi criada por sete estudantes com idades entre 14 e 16 anos, alunos do Serviço
Social da Indústria (Sesi) do Gama, sob a liderança de um professor. Eles
compõem a equipe Lego of Olympus, que elaborou, no ano passado, com técnicas de
robótica e ao custo de R$ 300, o Sistema de Irrigação por Método Automático
(Sima).
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), 72% da água disponível
para consumo no Brasil destina-se à agricultura. Para reduzir o uso do recurso
nessa atividade, a equipe criou a engenhoca, movida à energia solar e medidora
da umidade do solo. Assim, o Sima auxilia agricultores a fazer aguagem pontual
na terra. O resultado? Economia de até 65%.
“Por um
aplicativo de celular, controlamos um interruptor ligado a uma bomba d’água.
Com base na umidade do solo, nós ativamos ou não a irrigação”, explicou Isadora
Marinho, 15 anos, aluna do 1º ano do ensino médio. “Acompanhamos um agricultor
e vimos que ele gasta 1,2 milhão de litros de água por semana, em 2 hectares.
Com o Sima, o gasto caiu para 420 mil litros”, comparou Luan Melo, 15.
Outra
equipe de estudantes do Sesi, a MegaZord, recorreu à química e buscou solução
caseira para baixar o desperdício de água nas residências. O grupo desenvolveu
um produto bioecológico, o Pipi, que altera cheiro e cor da urina em vasos
sanitários. Desse modo, reduz a necessidade de descargas e culmina na economia
de água.
“O Pipi é
feito com sal quaternário de amônio, ácido cítrico, corante orgânico azul e
essência de lavanda. Quando entra em contato com a urina, tira o mau cheiro e a
deixa azul, o que dá sensação de limpeza e diminui a necessidade de uma
descarga por uso”, explica Maria Eduarda Araújo, 12 anos. Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS), cerca de 75% da água consumida em residências são
gastos em banheiros.
Os
produtos utilizados são facilmente encontrados em lojas de produtos químicos.
Após misturados, são armazenados em uma saboneteira acoplada ao lado do vaso, a
qual se conecta a uma mangueira, responsável por despejar o líquido no
sanitário. Cada litro da solução equivale a 33 descargas.
A Lego of
Olympus e a MegaZord vão apresentar os projetos no estande do Sesi no 8º
Fórum Mundial da Água.
8º Fórum
Mundial da Água - De 18 a 23 de março, Centro de Convenções
Ulysses Guimarães e Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha - Inscrições
abertas no >>>> site oficial do evento
Fonte:
Douglas Carvalho - Foto: Tony Wiston – Metrópoles