O governador Ibaneis Rocha fez queixas dos deputados distritais após
reunião com secretários e administradores regionais
*Por Ana Viriato - Alexandre de Paula
Convocação causa mal-estar na Câmara - Governador ameaça processar
distritais que resistem em deixar o recesso para votar propostas de interesse
do GDF, como a ampliação do Instituto Hospital de Base. Deputados reclamam do
tom usado por Ibaneis Rocha, tido como "intransigente"
Na tentativa de garantir o sinal verde do plenário, em sessão
extraordinária pendente de convocação, ao projeto de lei que estende ao núcleo
da rede pública o modelo de gestão do Hospital de Base, o governador Ibaneis
Rocha (MDB) subiu o tom. O chefe do Palácio do Buriti disse, ontem, que
processará os distritais contrários à ampliação do formato — que autoriza
compras sem licitação e contratações pelo regime celetista — a cada morte na
saúde. A proposição integra um pacote emergencial encaminhado, aos poucos, pelo
governo à Câmara Legislativa (leia Propostas). Os parlamentares reagiram à
investida, a qual classificaram como “intransigente”, “desrespeitosa” e
“antidemocrática”.
A declaração do governador ocorreu após reunião com secretários e
administradores regionais e mostrou-se uma resposta ao posicionamento dos
distritais que querem mais tempo para discutir as propostas. “Em meses, várias
pessoas vão morrer. Eles (deputados) escolhem o que querem. A partir daí, eu
vou entrar com uma ação contra cada um pela morte de cada cidadão. Ou dão os
instrumentos para que o governo consiga fazer, ou vamos ter um enfrentamento
grave”, disparou o emedebista.
Ibaneis desafiou os distritais a rasgarem os planos de saúde e a usarem
o serviço público da capital federal. “Se eles tiverem coragem de fazer isso,
eu topo suspender o projeto e discutir. Eles vão ter de ficar na mesma situação
da população que está sofrendo”, afirmou. O governador acrescentou que não fará
nomeações até que os projetos sejam aprovados pela Câmara Legislativa.
Sala de espera lotada no Hospital Regional de Ceilândia: chefe do Buriti
quer responsabilizar os distritais pelas mortes na Saúde
Gerência
A proposição do Executivo local amplia o alcance do serviço social
autônomo na capital, implementado na gestão de Rodrigo Rollemberg (PSB). Àquela
época, o debate sobre a proposta durou três meses. Desde janeiro de 2018, o
Instituto Hospital de Base administra a maior unidade de saúde do Distrito
Federal. Conforme o projeto, a entidade passará a se chamar Organização
Hospitalar do DF (OHDF) e, de forma gradativa, gerenciará os hospitais
regionais, as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), as Unidades de Referência
Distrital (URDs) e o Samu. Dessa forma, ficará responsável pela compra de
insumos, pelas contratações e pela manutenção de materiais desses centros de
saúde.
O pacote emergencial em discussão abrange outros setores. Projetos de
lei protocolados no Legislativo local criam uma gratificação para o trabalho
voluntário de servidores da segurança e adequam o Orçamento de 2019. O governo
ainda vai incorporar à lista a proposta que cria três administrações regionais
— Sol Nascente/Pôr do Sol, Arapoanga e Arniqueiras — e a que prevê a
participação popular na escolha dos administradores. Outra proposição que deve
chegar à Casa prevê a negociação de dívidas contraídas com a Fazenda por
pessoas físicas e jurídicas. A mediação dos débitos, que chegam a R$ 32
bilhões, será realizada pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e
Cidadania (Cejusc)/Fiscal.
Insatisfação
O tom do governador incomodou não só a oposição. Para o deputado Leandro
Grass (Rede), que se coloca como independente, a fala de Ibaneis evidencia o
toma lá dá cá na nova gestão. “Na minha visão, é um recado direto para os
deputados que têm cargo no governo. Ele, agora, quer a contrapartida deles”,
avaliou. Júlia Lucy (Novo) classificou como “ridícula” e “ofensiva” a
declaração do chefe do Buriti e destacou que é preciso manter a separação dos
poderes. “Ele quer resolver um problema desse tamanho em um dia? Não tem como
uma decisão sem amadurecimento e sem debate ser bem-feita”, avaliou.
Integrante da Comissão de Educação, Saúde e Educação (Cesc), Reginaldo
Veras (PDT), que votou contra a alteração no modelo de gestão do Hospital de
Base em 2017, afirmou que vê o projeto como uma possibilidade de privatização
do SUS. “O Instituto Hospital de Base tem um ano e ainda não há um relatório
real e transparente dos trabalhos. Se não há uma experiência amadurecida, como
podemos autorizá-la para toda a rede? Isso é colocar em risco quem depende do
trabalho dele”, declarou o deputado, que classificou o discurso de Ibaneis como
“antidemocrático”, “arbitrário” e “infantil”.
Opositora ao governo e integrante da Cesc, Arlete Sampaio (PT) indicou a
inviabilidade de votar projetos polêmicos a toque de caixa. “Os deputados que
se submeterem a essa chantagem estarão rasgando a independência e a autonomia”,
disse sobre o comentário do governador. Integrante da base, o deputado
Reginaldo Sardinha (Avante) destacou a necessidade de analisar as propostas com
mais tempo e cuidado. “A gente não pode pegar um resumo de trabalho feito na
transição e, em 20 dias de governo, aprovar na Câmara em uma sessão”, avaliou.
Aval
Mas Ibaneis também conta com fiéis escudeiros dispostos a aprovar as
medidas de forma emergencial. “As pautas são importantes. Há deputados com
preocupações, mas a convocação dos agentes de segurança para a abertura das delegacias
e a ampliação do Instituto Hospital de Base são salutares para a população”,
acredita o deputado Iolando (PSC).
O distrital Valdelino Barcelos (PP) também defende a convocação
extraordinária. De acordo com a assessoria de Comunicação do parlamentar, ele
“aproveitou o prazo útil para ir pessoalmente ao Instituto Hospital de Base a
fim de conhecer de perto o modelo de gestão e conversar com pacientes e
servidores”.
O retorno das atividades da Câmara Legislativa está previsto para 1º de
fevereiro, e a primeira sessão, para o dia 5. Caso a votação ocorra no recesso,
as comissões permanentes analisam as propostas em plenário e não de forma
independente, como no rito normal.
Propostas: O governador Ibaneis Rocha (MDB) enviou, até agora,
três projetos do pacote emergencial à Câmara Legislativa:
Ampliação do modelo de gestão do Hospital de Base - O Instituto
Hospital de Base (IHBDF) gerencia a maior unidade hospitalar da capital desde
janeiro de 2018. O projeto prevê que a entidade passe a se chamar Organização
Hospitalar do DF (OHDF) e administre também as Unidades de Pronto Atendimento
(UPAs), as Unidades de Referência Distrital (URDs), os hospitais regionais e o
Samu. Com o formato — serviço social autônomo—, a entidade fica autorizada a
realizar compras sem licitação e contratações pelo regime celetista. A mudança
deve começar pelo Hospital Regional de Santa Maria e pelas UPAs.
Gratificação por serviço voluntário na Segurança Pública - A
proposta institui o serviço voluntário na Secretaria de Segurança Pública. A
indenização será de R$ 50 por hora, em turno ou escala de trabalho. Conforme o
projeto, o quantitativo máximo mensal de atuação dos profissionais equivale a
16 horas. Por dia, os servidores podem trabalhar, de forma voluntária, por 8 horas.
Adequação da LOA e da LDO para a redução de impostos - A proposição ajusta a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) para que comportem benefícios fiscais disciplinados em legislações específicas anteriores. Constam na lista de correções a redução de alíquota para operações com fumo e seus derivados e isenção para operações internas e interestaduais, especificamente para venda de maçã e pera.
O que diz a lei
A Lei Orgânica do Distrito Federal define as regras para convocações
extraordinárias da Câmara Legislativa. O texto estabelece que os pedidos para a
reunião de distritais durante o recesso pode ser apresentado pelo presidente da
Câmara, nos casos de decretação de estado de sítio, de intervenção no Distrito
Federal, quando houver recebimento de autos de prisão de deputado ou para a
posse de governador e de vice-governador. A convocação extraordinária também
pode ser feita pela Mesa Diretora, ou a requerimento de um terço dos deputados
distritais, para a apreciação de ato do governador que importe em crime de
responsabilidade. Outra hipótese legal para a suspensão do recesso é a
convocação pelo governador, pelo presidente da Câmara ou a requerimento da
maioria dos distritais, em caso de urgência ou relevante interesse público. A
Lei Orgânica determina ainda que, na sessão legislativa extraordinária, a
Câmara só poderá deliberar sobre a matéria para a qual tenha sido convocada.
Perfil modificado
Uma pessoa utilizou um computador da Agência Nacional de Transportes
Terrestres (ANTT) ontem para modificar o perfil do governador do Distrito
Federal, Ibaneis Rocha (MDB) no site Wikipedia. O internauta acrescentou a
frase “Mais conhecido como Enganeis” no texto que conta a trajetória do chefe
do Executivo local. O texto foi corrigido pelo GDF. A ANTT confirma que o
endereço, de fato, pertence à agência e encaminhou o caso para a Corregedoria
para apuração dos fatos.
(*) Ana Viriato - Alexandre de Paula - Fotos: Renato Alves/GDF - Marcelo Ferreira/CB/D.A.Press - Correio Braziliense
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