"80%
dos latrocínios no DF foram para roubar celulares" . Ao CB.Poder, o
secretário de Segurança Pública chamou a atenção para o combate ao crime contra
o patrimônio, além de alertar para a incidência de feminicídio no DF. Também
defendeu as escolas militarizadas e reajuste para policiais e bombeiros
*Por Ana
Maria Campos , Helena Mader
"Lendo
os depoimentos, em todos os casos, o feminicídio não é um crime que nasce
pronto, ele vem amadurecendo até culminar no resultado morte"
"Não sei se a sociedade brasileira está preparada para uma
legalização (das drogas), mas eu sou de uma linha da repressão, da prisão"
O uso de celular
virou motivo de preocupação para as autoridades da segurança pública da capital
federal. Mais de 80% dos latrocínios (roubos com morte) registrados no ano
passado estão relacionados a roubos de celulares. Em 2018, foram 27 latrocínios
e, no primeiro semestre deste ano, 12 no total. Em entrevista ao programa
CB.Poder, o secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, contou que o
problema está na mira das equipes de inteligência. “Temos investigações em
curso para acabar com essas quadrilhas”, revelou.
Na conversa, o
secretário também comentou estatísticas de criminalidade no Distrito Federal e
defendeu o reajuste salarial para policiais civis e militares e bombeiros. Para
ele, é importante que a paridade da PCDF com a Polícia Federal saia do papel.
“A Polícia Civil precisa disso. O salário está defasado, foram muitos anos sem
reajuste”, argumentou. Anderson defendeu, ainda, campanhas de combate ao
feminicídio e o projeto de escolas militarizadas. “Se tudo correr bem e
conseguirmos o financiamento, vamos chegar ao final do governo com 40 escolas”,
disse.
Como o senhor
avalia o balanço da criminalidade no primeiro semestre?
Os números do
primeiro semestre foram muito bons. Mesmo enfrentando crise econômica, crises
como efetivo das polícias muito baixo e deficit muito grande, acho que a gente
conseguiu entender o que vinha acontecendo no DF. E é aquilo que eu sempre
digo, polícia na rua é investigação forte. Isso a gente tem conseguido
implementar no primeiro semestre. A ideia é continuar nesse ritmo para que
traga a nossa cidade de volta para índices consideráveis e aceitáveis de vida.
Mas os casos de
feminicídio preocupam.
O feminicídio
é um crime muito grave, como todos os outros, mas nós pegamos um estudo da
câmara técnica de homicídios e feminicídios da secretaria, intensificamos e
estudamos todos os casos de feminicídio ocorridos no DF desde o advento da lei,
em março de 2015, até fim de junho. Nós estudamos mesmo, capa a capa, folheamos
todos os processos, olhamos todos os depoimentos e extraímos uma série de
dados. Com base neles, chegamos a várias conclusões, mas resolvemos colocar luz
em cima desse crime. A gente tem certeza de que não há uma explosão de crimes
de feminicídio no DF. O que há é que colocamos luz em cima disso, e entendemos
que, se a população não se juntar para prevenir esse crime, nós, Estado, não
vamos prevenir.
Então, não é que tenha
ocorrido mais feminicídios, é que agora as pessoas reportam mais à polícia, à
Secretaria de Segurança, colocam holofote em cima e conseguem diferenciar um
crime do outro, que antes era tratado tudo como homicídio?
Nós vimos que,
aproximadamente, 90% dos casos de feminicídio no DF ocorreram dentro da
residência das vítimas. São 50% com arma branca. Isso nos mostra que é um crime
doméstico. Lendo os depoimentos, em todos os casos, o feminicídio não é um
crime que nasce pronto, ele vem amadurecendo até culminar no resultado morte.
Em todos os depoimentos, ou a vizinha sabia, ou filho sabia, ou a mãe tinha
visto. As agressões ou as ameaças foram aumentando até chegar ao feminicídio. A
gente não pode entrar em uma casa sem ter um informe, sem ter um flagrante, sem
ter uma decisão judicial. Lançamos uma campanha. O que tem de ficar para trás é
essa coisa de que em briga de marido e mulher ninguém mete a colher.
Desde o lançamento
da campanha, o que vocês notaram nessa prevenção e nesse aumento de denúncias?
Sobre a
motivação do crime. Ele é, geralmente, motivado por ciúme, posse. É um crime de
gênero, não tem outra definição. É muito importante saber separar feminicídio e
homicídio de mulher, que são duas coisas distintas. Às vezes, as pessoas
misturam um pouco. O feminicídio é um crime de gênero, ela morreu pelo fato de
ser mulher. No homicídio comum, ela morreu numa parada de ônibus qualquer, o
cara tomou a bolsa e deu um tiro, latrocínio. A gente entendeu que a campanha é
a única forma de a gente chegar.
Vendo o vídeo do
caso de feminicídio no Cruzeiro, em que um oficial da Aeronáutica atirou na
esposa e naquele que ele considerava que fosse o amante da mulher, que, na
verdade, não era. A impressão que dá é que, se ele não tivesse armado com uma
pistola, aquele crime não teria ocorrido. O aumento do porte de arma pode
possibilitar mais crimes?
Na questão do
feminicídio, acredito que não. Até porque a maioria dos crimes é com arma
branca. A questão do armamento, da liberação do armamento para aquelas pessoas
que acham que tem de ter uma arma, é uma questão delicada e que precisa ser
bastante estudada. Acho que é uma nova mudança, uma nova política de armamento
no Brasil, que precisa ser avaliada. Nós entendemos que não pode se liberar
para todo mundo, os critérios precisam ser extremamente rigorosos. Mas aquele
que atingir os critérios e precisar e mostrar essa necessidade, ele pode.
Houve uma redução
de homicídios, que vem desde 2014, 2015, mas havia uma dificuldade em reduzir
os números de crimes contra o patrimônio. A que o senhor atribui essas quedas
recentes?
Vejo isso com
muita clareza na questão da estratégia que nós adotamos. Primeiro, polícia na
rua, isso traz uma sensação de segurança, encoraja as pessoas. Mesmo com baixo
efetivo, nós criamos o serviço voluntário na Polícia Civil. Outra coisa que eu
acho que foi muito relevante nesse primeiro semestre foi a retomada da Polícia
Civil. Não sei o que vinha acontecendo no passado, mas nós herdamos uma Polícia
Civil com série de dificuldades nas investigações. E, hoje, nós temos uma média
de três operações por semana, que desmantela organizações criminosas, prende,
apreende bens, dinheiro.
A gente vê que a
Polícia Civil está mais calma e a paridade nem saiu ainda. Existe uma promessa
do governador Ibaneis, ele mandou para o governo federal, mas não saiu ainda.
Na sua opinião, o que fez com que eles passassem a ter relação menos tumultuada
com o governo do DF?
Desde o
primeiro momento, tratamos com muito respeito. Trouxemos para conversar,
fizemos o que nos cabia naquele momento, criamos o serviço voluntário e, mesmo
com o efetivo pequeno, conseguimos atender demandas que o governo anterior não
conseguia. Acho que é respeito no trato, trabalho integrado. São portas abertas
para tratarmos problemas do DF.
Para viabilizar a
paridade, o governo depende do Planalto. Se essa paridade não for aprovada,
essa lua de mel corre risco?
Acho que corre
risco, porque hoje a Polícia Civil precisa disso. O salário está defasado,
foram muitos anos sem reajuste, mas eu acredito muito no bom senso das
autoridades do governo federal. Acho que o GDF enviou os cálculos dizendo que é
viável esse aumento. Além disso, estamos trabalhando na questão da Polícia
Militar e do Corpo de Bombeiros, que também precisam de recomposição salarial.
Quando o governador
ganhou a eleição, disse que queria um secretário de Segurança com boa relação
com o governo Bolsonaro e, na sequência, seu nome foi anunciado. Essa relação é
próxima? Como isso pode ajudar o DF?
Acho que o
relacionamento entre o DF e o governo federal precisa ser muito próximo. Nós
somos quase que misturados nesse quadradinho. Aproximamo-nos muito durante esse
tempo que estive no Congresso, os gabinetes eram próximos, a gente pensava
muita coisa igual. O Eduardo (Bolsonaro) é policial federal, assim como eu,
então, tinha uma afinidade por questões institucionais da Polícia Federal e do
Congresso, e a gente foi criando uma amizade. Isso pode abrir espaço para a
gente explicar as demandas do DF.
Como está a atuação
da pasta em relação ao combate ao tráfico de drogas?
Eu tenho uma
particularidade com esse crime, porque trabalhei seis anos na Coordenação-Geral
de Repressão de Entorpecentes da Polícia Federal. A gente sabe que esse é o
crime mãe de tudo o que ocorre por aí. A Coordenação de Repressão às Drogas da
Polícia Civil tem feito várias operações, inclusive em outras unidades da
Federação. O tráfico de drogas permeia toda a sociedade.
Qual tipo de droga
preocupa hoje?
Todas. O
crack, por exemplo, dizimou toda uma juventude brasileira que se encontra
viciada nisso, por ser mais fácil, acessível, mais barata e mais suja, que
arrebenta mais a saúde das pessoas. Mas as drogas sintéticas em festas, que têm
custo mais elevado, a gente sabe que está dominando. Não sei se a sociedade brasileira
está preparada para uma legalização, mas eu sou de uma linha da repressão, da
prisão.
O senhor é contra a
descriminalização de todo tipo de droga?
Sim. Não sei
se porque trabalhei com isso e vi pessoas sofrendo com isso, famílias acabadas.
Talvez para algumas pessoas seja uma simples maconha, mas para outras pessoas,
não.
O governo anunciou
o aumento das escolas militarizadas na volta das férias. Essa presença de
policiais dentro das escolas tem surtido efeito?
Nós lançamos
quatro escolas no começo do ano, num projeto piloto para a gente ver e entender
melhor o que aconteceria. Vejo isso com muito bons olhos. A gente está
organizando isso junto ao secretário (de Educação) Rafael (Parente), e a nossa
ideia é chegar a 10 escolas até o fim do ano. Se tudo correr bem e conseguirmos
o financiamento, porque é um projeto caro, acho que a gente consegue chegar ao
fim do governo com 40 escolas. Estive com o ministro da Educação duas vezes
mostrando para ele a necessidade. É um projeto do governo federal. Nas
comunidades que acompanhei mais de perto, que foi em Ceilândia, eu vi um grande
avanço, e na Estrutural, principalmente. Vai mudar a vida das pessoas.
E tem perspectiva
de contratações para as forças de segurança?
Graças a Deus,
nós estamos com a academia da PM lotada tanto de praças quanto de oficiais. A
ideia é replicar isso o ano que vem, trazendo novos candidatos para a academia.
O Corpo de Bombeiros também. Autorizamos mais 350 ingressos agora. O concurso
da Polícia Civil está pronto tanto para escrivão quanto para agente. Basta uma
pequena questão financeira que estamos acertando com a Secretaria de Fazenda.
Um dos temas que
causou polêmica no primeiro semestre foi a transferência dos presos de São
Paulo e de outras penitenciárias de segurança máxima para o DF. As forças de
segurança do DF estão conseguindo resolver essa questão sem colocar em risco o
cidadão?
Nós, do GDF,
avaliamos como um erro estratégico. Não achamos que aqui seja lugar para presos
faccionados, seja no presídio federal, seja onde for. Brasília é a cidade-sede
dos poderes, dos tribunais superiores, do Congresso Nacional, cercada de
autoridades, as embaixadas todas aqui. A segurança de Brasília é diferente. Ela
não é especial, nem melhor. Tem outro foco, além do geral.
A gente viu uma
reportagem da revista Veja na qual um grupo ameaça o presidente, quer cometer
outro atentado. Essa é uma ameaça real? Acredita que é preciso tomar providências?
Acredito que
seja ameaça real, principalmente depois do que ocorreu. Eu levaria isso muito a
sério. Precisamos ter um trabalho de inteligência intensificado, além de
investigação das pessoas que são citadas ali.
O senhor mencionou
que, hoje, grande parte dos latrocínios (roubos com morte) estão relacionados a
roubos de celular ou a tentativas de roubos de celular. De que forma isso pode
ser combatido?
O crime nada
mais é do que, muitas vezes, negócio. Quem está cometendo aquele crime precisa
de dinheiro fácil e faz um assalto, um furto, um roubo e, muitas vezes, um
latrocínio. No ano passado, 80% dos latrocínios ocorridos no Distrito Federal
foram para roubar celulares. É um número que nos chama muito a atenção. Nós
temos produzido vários relatórios de inteligência em relação aos roubos de
celulares no DF. Aparelhos que podem custar R$ 8 mil. Isso realmente chama a
atenção do mundo do crime. Temos políticas direcionadas para isso,
principalmente de investigação para acabar com essas quadrilhas.
(*) Ana
Maria Campos – Helena Mader – CB.Poder - Correio Braziliense
Tags
ENTREVISTA