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Cartas, vídeos, posts e lembranças do coronavírus


Cartas, vídeos, posts e lembranças do coronavírus

*Por Ana Dubeux

Recebo via WhatsApp, um trecho de Kafka à beira-mar, de Harumi Murakami. Diz assim: “E quando a tempestade tiver passado, mal te lembrarás de ter conseguido atravessá-la, de ter conseguido sobreviver. Nem terás a certeza de a tormenta ter chegado ao fim. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade, já não serás a mesma coisa. Só assim as tempestades fazem sentido”. Se você é como eu, que procura sentido para tudo, deve estar se perguntando agora: quando tudo acabar, o que restará? O que, de mim, permanecerá como sempre, inalterado?

O coronavírus manda cartas, recados, mensagens, memes, fake news. Exige limpeza do corpo e reflexão a respeito de hábitos e costumes. Obriga a mudanças importantes de rotina. Mais do que isso, força a porta de entrada da alma. Arromba e deixa um carregamento de medo, insegurança, pânico, ansiedade, solidão. Não, digo, essa bagagem não é minha. Respiro fundo, conto até mil, lavo as mãos, acendo a vela. Penso: seja responsável, faça a sua parte, segura a onda... Vai passar.

Na calmaria, espero ver surtir efeito permanente essa onda de mensagens de amor e de união que se espalha pelo mundo e nos emociona. A cantoria e os aplausos nas janelas; a solidariedade dos grandes e dos pequenos, que dispõem gratuitamente cursos e entretenimento para todos; a preocupação com os mais velhos; o uso da tecnologia para fazer e disseminar o bem.

Espero que, depois de tudo, fique em nós a humanidade, algo tão raro hoje em dia. Apesar das perspectivas sombrias, tenho visto e ouvido coisas boas por aí. Será que tudo isso resistirá por quanto tempo após a tempestade?
Já estávamos tão cansados, não é? Crise política após outra; crise econômica que não cessa. A idiotice reinando absoluta; a imbecilidade elevada a uma magnitude nunca vista; os preconceituosos saindo do armário em fúria desumana; a gente preocupada com as armas nucleares... E chega um coronavírus para avisar: pode ser pior.

Sim, é um recado assustador. Tem uma dimensão catastrófica. Mas, neste momento, precisamos fazer um exercício de olhar lá na frente e repetir: pode ser melhor; o mundo pode ser melhor; vamos fazer dele uma casa melhor. Por enquanto, vamos ficar em casa, lavar as mãos, manter a sanidade mental e agir com responsabilidade. Lá na frente, depois da tempestade, a gente vê o que ficou de bom.

(*) Ana Dubeux - Editora- Chefe do Correio Braziliense -  Fotos/Ilustração - Blog- Google 







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