Após semanas de crise entre governo e base aliada no Congresso, o vice-presidente Michel Temer, em entrevista exclusiva ao GLOBO, defendeu mais diálogo entre os chefes dos poderes e criticou a antecipação da campanha eleitoral, que contaminou a cena política.
O senhor acredita que houve antecipação da campanha eleitoral?
Fala-se da convenção como se ela fosse daqui a 15 dias. Lamentavelmente, antecipou-se muito a eleição presidencial, que causou a antecipação das eleições estaduais. Aí, as pessoas começam a pensar só nos acordos locais. O presidente Lula disse que ele só falou sobre isso porque havia muita gente dizendo que ele deveria voltar como candidato. Então, ele não quis deixar dúvida. Ele antecipou, mas foi para acabar com esse falatório. Causou mais falatório, em função da candidatura da presidente Dilma.
Como ficam os palanques para Dilma em 2014 nos estados em que o PT disputa contra o PMDB?
Como a presidente Dilma pode ir para um lugar, como o Rio Grande do Sul, onde poderá ter quatro candidatos da base? É possível que, de repente, a presidente não vá a nenhum palanque. Ela tem uma popularidade hoje que lhe permite esse luxo. Quem vai decidir isso é a campanha, a presidente e as condições de cada localidade.
Acredita que ela vai se dividir em dois palanques no Rio de Janeiro?
Eu, pelo menos, nem cogito essa hipótese. No Rio, eu cogito a hipótese do candidato (Luiz Fernando) Pezão (vice-governador), apesar do grande respeito que tenho pelo senador Lindbergh (Farias, do PT).
O senhor acredita que o governador do Rio, Sérgio Cabral, pode realmente vir a apoiar Aécio Neves (PSDB-MG), caso Lindbergh mantenha sua candidatura?
No jantar (do PMDB, terça-feira passada), Cabral me disse: “Michel, nós precisamos fazer um ajustamento para que nós possamos estar todos juntos. E esse ajustamento passa pela possibilidade de os partidos aliados lá (no Rio) ajudarem a eleição do Pezão”. Mas ainda falta tanto tempo, não sabemos o que vai acontecer. Ainda é cedíssimo para dizer que essas disputas regionais podem repercutir negativamente na aliança nacional.
Há possibilidade de intervenção da Executiva do PMDB nos estados na construção das candidaturas para 2014?
Estou muito preocupado em dizer uma palavra sobre o PMDB: quem quiser ser candidato será. Não há esse impedimento. O que vamos fazer é conversar com os partidos para ver possibilidades de composição. Agora, não se pode, neste momento, antecipar que, na convenção, dentro de um ano e dois meses, não haverá votos para uma candidatura.
A conversa da presidente Dilma com Renan Calheiros e Henrique Alves, na semana que vem, é para acertar os ponteiros nessa crise entre governo e Congresso?
Os presidentes da Câmara e do Senado estiveram aqui comigo, conversamos, e marquei conversa nossa com a presidente Dilma para trocar ideias na semana que vem. Acho útil esse diálogo entre o Legislativo e o Executivo. É claro que há queixas, mas elas são contornáveis por diálogos que temos, e que certamente a presidente também terá. É uma troca de ideias fundamental, que deve ser repetida a cada 15 dias entre os chefes do Legislativo e a presidente da República. Afinal, são todos chefes de poderes.
O problema está na articulação política, como se queixam os líderes aliados?
Ouço muitas queixas, mas a tarefa delas (ministras responsáveis pela articulação) não é fácil. A da ministra Ideli Salvatti, por exemplo, é dificílima, como foi a de todos os articuladores da Secretaria de Relações Institucionais no passado. É complicadíssimo, quase um atendimento individual. A da ministra Gleisi Hoffmann é uma posição sobrecarregada porque todas as questões passam pela Casa Civil. O que é preciso, muitas vezes, é o diálogo. Porque o diálogo constrói e o silêncio destrói.
Como o senhor avalia o telefonema tenso que a ministra Gleisi fez a Renan Calheiros durante a votação da MP da energia elétrica?
Tem que tomar muito cuidado para não deixar que as emoções do momento cheguem às palavras. As palavras não podem retratar as emoções do momento. Em política, você tem que ter muita calma para poder resolver todas as pendências. A excitação de certos momentos leva a certas afirmações e frases que muitas vezes não são digeridas pelo interlocutor, mas eu acho que isso se acerta. Uma semana acerta tudo. Às vezes, em política, de um dia para o outro as coisas se acertam.
O Planalto tem dificuldades para detectar seus problemas de articulação, já que sempre acaba aprovando as medidas?
Vou tomar uma frase sua: o governo aprovou tudo que queria. Isso significa que a articulação política foi boa; senão, seria difícil aprovar. O que é preciso muitas vezes é um certo ajustamento em face da passagem do tempo. Como o tempo vai passando, você precisa fazer uma “reconversa” para ajustar posições, e essas conversas estão começando a se dar e chegarão a um bom termo proximamente.
O governo saiu derrotado da guerra no Congresso por causa das MPs nas últimas semanas?
Pode-se considerar isso (que foi uma derrota política para o governo), mas eu prefiro dizer que a solução para o problema foi uma vitória para o PMDB. Renan agiu corretamente em não votar (a MP da energia), ele não tinha outra solução. Mas a solução vitoriosa foi do PMDB, de incluir na MP 609 os trechos da MP que caducou.
Como o senhor vê as acusações de que representa mais o governo no PMDB do que o contrário?
Muito recentemente, a acusação do governo era que eu era muito PMDB e pouco governo. De dois meses para cá, começou uma onda de que sou mais governo que PMDB. Mas vou lhe dizer: eu sou PMDB no governo. Tenho meu método de trabalho, que é de convencimento. Acho que tem o problema das eleições no ano que vem. Mas esse é meu estilo, e sempre deu certo. Às vezes, dizem que tenho de mudar meu jeito, mas aí lembro que, do meu jeito, já fui três vezes secretário estadual em São Paulo, duas vezes procurador-geral, três vezes presidente da Câmara, duas vezes líder, 12 anos presidente do PMDB, vice-presidente da República. Para que eu vou mudar? Não quero ser presidente da ONU.
O que o senhor acha da ideia de aumentar o papel do ministro Aloizio Mercadante (Educação) como articulador político?
Mercadante já ajuda bastante. Eu também ajudo, conversamos muito. Mas aumentar o papel dele é uma posição da presidente.
(Júnia Gama e Cristiane Jungblut, O Globo)