Imagens feitas pelo JBr. mostram oferta de transporte clandestino na
fila do serviço autorizado.
Problemas pontuais incomodam
usuários e autoridades na Rodoviária Interestadual de Brasília. A reportagem do
JBr. flagrou tentativas de captação de clientes para o transporte
clandestino dentro da unidade. Diversas pessoas também reclamaram da existência
do estacionamento pago. Para outros usuários, em contrapartida, o conforto e
qualidade dos serviços, se comparados ao antigo terminal, equilibram a balança.
As empresas irregulares costumam
procurar clientes nas cercanias do novo terminal, onde estacionam seus ônibus,
em grande parte irregulares, na parte externa do espaço. Mas, no último fim de
semana, um homem oferecia o serviço ilegal com o próprio carro - e cobrava R$
50 por pessoa, preço médio de uma passagem do tipo executivo, segundo tabela
das empresas de transporte viário.
A prática é combatida pela
Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em parceria com a Polícia
Rodoviária Federal (PRF) e órgãos estaduais, como as respectivas polícias
militares, e é um dos focos de combate das autoridades. O resultado das ações
em 2014 ainda não foi levantado, mas a PRF informou que, somente em dezembro
último, 70 veículos clandestinos foram apreendidos na operação Coiote, que agiu
a partir de quatro unidades da Federação e cobriu, principalmente, as rotas que
levam ao Nordeste e a São Paulo - duas delas cruzam Brasília.
Caso de polícia
Por força de resolução da ANTT de
março do ano passado, ficou estabelecido que “considera-se serviço clandestino
o transporte remunerado de pessoas, realizado por pessoa física ou jurídica,
sem autorização ou permissão do Poder Público competente”.
Assim, a polícia e órgãos
fiscalizadores puderam agir e punir com mais eficácia os infratores que
passaram a se tornar responsáveis pela continuidade da viagem dos passageiros
captados. Após a autuação, eles ainda obrigados a pagar multa superior a R$ 5
mil, dependendo do caso.
O policial rodoviário Jesé
Ferreira explica que, para Brasília, existem estratégias específicas para
flagrar e apreender quem promove transporte interestadual irregularmente.
“Quando fazemos fiscalização por aqui, a gente posiciona equipe na Região
Metropolitana ou em cidadezinhas para matar a viagem bem perto da origem”,
detalha.
Versão Oficial
Procurado pela reportagem, o
Consórcio Novo Terminal, responsável pela administração da Rodoviária
Interestadual, informou que “tem realizado o máximo de medidas para coibir este
tipo de ação (captação de clientes indevidamente), desenvolvendo, inclusive,
campanha de conscientização dos passageiros sobre o risco da utilização do
transporte clandestino”.
O consórcio ainda informou, após
a denúncia do JBr., que “reforçará a instrução de sua equipe para que situações
como esta não voltem a acontecer”, e completou:
“Sempre que indivíduos são
identificados realizando a prática ilegal desse tipo de transporte,
imediatamente acionamos os órgãos competentes para que as providências legais
sejam tomadas. Além disso, estes também são convidados a se retirar do
empreendimento”.
Fiscalização
em cima
De acordo com o policial
rodoviário Jesé Ferreira, as fiscalizações visam garantir que os usuários
recebam um serviço de qualidade. Uma das preocupações, indica ele, é justamente
com o serviço oferecido pelos motoristas, seja de ônibus circulando sem
autorização ou de veículos de passeio.
Segundo o policial, “a malha
rodoviária é muito grande e as pessoas teimam em burlar a fiscalização”, de
modo que ações ordinárias e operações específicas são coordenadas entre
diversos estados e envolvem participação de autoridades regionais para ter
êxito.
“O profissional de uma empresa
regular, para o devido aval da Agência Nacional de Transportes Terrestres
(ANTT), precisa estar credenciado. Ele tem que apresentar os antecedentes
criminais, realizar exames médicos e mais uma série de coisas”, relata o
policial. “O clandestino provavelmente não vai ter nada disso, principalmente treinamento
específico”, alerta.
Risco
Além da possibilidade de
exposição à captação para transporte irregular, que coloca o passageiro em
risco, por se tratar de um serviço não autorizado, os usuários da Rodoviária
Interestadual não gostam do fato de precisarem pagar para estacionar quando não
há vagas fora da área privada. “Em questão de segurança, é uma vantagem, mas a
gente já paga muitos impostos”, reclama o servidor público Rui Vaz, de 34 anos.
Ele relata que frequenta o novo
terminal periodicamente, pois costuma receber parentes, e gostaria de poder
parar seu automóvel livremente. O servidor público pondera, no entanto, sobre a
educação dos outros motoristas. “Acho que muitas pessoas deixariam o carro aí e
iriam fazer outra coisa, atrapalhando o pessoal que só quer embarcar ou
desembarcar parentes”, acredita.
Para acompanhar a irmã, que está
de partida, ele levou a pequena Heloísa, sua filha de dez meses. Ele elogiou o
conforto oferecido à família e comparou o local com a antiga Rodoferroviária,
que frequentou por muitos anos. “Aqui tem mais conforto e menos sujeira, além
de ter mais assentos. Sem contar o espelho d'água, que pode entreter a
criança”, exaltou Rui.
Ponto de
vista
O policial rodoviário federal
Jesé Ferreira exemplifica os perigos de alguém embarcar em uma viagem em
transporte clandestino ou irregular. “As condições de segurança do veículo
geralmente não estão boas: extintor, cinto de segurança, pneu, etc. Vemos
muitos ônibus em estado de conservação bem precária”, diz.
Ele também afirma que, como na
maioria dos casos os motoristas de empresas clandestinas não têm vínculo
empregatício, podem ser submetidos a viagens de até dois mil quilômetros, ida e
volta, sem descansar devidamente. “Toda empresa de transporte tem que contratar
um seguro à parte, além do Dpvat e cumprir outras exigências. Eles geralmente
descumprem todas, por isso o custo da viagem fica mais barato”, complementa.
Para identificar os transportes
que carregam passageiros ilegalmente, Jesé afirma que são mapeadas rotas
utilizadas exclusivamente pelos clandestinos, abundantes em estradas que cortam
o Nordeste e São Paulo, segundo o policial. Ônibus não identificados ou de
empresas que não costumam rodar na região também seriam indicativos de
irregularidade.
Saiba mais
De acordo com o Consórcio Novo
Terminal, responsável pela administração da Rodoviária Interestadual, entre
janeiro e dezembro de 2014 foram registradas 80,7 mil partidas e pouco mais de
1,3 milhão de pessoas realizaram embarque.
A nova rodoviária foi inaugurada
em 2010. Até então, os embarques e desembarques de ônibus interestaduais eram
feitos na antiga Rodoferroviária, que substituiu a atual Rodoviária do DF para
a função em 1981.
Uma curiosidade é que Renato
Russo escreveu Faroeste Caboclo em 1979, portanto, mesmo vindo do
Nordeste, João de Santo Cristo, na música, pode ter desembarcado na Rodoviária
do Plano. À época do lançamento da canção, oito anos depois, porém, a
Rodoferroviária já era utilizada.
Estrutura física agrada maioria dos passageiros
Para o designer gráfico João
Santana, de 41 anos, a estrutura do novo terminal, se comparada à do antigo,
está em boas condições. “O antigo era o fim da picada, pois ali você não tinha
segurança. Esse daqui é quase igual ao de Goiânia, que é muito organizado”,
elogia João. Enquanto aguardava a hora do embarque da irmã, o designer
aproveitou a exposição Andarilhos, e aprovou a iniciativa de introduzir arte de
fotografia ao cotidiano de espera dos passageiros.
A doméstica Dália Quintino, de 52
anos, estava de partida para sua cidade natal, João Pinheiro (MG). Veio
trabalhar em Brasília por um ano e, tendo conhecido apenas rodoviárias menores
nos municípios que já visitou, se disse confortável no aguardo do ônibus.
“Estive em Brasília da outra vez há 20 anos e o terminal não era esse, era
totalmente diferente”, afirmou.
Sua única ressalva foi para o
preço dos alimentos dentro da Rodoviária Interestadual. Por considerar que o
típico passageiro de ônibus tem menor poder aquisitivo que o de avião, por
exemplo, Dália gostaria de ver valores menores pela comida oferecida dentro do
empreendimento. “Não sei se é porque, estando aqui, o pessoal, se quiser, tem
que comprar aqui dentro de qualquer jeito”, especula.
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Fonte: Eric Zambon - da redação do Jornal de
Brasília