test banner

LAVA-JATO » Consultorias sem explicação

Em oito anos, empresa de Dirceu recebeu R$ 10 milhões em consultorias prestadas para empresas da Lava-Jato

Empreiteiras não comprovam natureza do serviço prestado por José Dirceu. Polícia Federal deve ouvir ex-ministro sobre contratos

Empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato informaram à Polícia Federal que não possuem nenhuma prestação de contas dos serviços de consultoria da empresa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Não há relatórios, fotos de palestras, atas de reuniões, resumo de negócios que foram aprovados graças à intermediação da JD Assessoria e Consultoria. A suspeita dos investigadores é de que as consultorias foram usadas, ao menos em parte, para mascarar pagamentos de propinas de contratos superfaturados com a Petrobras.

Um dos procuradores da força-tarefa da operação, Carlos Fernando Lima, disse ao Correio que é improvável que essas consultorias sejam reais, mesmo para abrir portas, como alegou Gérson Almada, executivo da Engevix. Ele quer tomar o depoimento do presidente da holding Camargo Corrêa, Vítor Hallack, para esclarecer o trabalho prestado à empreiteira. A PF estuda ouvir o próprio Dirceu sobre a inexistência de prestação de contas de seus serviços. As próprias empreiteiras, depois de procuradas por vários dias pelo Correio, negaram qualquer informação sobre o resultado efetivo dessas consultorias.

A assessoria de Dirceu nega irregularidades. “A relação comercial da JD com as construtoras investigadas não tem qualquer vínculo com os contratos das empreiteiras com a Petrobras”, afirmaram os auxiliares do ex-ministro ao jornal. “As construtoras investigadas também se manifestaram publicamente e em depoimento à Justiça, confirmando que a JD foi contratada e trabalhou na prestação de serviços no exterior.” Dirceu se ofereceu para prestar esclarecimentos à polícia e afirmou que sua empresa encerrou as atividades.

Em 17 de março, Almada disse à 13ª Vara Federa de Curitiba que fez pagamentos ao operador Milton Pascowitch, que trabalhava para o estaleiro ERG, vinculado à empreiteira. Os recursos eram para atender ao PT. A PF suspeita que Pascowitch pagava propinas no esquema de corrupção da Petrobras. “O Milton veio falar: ‘Olha, Gérson, acho que você precisa manter um relacionamento com o partido, você precisa manter um relacionamento com um partido, você precisa manter um relacionamento com o cliente e eu me proponho a fazer isso”, declarou o executivo, preso desde novembro do ano passado.

Almada disse que Pascowitch, cuja empresa pagou R$ 1,4 milhão à JD Consultoria, indicou os serviços do ex-ministro à Engevix. O executivo atestou que Dirceu prestou serviço no exterior e era um “brilhante open door”, ou “abridor de portas” em “vendas em toda a América Latina, Cuba e África”, locais onde o ex-ministro “tinha um capital humano de relacionamento muito forte”.

O procurador Carlos Fernando duvida. Para ele, os serviços podem até ser necessários à Engevix e outras clientes da JD, como a UTC e a Camargo Correa — cujos executivos confessaram pagamentos de propina no esquema da Petrobras. “Você pediria para uma mesma pessoa fazer a mesma atividade no mesmo período sabendo que ela está atuando para todos os concorrentes?”, afirmou Fernando. “É incompatível a ideia de que ele prestou lobby para cinco empreiteiras ao mesmo tempo. Isso foge de qualquer razoabilidade comercial.” Lima disse que a atuação era sempre “nos mesmos países”, como Peru, Cuba e Venezuela.

Habilidade inegável
Dirceu cumpre prisão domiciliar em Brasília após ser condenado no mensalão. Sua assessoria disse ao Correio que o ex-ministro “possui inegável e reconhecida capacidade de análise de conjuntura política e econômica do Brasil e, sobretudo, da América Latina, Europa e Estados Unidos”. “Tal capacidade é reconhecida internacionalmente e foi de fundamental importância para a JD construir sua reputação e sua clientela. A JD atendeu cerca 60 clientes e quase 20 setores diferentes da economia, segundo a assessoria.

A JD recebeu R$ 29 milhões entre 2006 e 2013. Desse valor, R$ 10 milhões (35%) foram para empresas envolvidas na Lava-Jato e citadas em parecer do Ministério Público no inquérito sobre a empresa de Dirceu. Procurada, a Camargo Corrêa silenciou. A OAS disse que todos os seus contratos seguem a lei e “exerce suas atividades com integridade e pautada pela conduta ética”. A Engevix nada esclareceu, assim como a UTC, a Egesa e a Delta, nova dona da Sigma. A CamaA Galvão Engenharia resumiu a atuação de Dirceu: “Foram contratados, prestados e pagos serviços de consultoria voltados para expansão internacional da companhia”. A reportagem não localizou a Jamp e nem representantes de Pascowitch.

"É incompatível a ideia de que ele (Dirceu) prestou lobby para cinco empreiteiras ao mesmo tempo. Isso foge de qualquer razoabilidade comercial”
Carlos Fernando Lima, procurador

R$ 847 milhões para investigadas
A Caixa Econômica Federal fechou R$ 847 milhões em contratos com duas empresas investigadas na Operação Lava-Jato ligadas ao ex-deputado André Vargas (ex-PT-PR). Com a IT7 Sistemas, foram R$ 87 milhões de 2012 até hoje, mas R$ 10 milhões não foram pagos, porque os contratos estão suspensos assim como aconteceu com a agência de publicidade Borghi Lowe. A agência é dona de R$ 760 milhões em contratos, divididos com outras duas empresas de publicidade, mas 85% foram gastos com veiculação de propaganda. A PF sustenta que parte do dinheiro dos negócios ia parar na conta de firmas controladas por Vargas, que indicou Clauir Santos, funcionário de carreira do banco, para o cargo de diretor da instituição bancária. Em nota ao Correio, a Caixa sustenta que não possui vínculos com o ex-deputado e que já abriu apuração interna. 

Negócios sob suspeita

Cliente – Valor pago    Serviço previsto em contrato    Qual o resultado do serviço?  


OAS – R$ 2,99 milhões    Assessoria para estratégias comerciais e industriais;  relações empresariais e institucionais com países da América Latina; estudos de viabilidade econômica no Brasil e no exterior.    Não explica.    

UTC Engenharia – R$ 2,3 milhões     Assessoria para obter “parcerias e relações empresariais e institucionais” com países da América Latina.    Diz que não obteve informações.

    
Jamp – R$ 1,24 milhão    “Assessoria e consultoria ao (...) programa de expansão (...) no mercado nacional e internacional.”     Não localizada.

    
Engevix – R$ 1,1 milhão    Assessoria institucional para atuação no mercado latinoamericano    Não explica.
    
Camargo Corrêa – R$ 900 mil    “Análise de aspectos sociológicos e políticos do Brasil”, “assessoria na integração dos países da América do Sul”, “divulgação do nome da contratante dentro da comunidade internacional e nacional.”    Silencia.

    
Galvão Engenharia – R$ 750 mil    “Análise de aspectos sociológicos e políticos do Brasil”; “assessoria na integração da América do Sul, África, relações com os Estados Unidos e a Europa”; fazer conferências internacionais.    Não explica.    


Egesa – R$ 480 mil    Informações sobre “aspectos sociológicos e políticos do Brasil” e “divulgação do nome da contratante dentro da comunidade internacional e nacional”.    Silencia.    


Sigma (Delta) – R$ 80 mil    “Serviços de assessoria.”*    Silencia.    

*Não há contratos da Sigma disponíveis, apenas quatro notas fiscais com descrição genérica.

Fontes: Receita Federal, contratos, notas fiscais e empreiteiras


Obra de cortesia

Segundo revista, Lula teria pedido reforma a construtora investigada

A empreiteira OAS fez uma obra num sítio em Atibaia (SP) a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo edição desta semana da revista Veja. A publicação diz que o Sítio Santa Bárbara é frequentado pelo petista nos fins de semana, local onde recebe amigos e políticos mais próximos. A revista aponta que o pedido foi feito a José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro, executivo da empreiteira investigada na Operação Lava-Jato e em processo de recuperação judicial. Na prisão desde novembro, o executivo estuda fazer delação premiada, ainda de acordo com a publicação, e faz anotações no cárcere sobre o que pode dizer à polícia. Uma dessas anotações é uma reforma no sítio frequentado por Lula.

Reservadamente, auxiliares do ex-presidente ouvidos pelo Correio negaram a negociação e disseram que a revista não apresentou qualquer prova de que o petista tenha feito o pedido a Léo Pinheiro. Publicamente, Lula não quis comentar o tema. A empreiteira OAS, de Léo Pinheiro, não prestou esclarecimentos até o fechamento desta edição.

Segundo a revista, o pedido de Lula ocorreu em 2010, meses antes de terminar o segundo mandato do petista. Um interlocutor que visitou Pinheiro na cadeia afirmou à Veja que esse pedido está registrado em anotações do executivo. As obras se iniciaram no começo de 2011. A propriedade tinha duas casas, piscina e um pequeno lago. O sítio agora possui residências reformadas, um pavilhão, piscina ampliada, área para a churrasqueira, estradas com calçamento de pedra e grama, campo de futebol, dois tanques de peixes com pedalinhos, uma cascata, câmeras de segurança, canil e guardas armados.

Para terminar o trabalho, havia turnos durante o dia e a noite, e nos finais de semana. Os pagamentos eram feitos em dinheiro vivo. “Ajudei a fazer uma das varandas da casa principal. Me prometeram 800 reais, mas me pagaram R$ 2 mil reais a mais só para garantir que a gente fosse mesmo cumprir o prazo, tudo em dinheiro vivo”, disse Cláudio Santos à revista. “Nessa época, a gente ganhou dinheiro mesmo”, contou o caminhoneiro Dario de Jesus. “Eu pedi 6 reais o metro cúbico de material transportado. Eles me pagaram o dobro para eu acabar dentro do prazo. Eram R$ 20 mil por vez. Traziam o envelopão, chamavam no canto para ninguém ver, pagavam e iam embora.”



Por: Eduardo Militão – Correio Braziliense 

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem