Madame realmente não gosta de ouvir opiniões
Por: Carlos Chagas
Teimosa, Madame é, sabendo-se que essa
qualidade às vezes favorece e às vezes prejudica. Com o governo no fundo do
poço, não faltam conselhos para ela ampliar o leque, convidar adversários e
indiferentes, além de aliados, ouvindo mais do que falando e tirando dos
diálogos as lições necessárias. Só que ela é dura na queda. Divide o mundo em
duas metades, a dos mocinhos e a dos bandidos. Os que não estão com Dilma estão
contra Dilma, parece esse o pensamento.
Tome-se ontem. Pela manhã, a presidente
reuniu presidentes dos partidos de sua base, com os respectivos líderes
parlamentares. O tema era premente, no caso, a importância de ser aprovado o
ajuste fiscal, sem o qual, dizem, o país se desagregará. Mesmo tendo presente a
reação de muitos de seus adeptos ao elenco de maldades preparado pelo ministro
da Fazenda, tratou-se de uma reunião do óbvio. Nenhum presidente de partido ou
líder de bancada ousaria, como ninguém ousou, criticar ou contrapor argumentos
desfavoráveis às sugestões de Joaquim Levy, melhor dizendo, da Dilma.
A primeira pergunta que fica é por que não
foram convidados, também, dirigentes de partidos desvinculados de seu governo,
até oposicionistas? Só teria a ganhar, recebendo ponderações contrárias a seus
pontos de vista, ainda que não se dispusesse a segui-las. Costuma ser
improdutivo fazer do palácio do Planalto um Clube da Luluzinha, onde a anfitriã
fala e os comensais elogiam a refeição.
GOVERNO AUTORITÁRIO
Mas tem mais, nessa demonstração de um
governo autoritário e absolutista, que caminha para o precipício por nem querer
escutar e até desprezar opiniões diferentes e divergentes.
A Constituição fornece remédios para se
alargar a pauta de decisões monárquicas. Na Seção V do Capítulo II do Título
IV, nos artigos de 89 a 91, foram criados o Conselho da República e o Conselho
de Defesa Nacional.
No primeiro, estabelecendo-se como um órgão
superior de consulta do presidente da República, dele participam o
vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes da maioria e
da minoria na Câmara e no Senado, o ministro da Justiça e mais seis cidadãos
natos, maiores de 35 anos, sendo dois indicados pelo presidente da República,
dois eleitos pela Câmara e dois pelo Senado, todos com mandato de três anos,
vedada a recondução.
Alguém tem notícia de a presidente Dilma
haver sequer indicado ou solicitado a indicação desses ilustres cidadãos? Não
será por falta de gente ilustre, capaz e acima de tudo experiente, em condições
de assessorá-la e repartir com ela opiniões de alto valor. Certamente que não
para pronunciar-se sobre a intervenção federal, o estado de defesa e o estado
de sitio, opções que citadas, felizmente não se colocam. Mas para definir-se
sobre “questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas”,
por que não?
Vale o mesmo para o Conselho de Defesa
Nacional, com a composição do Conselho da República acrescida dos ministros da
Defesa, das Relações Exteriores, do Planejamento e dos comandantes da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica. São múltiplas suas competências ligadas à guerra,
à decretação de estados emergenciais e à utilização de áreas indispensáveis à
segurança do território nacional, como também a missão de estudar, propor e
acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a
independência nacional e a defesa do estado democrático.
Não poderiam, as personalidades referidas,
entender que o país atravessa situações onde a independência nacional e a
defesa do estado democrático precisam de cuidados, encontrando-se sob risco?
Certamente os integrantes do Conselho de Defesa Nacional contribuiriam para
encontrar roteiros que nos livrariam da crise econômica, da inflação desmedida
e do caos social já à vista de todos. Mas será preciso que Madame pare de
continuar se imaginando detentora única de todas as verdades absolutas.