Presos na Operação Lava-Jato: deflagrada em março de 2014, a ação descortinou um megaesquema de corrupção
MPs de 21 países lançam campanha para destacar a importância
da população no combate aos desvios. Crimes de colarinho branco roubam o
equivalente a 5% do PIB mundial por ano
Os ecos da Operação Lava-Jato, maior esquema de corrupção já
investigado no Brasil, aliado a casos similares em países vizinhos, como
Argentina, Bolívia e Chile, levaram os ministérios públicos de 21 países a
organizarem uma ação conjunta contra a prática. A intenção da Associação
Ibero-Americana de Ministérios Públicos (Aiamp) é atrair a população desses
países para fechar o cerco contra o crime, responsável por desvios anuais de
US$ 2,6 trilhões, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (Pnud). A soma é equivalente a mais de 5% do PIB mundial.
A partir
de amanhã, os ministérios públicos dos 21 países membros da Aiamp lançam a
campanha “Corrupção Não!” em toda a América Latina. O foco é mobilizar jovens
de 16 a 33 anos contra os crimes de colarinho branco. Segundo o Pnud, os
desvios de recursos públicos são o maior obstáculo ao desenvolvimento econômico
e social no mundo. Na tarefa de tentar reverter os estragos promovidos pelos
desmandos na gestão pública, somente na Operação Lava-Jato, foram recuperados
R$ 579 milhões. Outros R$ 1,04 bilhões foram bloqueados em território nacional,
e R$ 942 milhões, no exterior. A cifra, no entanto, é pequena perto do que
escorreu pelos ralos da Petrobras. A estimativa é de que toda a engrenagem
tenha movimentado mais de R$ 10 bilhões.
Considerando
os casos de improbidade administrativa, foram instaurados 6.118 procedimentos
de investigação neste ano. O número equivale a mais do que a metade dos 11.405
abertos no ano passado. Quanto às ações civis públicas, que consistem no
processo judicial em si, o MPF propôs 300 neste ano, diante de 2.002 em 2014.
Em março, o Ministério Público enviou ao Congresso Nacional 10 sugestões de
mudanças legislativas de enfrentamento à corrupção. As propostas incluem
criminalização do enriquecimento ilícito de servidores públicos, reforma no
sistema de prescrição penal e prisão preventiva para assegurar devolução de
dinheiro desviado.
Na
avaliação de especialistas, as mudanças necessárias para enfrentar a corrupção
vão desde tornar as punições mais rigorosas a reformas no funcionamento do
sistema político. Cientista político e professor da Universidade de Brasília
(UnB), João Paulo Peixoto defende o aumento de penas e a redução da
possibilidade de recursos na Justiça. “A legislação é branda de maneira geral,
tem possibilidade de o sujeito escapar da prisão, não cumprir totalmente a
pena. A certeza de que se cometer um ilícito vai ser punido rapidamente é o que
efetivamente inibe a corrupção”, afirma.
Para
Roberto Romano, professor de ética da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), as mudanças devem se destinar ao âmbito político e econômico. Ele
critica a distribuição de cargos comissionados e defende a regularização do
lobby, a diminuição dos recursos gastos com campanhas políticas e uma menor
centralização de recursos na União. “A distribuição de verbas acontece na
medida em que governadores e prefeitos aceitam o jogo de apoiar o governo. Já
há aí um sistema inteiro baseado na corrupção.”
Distrito Federal
No
enfrentamento aos desvios de recursos públicos, o Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios (MPDFT) — cujo Grupo de Operações de Combate ao Crime
Organizado (Gaeco) é considerado referência no país — tem chegado a resultados
expressivos. A Operação Caixa de Pandora resultou em R$ 8,168 milhões em
condenações a 10 réus em seis ações de improbidade administrativa, após
julgamento na segunda instância. No âmbito penal, as 17 ações pedem o
ressarcimento de R$ 739,5 milhões. A operação investigou a compra de apoio
político de deputados distritais e secretários por meio de desvios em contratos
de informática com o Governo do Distrito Federal e resultou na inelegibilidade
do ex-governador José Roberto Arruda (PR) e dos ex-deputados Benedito Domingos
(PP) e Jaqueline Roriz (PMN).
O
promotor Clayton Germano, coordenador do Gaeco, destaca a importância das
denúncias na atuação do MP. “É a partir daí que fazemos a análise para iniciar
a investigação propriamente dita, com o ajuizamento de pedidos de interceptação
telefônica, buscas e apreensões, prisões, oitivas, quebra do sigilo bancário,
fiscal, de e-mails e mensagens”, explica. Ele acredita que a garantia de
punição rigorosa é o caminho para evitar novos casos de corrupção.
Quanto a
mudanças para auxiliar nas investigações, o promotor Alexandre Sales,
coordenador do Centro de Produção, Análise e Difusão do MPDFT — órgão que
auxilia nas investigações de lavagem de dinheiro —, defende que haja uma
limitação das operações em espécie. “Uma pessoa chega ao banco e saca R$ 1
milhão. Isso aí dificulta, para não dizer que impede, qualquer tipo de controle
para utilização desse dinheiro”, afirma. As ações do setor resultaram no
rastreamento e na restituição de R$ 1 bilhão desde 2007.
Por: Marcella
Fernandes – Correio Braziliense