Os médicos sabem que quando mais cedo for descoberta a
doença, mais fácil será a cura e mais difícil é precisar o problema. Ao
contrário, quanto mais tarde vier a ser descoberto o mal, mais difícil é a cura
e mais simples será o diagnóstico. Nos anos 1960, o Brasil passou por séria
crise econômica. O renomado economista Celso Furtado foi convidado a elaborar o
que seria o ajuste fiscal da época. Foi chamado de plano trienal. Era a
emergência para salvar o governo João Goulart, envolvido em crise política, inflação
elevadíssima e crescimento pífio, depois dos alucinantes anos JK.
O plano
foi elaborado em poucos meses. Seu objetivo era retomar o crescimento do
produto interno bruto no nível de 7% ao ano, depois do fracasso completo das
políticas econômicas iniciais de João Goulart e também, pela primeira vez,
iniciar um plano de distribuição de renda. Esse plano, que partia do princípio
da gradual substituição de importações, colocava a culpa da disparada dos
preços nos desequilíbrios estruturais da economia brasileira.
Para
alcançar o objetivo planejado, foram alocados 3,5 trilhões de cruzeiros para
investimentos, a preços de 1962, supondo que isso ocasionaria aumento da renda
per capita. Os objetivos eram contraditórios e o planejamento, equivocado:
aumento dos impostos e tarifas, ignorando o efeito sobre os investimentos
privados; redução do desperdício público, mesmo assim aumentando os salários;
captação de dinheiro do mercado de capitais; e a tentativa de conseguir
recursos externos, apesar da crescente hostilidade ao capital estrangeiro.
Há uma
certa similaridade entre os anos 1960 e o atual panorama brasileiro. O discurso
do governo de agora é semelhante ao daquela época. A preocupação social
revestia as ações do governo. Reforma agrária, na lei ou na marra, o
enfrentamento com o Congresso, inflação elevada, descontrole das contas
públicas e a dificuldade de chegar a um diagnóstico preciso do que está, de
fato, ocorrendo na economia nacional. Hoje, o ministro do Planejamento cuida
dos cortes nas despesas federais. O ministro da Fazenda trabalha no lado da
elevação da arrecadação. Ficou fácil: cria-se um imposto, a CPMF com outro
nome, e trata-se de fazer breve maquiagem nas despesas públicas. Assim a conta
fecha. O contribuinte paga.
Há outra
semelhança. Jango era o líder do PTB, Partido Trabalhista Brasileiro, herdeiro
político de Getúlio Vargas. O populismo trabalhista é tradicional no Brasil.
Ele atravessa a história e chega ao século 21 agasalhado, ao menos na teoria,
pelo PDT, criado por Leonel Brizola, depois que, na redemocratização, ele
perdeu a legenda — o PTB, para Yvette Vargas. Essa é a matriz do pensamento
atual.
Coincidência
ou não, a presidente Dilma Rousseff iniciou a carreira política dentro do PDT,
no Rio Grande do Sul, no governo Alceu Collares. Ela se transferiu para o
Partido dos Trabalhadores depois que se acertou com o ex-presidente Lula. Foi
ministra de Minas e Energia, presidente do Conselho Deliberativo da Petrobras,
chefe da Casa Civil e, finalmente, presidente da República. Antes de chegar ao
Palácio do Planalto, jamais concorreu a uma eleição.
Não há,
portanto, nada de novo. A história, ao que parece, está se repetindo. Jango,
como se sabe, foi deposto. Era um homem rico. Mas viveu seus últimos dias no
exílio. Dilma se esforça para não perder o poder. Ela fala abertamente na
possibilidade de golpe e de impeachment. Chama para si os problemas que cercam
sua administração. Seus antigos aliados começam a se distanciar do poder. O
ex-presidente Lula ainda tenta ajudar, mas procura se proteger porque sonha com
a eleição de 2018. Seu desgaste está chegando ao ponto crítico.
O que se
chamava naquela época de república sindicalista comete os mesmos erros. Não
reconhece o Brasil como um país maior que suas abstrações. Trata as questões nacionais
de maneira provinciana. A política externa foi abandonada. O país vive no
território do improviso na política econômica. Não é possível cortar na própria
carne porque os sindicatos não aceitam perder o poder. A solução viável é
aumentar impostos, o que não agrada à maioria da sociedade. O impasse está
sobre a mesa. Alguém terá que ceder. Os números da economia pioram como
consequência direta da falta de confiança que o governo inspira. Quanto mais
passa o tempo, mais fácil o diagnóstico e mais difícil é a cura. Ao fundo, a
Operação Lava-Jato.
Por: André Gustavo Stumpf - Jornalista
– Fonte: Correio Braziliense