Com a deflagração da Operação Lava-Jato e o
consequente aprofundamento das investigações, políticos e empresários apanhados
de calças curtas correram, em desespero, para os mais renomados e caros
escritórios de advocacia do país. Nunca essas bancas faturaram tanto.
Alguns desses caros profissionais chegam a cobrar
milhões de reais apenas para dar início aos procedimentos nos processos de
defesa. Aqui cabe um parêntese, não à guisa de moralismo vazio, mas apenas na
intenção de resgatar exemplo histórico dado pelo mestre dos advogados, o
saudoso Sobral Pinto, ao explicar em carta os motivos que o levaram a abrir mão
da defesa de um cliente enrolado com a lei: “O primeiro e mais fundamental
dever do advogado é ser o juiz inicial da causa que lhe levam para patrocinar...
Incumbe-lhe, antes de tudo, examinar minuciosamente a hipótese para ver se ela
é realmente defensável em face dos preceitos da Justiça. Só depois que eu me
convenço de que a justiça está com a parte que me procura é que me ponho à sua
disposição”.
A rigor, esse trecho da famosa carta deveria ser
transformado em lei, tamanho o vigor ético e a correta concisão de procedimento
profissional. Ao que se assiste hoje, em face do alargamento dos casos de
corrupção em todos os poderes da República, é o salve-se quem puder, sobretudo,
salvem-se aqueles que mais podem.
O ar de deboche e pretensa superioridade de alguns
dos personagens envolvidos nesse escândalo confirma nosso perfil histórico
recheado de casos de impunidade dos nossos fidalgos. Impunidade que encontra
nos escritórios desses defensores da elite a porta de saída para os entreveros
com a lei.
Millôr Fernandes costumava dizer, com a verve que
lhe era costumeira, que “o advogado é o sócio do crime”. Mais do que conhecer
as veredas e os atalhos da lei, o bom advogado hoje parece ser aquele indivíduo
que antes de tudo conhece os juízes.
Num rio, qualquer contaminação das águas a montante
polui toda a corredeira até a foz. No mesmo sentido, é preciso verificar, em
sentido amplo, se os recursos usados por alguns desses “impolutos” clientes
para garantir honorários fabulosos não foram obtidos na mesma fonte turva da
corrupção. O uso de dinheiro obtido de forma ilícita para garantir benefícios e
amparo da lei parece-nos aberração somente possível neste país surreal de hoje.
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A frase que não foi pronunciada
“Nem ser rico ou
pobre, nem ter habilidade para convencer, muito menos o bem comum. O que chama
muitas pessoas para a política é o poder, o dinheiro ou o ego.”
(Ulisses Guimarães, de onde estiver)
Por: Circe Cunha – Coluna “Visto,
lido e ouvido” – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog-Google