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Sopram ventos de mudanças

O Senado tomou duas decisões históricas. Ao deliberar sobre a prisão de Delcídio do Amaral, determinada pelo Supremo Tribunal Federal, abriu mão do voto secreto e manteve o senador na cadeia. Não se trata de deliberação banal. A Câmara Alta criou precedente. Nunca antes um senador havia sido preso no exercício do mandato. A Constituição blinda o parlamentar para que ele não tenha cerceada a plena liberdade de legislar. Só abre uma brecha na proteção: o flagrante delito.

A Carta de 1988 previa voto secreto em situações como a analisada na sessão de quarta-feira. Emenda à Constituição permitiu a publicidade da preferência do parlamentar. Mas o regimento da Casa desconheceu a guinada e manteve a redação anterior. Coube, então, ao plenário decidir a modalidade a ser adotada no caso do líder do Partido dos Trabalhadores. O resultado: por 52 a 25, ganhou a transparência. Em outra votação, por 13 a 53 e uma abstenção, ratificou a sentença do STF.

Espírito de corpo é marca registrada do parlamento. A regra: você me protege, eu protejo você. Você me apoia, eu apoio você. A troca de favores sempre imperou na Casa com a desenvoltura de quem anda pra frente. Mas ventos novos sopram no país e, como não poderia deixar de ser, chegam ao Congresso Nacional. As prisões, historicamente ocupadas por pobres, hoje recolhem banqueiros, empresários, políticos. O recado é claro: ninguém está acima da lei.

A guinada tem íntima relação com mudanças ocorridas na sociedade. Foi tal a pressão popular por meio das mídias sociais que muitos senadores viraram a casaca para ficar bem na foto. Preferiram perder o anel a perder os dedos, a mão, o braço, a cabeça. Os representados rejeitam tutelas. Querem participar das decisões. Não só. Querem saber se o candidato a quem deram o mandato traduz a vontade do eleitor, que, além de o ungir nas urnas, lhe paga os subsídios.

O Senado soube fazer a leitura do tempo. O brasileiro mudou. Quer transparência e prestação de contas. Em 2013, ocupou as ruas para exigir transformação das instituições. As mídias sociais incentivam a sociedade horizontal. Ninguém mais precisa de intermediários para se informar, opinar, exigir direitos. Perderam o sentido privilégios macaqueados dos sistemas absolutistas.

No século 21, nada soa mais anacrônico do que o voto secreto e o foro privilegiado. Se a Constituição diz que todos são iguais perante a lei, por que existem os mais iguais? A existência da casa grande e senzala sustentava regalias que deixavam nítida a separação do nós e eles. Nós, os detentores do poder. Eles, o povo. A marcha do calendário aproximou os polos. Nós e eles se confundem.


Fonte: “Visão” do correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google

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