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#ENTREVISTA: IVAN CAMARGO (Reitor da #UNB) » "Será um ano politicamente agitado"

"A tentativa que fizemos nesses últimos três anos é a de racionalizar o uso das empresas terceirizadas. Uma transição difícil. Estamos, por exemplo, hoje, sem motoristas"

Às vésperas do início das aulas na Universidade de Brasília (UnB), o reitor traça planos para alcançar o equilíbrio orçamentário e investir em áreas essenciais. Além disso, 2016 será agitado por eleições, nas quais o gestor tentará a reeleição

A Universidade de Brasília (UnB) começará o ano letivo em 7 de março, mais uma vez, em deficit. Desta vez, são R$ 18,6 milhões a menos do que a instituição gasta para manter a estrutura. Desde o ano passado, a UnB acumula duas pressões orçamentárias: além do vermelho que a acompanha há anos, recebe menos verba do Ministério da Educação (MEC) por causa dos cortes da União. Embora o atual reitor, Ivan Camargo, mantenha postura de arrocho na gestão — e receba duras críticas por isso —, a conta ainda não fecha. A verba de R$ 1,7 bilhão por ano que o MEC repassa não é suficiente para manter setores estratégicos.

Os cortes nos contratos terceirizados têm sido uma das saídas da administração. Ao Correio, o reitor disse que, para garantir o funcionamento da universidade, tem ido ao MEC de “pires na mão”. “Em 2014, eu comecei a pedir dinheiro em outubro. Em 2015, em janeiro. Neste ano, precisava pagar uma conta e não contava com o orçamento, embora tivesse financeiro. Consegui nos 45 minutos do segundo tempo”, afirmou. “A vida do gestor público não está fácil”, complementou.

Uma das soluções que a reitoria estuda para conseguir investir na UnB é a venda de parte do milionário patrimônio —  são 1,5 mil imóveis avaliados em R$ 6 bilhões. A projeção da 207 Norte, única quadra vazia no Plano Piloto, e as coberturas podem ser os primeiros. A ideia é aplicar em áreas essenciais bastante prejudicadas, como na construção e modernização dos laboratórios. Como a decisão da venda não cabe apenas ao reitor, Ivan afirma que fará um plano detalhado ao Conselho Universitário da UnB (Consuni).

Além disso, 2016 reserva eleições para reitor, para a Associação dos Docentes (ADUnB) e para o Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Universidade de Brasília (Sintfub). Ivan tentará a reeleição. “A gente precisa ficar mais um tempo. Quatro anos é pouco”, resume.
"É dramática essa realidade. Porque você tira o investimento do futuro para apagar incêndio do presente. Custeio é presente. Investimento é futuro"
"Eu tenho laboratórios em várias partes da universidade absolutamente sucateados. São esses tipos de investimentos que precisam ser feitos. Eu tenho certeza que a gente não fará esse ano"
                       
2015 foi um ano de arrocho, com cortes do MEC para as universidades federais. O que esperar para 2016?
Tudo leva a crer que será um ano difícil. Já começou com dificuldades. Eu tinha a ilusão, no fim do ano passado, de que 2016 seria um ano mais tranquilo. A lei (Orçamentária) está aprovada, definida… Mas começamos o ano com restrições financeiras.

O senhor diz isso da UnB ou do governo federal?
100% do dinheiro da universidade vem do governo federal. A dependência é total, mas temos tido uma relação com o governo e com o MEC de muita parceria, conseguimos sobreviver 2015 e vamos conseguir sobreviver 2016.

Os contratos terceirizados são que mais se pode cortar?

O nosso orçamento tem uma parte gigantesca — a maior de todas —, que é de salário e pensão. Isso ninguém fala. Tem uma parte bem menor, que de é custeio e investimento. Nessa pequena parte que a gente pode trabalhar. Dessa parte, 70% é terceirizada. A tentativa que fizemos nesses últimos três anos é a de racionalizar o uso das empresas terceirizadas. Uma transição difícil. Estamos, por exemplo, hoje, sem motorista.

A universidade sofre duas pressões, de um histórico de desequilíbrio financeiro e da redução orçamentária que está acontecendo agora…

Exatamente. Em 2012, a gente gastava R$ 150 milhões/ano com custeio, três vezes o que estava previsto. Um desequilíbrio orçamentário enorme. Passamos esses últimos três anos em uma postura de controle orçamentário muito sério.

Já conseguiram enxugar R$ 100 milhões?
Claro que não. Estamos equilibrando ainda. Os contratos têm duração. Você pode ajeitar detalhes. Mas eu acredito que nos próximos dois anos essa conta deva se equilibrar.

A verba do Reuni (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) era até 2012. Esse pode ser um dos motivos do descompasso orçamentário da UnB?

O grande custo do Reuni foi a entrada de novos alunos. E isso é permanente. Expande-se o quadro e dobra-se o número de alunos, isso é superpositivo. Tivemos uma verba para obras, usamos. Mas estamos com um grande problema de infraestrutura. Estamos gastando muito com custeio. Estamos reproduzindo na UnB a mesma realidade do GDF, do governo federal. Agora, é dramática essa realidade. Porque você tira o investimento do futuro para apagar incêndio do presente. Custeio é presente. Investimento é futuro. Temos que equilibrar as contas para que sobre investimentos para a universidade voltar a crescer.

Quando o senhor fala em investimento em infraestrutura, qual é a área prioritária?
Espaço físico na UnB é uma briga de foice. Todo mundo quer expandir os seus laboratórios. Além disso, faltam equipamentos. Eu tenho laboratórios em várias partes da universidade absolutamente sucateados. São esses tipos de investimentos que precisam ser feitos. Eu tenho certeza que a gente não fará esse ano. Mas, se não se equilibrar, não fará nunca. Eu fico otimista porque, ao contrário das outras universidades, a UnB tem receita própria e significativa. Temos prédio, temos patrimônio.

A ideia do Darcy Ribeiro era a de que esse patrimônio desse autonomia para a UnB...
Isso. Eu acho que o Darcy imaginava que, com essa receita, a gente teria autonomia. Não conseguimos. A receita é pequena, comparada com o custo da universidade.

Quanto a universidade gasta hoje?
A gente gasta mais ou menos R$ 1,3 bilhão por ano. Quase tudo vai para pessoal, pensão e aposentadoria. Fora isso, tem uns R$ 250 milhões entre infraestrutura, custeio e outros gastos como assistência estudantil. Toda essa verba vem do MEC. A nossa verba própria é de R$ 60 milhões por ano. Se comparar com os R$ 250 milhões que são a nossa verba de custeio, é significativa. Se eu comparar com R$ 1 bilhão, é quase nada.

Quais são as fontes de receita próprias da UnB?

São duas. Patrimônio — apartamentos — e o Cespe, com execução de serviços de concursos. É meio a meio.

A mudança do Cespe, antes ligado à UnB, para Cebraspe, agora empresa pública, tem algum impacto financeiro na arrecadação da UnB?

Há um contrato prevendo repasse de recurso do Cebraspe para a UnB, que é mais ou menos da mesma ordem de grandeza que tínhamos no passado.

A administração já pensou em mexer nesse patrimônio para fazer algum investimento? Ou é complicado?
Não é não. A lei que criou a Universidade de Brasília fez o conselho diretor, formado por seis pessoas. Eu faço parte, presido esse conselho. E ele delibera sobre o patrimônio da universidade. Se o conselho diretor decidir: “vou vender uma projeção para construir um prédio para a faculdade A, B, C qualquer”, de patrimônio para patrimônio, não tem problema nenhum. Na nossa regulamentação, a gente não permite a venda de patrimônio para virar custeio. Para eu, por exemplo, fechar as minhas contas no fim do ano, eu vendo um apartamento. Isso é proibido. Tem de ser vinculado.

Se fosse vender parte do patrimônio, quais seriam as prioridades?
O conselho diretor agora está trabalhando num eventual processo para ocupar a 207 Norte. Mas é um investimento muito grande. A 207 é a única quadra completamente vazia e é integralmente da UnB. E a gente tem de usar, transformar esse patrimônio em outro patrimônio. A gente não pode transformar em custeio, mas em um patrimônio que nos dê receita. Essa que é a ideia. Esse processo nem começou. Quer dizer, não vou dizer que nem começou porque, evidentemente, o conselho diretor sabe desse patrimônio, sabe das restrições que temos. Os nossos advogados estão preocupados, vendo quais são as possibilidades legais, uma possível licitação. Nós estamos antenados nesse problema, mas ainda não tem nenhuma decisão. O conselho diretor não se manifestou ainda sobre esse assunto.

E as coberturas?
A gente tem uma dificuldade muito grande para alugar as coberturas. O aluguel é caro. Uma das coisas que tem se proposto é vendê-las. Dão mais dor de cabeça do que lucro. Mas, antes de vender, preciso saber: vou pegar esse dinheiro e transformar em quê? A venda tem de estar direcionada à infraestrutura.

No ano passado, a UnB subiu vários postos em rankings nacionais e internacionais. Como conciliar menos dinheiro com qualidade de ensino?
Não há paradoxo nenhum. Quando você gasta dinheiro com displicência, temos a sensação de que a casa está descuidada. Essa postura de controle orçamentário melhora a excelência. O dinheiro aqui é gasto com parcimônia, com racionalidade.

A pesquisa travou por causa da falta de verba?
Dificulta um pouco, sim. Pesquisa é caro e não tem garantia de resultado. Se tivesse, não seria pesquisa. Tem um grau de incerteza enorme, mas precisa fazer. E o ambiente é a universidade. 80% da pesquisa do Distrito Federal é feita na UnB. Os nossos quadros, de professores e alunos, são brilhantes.

Os pesquisadores podem captar recursos próprios…

Sim. Normalmente, esses recursos são captados, e a gente faz a gestão dos recursos, ou as fundações de apoio.

Existia uma resistência de parceria público-privada na universidade. Isso mudou?

Eu acho que ainda tem exagerado isso na universidade, mas discordo frontalmente. Pesquisa é caro e precisa de parceria, precisa de gente, estar em contato com a vida real, com os problemas reais. Eu sempre fui, e não mudei nada no meu discurso, a favor de investimentos privados na universidade para a pesquisa.

Em 2015, vocês operaram com quanto a menos em caixa?
De cabeça, eu não sei. Você vai se perguntar por que eu falei de deficit e não sei o valor. Mas foi porque em 2014, em outubro, eu comecei a pedir dinheiro para o MEC. Em 2015, em janeiro, eu já estava lá de pires na mão. Agora, em 2016, tinha de pagar uma conta e tinha o orçamento, mas o financeiro não tinha liberado. Foi liberado às 18h, aos 45 minutos do segundo tempo. A vida do gestor público está muito dura. Muito ruim. Podia ser muito melhor.

Qual será a grande mudança no ano letivo?

A gente diz, com muita satisfação, que o calendário está regularizado. Nos últimos três anos, os professores da Universidade de Brasília não entraram em greve. Portanto, tivemos três anos de regularidade. Isso faz uma diferença fantástica. As greves causam um prejuízo incalculável. Neste ano, temos eleições dos docentes, da associação dos docentes, do sindicato dos servidores. Será um ano politicamente agitado na Universidade de Brasília.

E a reitoria?

Ainda não está definido o calendário das eleições para a reitoria. Quem vai definir é o Consuni (Conselho Universitário). Mas já tem algumas discussões avançadas que eu acho importante. ficou de alguma forma acordado entre os candidatos em 2012 que não faríamos mudanças no processo para a eleição de 2016. Será muito parecido com o de 2012. Eventualmente, se a comunidade quiser discutir, é até bom, mas não no calor da decisão. Deixa para discutir em 2017 eventuais mudanças.

O senhor pensa em se candidatar de novo?

Quando for o momento. Acho que sim. A gente precisa ficar mais um tempo. Quatro anos é pouco. O Poder Executivo tem tido essa história de quatro mais quatro. Talvez seja o mais certo a fazer. Essa não é uma decisão fácil. Mas, com muita alegria, muitos amigos falam: “Vamos continuar nesse processo”. Um processo que é longo, você estabilizar, regularizar, acertar o orçamento para conseguir investir no futuro.




Fonte: Flávia Maia – Fotos: Minervino Junior/CB/D.A-Press – Correio Braziliense



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