Em meio à plantação seca de milho, Elias Rapacho
estima que este será o maio prejuízo da história do DF
"Produtores do DF amargam um prejuízo de
até R$ 120 milhões e estimam redução de 70% do plantio. Como resultado,
consumidor sente as consequências com a alto preço do grão. Executivo local
decretou situação de emergência"
Produtores agrícolas do Distrito
Federal têm enfrentado dificuldades no campo: a estiagem que atingiu as
lavouras da capital entre fevereiro e abril desestruturou a produção e provocou
queda no rendimento. Passados quase três meses, o estrago é dado como certo
para a maior parte dos trabalhadores rurais que investiram na plantação. A
safra do milho passou por uma redução de 70% — de 120 sacos por hectare para
35, no máximo 40, segundo gerentes de unidades locais da Empresa de Assistência
Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF). A Secretaria de
Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural do DF (Seagri-DF) estima um
prejuízo entre R$ 115 milhões e R$ 120 milhões com a produção do grão. Por
causa do baixo rendimento, produtores tentam compensar com a alta do preço. O
saco de 60kg, geralmente vendido a cerca de R$ 20, é hoje comercializado por
aproximadamente R$ 50.
O período sem chuva e as altas
temperaturas afetam inclusive a cadeia produtiva: o milho serve de alimento
para aves, suínos e bovinos, além do consumo humano. Sem produção, o mercado de
carne também é prejudicado. A maior parte dos compradores de grãos do DF são
fábricas que produzem ração para animais. Também há demanda de outros estados,
como Espírito Santo e Minas Gerais. Mas, com as espigas sem grãos, a
expectativa é uma das piores do ano. As poucas produções de milho que deram
resultado foram plantadas dias antes da safrinha: período compreendido entre
fim de fevereiro e início de março.
Segundo o Instituto Nacional de
Meteorologia (Inmet), o período chuvoso no DF vai de outubro a fim de abril. Em
janeiro deste ano, choveu 398,8mm, acima da média prevista para o mês, que é de
247,4mm. Mas, a partir de fevereiro, o resultado ficou abaixo. “Como faltou
chuva nessa segunda safra, compreendida a partir de março, não teve grãos. A
perda é muito significativa, principalmente para as regiões de Mato Grosso, Goiás,
DF, Minas Gerais e sudoeste do país, onde o normal era ter duas safras por ano.
Os produtores acreditam muito na segunda safra, porque 2015 foi um período bom,
mas, este ano, acabou sendo muito ruim”, explicou o meteorologista Hamilton
Carvalho.
No Núcleo Rural Tabatinga, às margens
da DF-355, próximo a Planaltina, o produtor rural Elias Rapacho, 52 anos,
vive o pior momento da temporada. Natural do Rio Grande do Sul, ele planta
grãos há 36 anos — 15 só em Brasília, desde que se mudou para a capital com a
família, em 2001, por causa do tempo ruim no estado de origem. Em meio às
plantações de 85 hectares envelhecidas pelo sol forte, ele contou que a falta
de chuva começou a preocupar há quatro anos, mas, desta vez, afetou em maior
grau. O produtor investe em soja na primeira chuva (de outubro a fevereiro);
milho, na safrinha, assim como sorgo (cereal utilizado prioritariamente como
alimento de gado) e mexerica. “Esta é a temporada mais fraca. A produção de
milho vai cair quase 100%. Colhia 100 sacos do grão e vou tirar 70% menos. Tudo
isso só por causa da chuva, porque nos outros anos sempre foi normal. Falta
saber o prejuízo em agosto ou setembro”, lamentou.
Escassez
Rapacho deve colher o grão plantado em
fevereiro entre o fim deste mês e o próximo. Com o resultado aquém do esperado,
o produtor já planeja o próximo plantio de soja, que começa em outubro. Ele
ainda alertou para a possibilidade de faltar grão. “As lavouras não estão
produzindo quase nada. Mesmo com o pivô (leia Para saber mais), não ia ter a
quantidade de água necessária. O investimento é caro. Gasto R$ 3 mil por
hectare para soja e milho”, explicou. “Agora, é fazer outro plantio quando
começa a soja. A safrinha é um risco, mas nada comparado ao que estamos
enfrentando. Vim do Sul, porque lá sofríamos muito. Aqui, é a primeira vez que
isso acontece”, acrescentou.
O gerente da unidade local da Emater-DF
na área do Núcleo Rural Tabatinga e engenheiro agrônomo, Lucas Pacheco Máximo
de Almeida, esclareceu que a estiagem supera 80 dias em determinadas regiões.
Ele explicou que, sem chuva, não há fecundação, o que impede a produção de
grãos. O resultado no milho, por exemplo, são espigas pequenas e com poucos
grãos. “Essa realidade pegou o momento crítico do cultivo do milho, na fase do
emponderamento, quando a espiga gera os grãos. Isso significa uma perda de
produtividade, que em alguns casos atinge 100%. A média de prejuízo, porém,
ficou em 65%. Em números, um produtor que colhia 100 sacos por hectare na
safrinha vai colher em torno de 35”, estimou.
Ele considerou que a alta do preço nas
últimas três semanas equilibrou o prejuízo. Ao longo da semana passada, no
entanto, houve a entrada do milho do Mercosul em território brasileiro e o
valor voltou a cair. “A situação preocupa, porque o pessoal acostumou a fazer
duas safras no período da chuva, graças às tecnologias de soja precoce. Com a
quebra econômica da safrinha, os produtores começam a pensar o uso ou não dela.
Isso, em termos econômicos, vai gerar uma redução da produção e, consequentemente,
toda a cadeia vai sofrer”, alegou.
Emergência
O governador do DF, Rodrigo Rollemberg
(PSB), há uma semana decretou situação de emergência nas regiões rurais. O
decreto do Executivo local, publicado em 7 de junho no Diário Oficial do DF,
vale por seis meses. A medida vai subsidiar o pedido de refinanciamento de
dívidas dos produtores, a prorrogação dos débitos e a justificativa de quebras
de contrato.
Segundo o secretário de Agricultura,
José Guilherme Leal, em um primeiro momento, a pasta tem comunicado os agentes
financeiros que operam em Brasília e financiam o crédito rural para que tomem
conhecimento da manifestação oficial do GDF sobre a situação crítica no campo.
“Vamos fazer uma reunião com a Câmara Setorial de Grão, produtores, agentes
financeiros e entidades envolvidas na produção e comercialização dos produtos
para apresentarmos o decreto e a nota técnica. A expectativa, com isso, é que
se crie um ambiente em que os profissionais do campo possam discutir, caso a
caso, a necessidade de alongamento dos seus orçamentos”, ressaltou.
Leal confirmou que a principal área
atingida é o cultivo do milho. Segundo ele, o foco, agora, é impedir que a
mesma redução atinja outras esferas. “O estrago nesse setor já está feito.
Estamos com uma preocupação maior quanto à produção de hortaliças, porque
vários dos rios da região estão com volume baixo.” A maioria da plantação do
feijão é irrigada por pivô. O secretário estima, no entanto, que, como a água
não tem sido suficiente, pelo menos 30% dos equipamentos usados estão parados.
A baixa produtividade, portanto, também afeta o principal alimento que vai à
mesa do brasileiro.
O gerente da unidade local da Emater-DF
na área do PAD-DF e engenheiro agrônomo, Marconi Moreira Borges, explicou que a
expectativa de chuva no período da safrinha, foi baixa. Além disso, as
temporadas ficaram concentradas em poucos dias. Para agravar a situação, a
temperatura ficou três graus mais alta do que a de costume. “Por causa de tudo
isso, as colheitas não vão produzir praticamente nada. Desde a segunda quinzena
de fevereiro, os produtores viram chuva só no retrato. Sem chuva a planta não
consegue realizar a fotossíntese, absorver água, nem fazer nada do que
precisa”, alertou.
Com a falta de chuva, os rios também
baixaram o volume. Os produtores que plantam de forma irrigada feijão e milho,
por exemplo, também perderam água. “Não tem água para todo mundo. Isso
significa que houve uma redução direta de 70% da renda do produtor, que não vai
ter dinheiro nem para pagar os custos de produção. É uma tristeza, porque vai
faltar recursos para plantio da safra normal, que começará em outubro. O
decreto do estado de emergência tende a facilitar os processos de negociação
com os bancos”, acredita.
Para saber mais - A função do pivô
A irrigação por pivô é a mais utilizada
para plantações de grãos, como feijão, milho e soja, além de tomate, algodão,
cana-de-açúcar, batata, cebola, alho e frutas, a exemplo de banana e mamão.
Também é usada para pasto. Trata-se de uma estrutura de equipamento que varia
de 4 a 6 metros de altura. Existem três principais tipos: o pivô central fixo,
que cobre uma área circular; o pivô central rebocável, que cobre várias áreas
circulares, pois desloca de uma para outra; e o sistema linear, em que o
equipamento se desloca em linha reta.
O pivô central é indicado para áreas de
cultivo contínuo. A torre é fixada ao solo, irrigando de forma circular uma
área pré-determinada. O rebocável é mais usado em regiões de cultivo contínuo,
uma vez que aproveita ao máximo a produtividade do campo irrigado. Já o linear
é ideal para áreas retangulares, pois permite o aproveitamento total da área —
é abastecido por um captador lateral localizado na primeira torre.
Fonte: Isa Stacciarini
– Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A.Press – Correio Braziliense