Por Severino Francisco,
Caro leitor, peço a fineza de retirar
as crianças da sala, pois tratarei de um tema pornográfico, obsceno e amoral,
inadequado a menores de 18 anos. Vocês adivinharam: vou falar da Câmara
Legislativa. Enquanto o juiz Sérgio Moro manda prender o ex-presidente da
Câmara dos Deputados Eduardo Cunha aqui em Brasília, numa decisão apertada, por
11 votos a 9, desembargadores do Conselho Especial do Tribunal de Justiça do DF
decidiram, na noite de terça-feira, manter a deputada distrital Celina Leão
(PPS) afastada da Presidência da Casa.
Em contrapartida, na mesma sessão,
autorizaram a volta dos integrantes da Mesa Diretora, envolvidos na chamada
Operação Drácon, sob a acusação de liberar emenda em troca de propina. Ambas as
decisões causam estranheza: a manutenção do afastamento da presidente da Câmara
Legislativa por placar apertado e o retorno dos acusados à Mesa Diretora, um
dia depois de uma nova ofensiva do Ministério Público, comprovando a suspeita
de destruição de provas por servidores daquela Casa.
A estranheza se transforma em estupefação
se considerarmos que o processo se encontra na fase de coleta de provas e de
instrução. Só alguns dos ilustres meritíssimos parecem desconhecer que, com o
poder nas mãos, os acusados podem recorrer a ardis para dificultar as
investigações. Além disso, as decisões insólitas ocorrem no momento em que
existe um clamor nacional pela moralidade no trato com a coisa pública.
Ao longo de toda a existência, a Câmara
Legislativa tem primado em promover shows superfaturados, em referendar a
grilagem de terras públicas, em contratar funcionários fantasmas, em formular
emendas parlamentares em troca de propina e em consumir combustível pago com o
dinheiro público suficiente para dar uma volta ao mundo, entre outros deslizes.
É uma instituição que mancha o nome de
Brasília. Nada faz para merecer a deferência especial com que foi tratada por
boa parte dos eminentes juízes. Pelo contrário: é perigoso para o bem público
aplicar o princípio da presunção da inocência a uma instituição com esse
currículo de desserviços e essa folha corrida de práticas pouquíssimo
republicanas.
Parece que alguns meritíssimos locais
vivem em um universo paralelo no qual podem tomar decisões ao sabor de suas
veleidades pessoais, desconsiderando o histórico dos personagens e da instituição
envolvidos. Enquanto a Operação Lava-Jato traça novos parâmetros no combate à
corrupção em esfera nacional, no plano local a cidade passa por um evidente
retrocesso e padece com um sistema de Justiça capenga, que estimula a
impunidade.
Decisões como essas lançam um
descrédito contra o Judiciário local, que teima em agir no descompasso com os
anseios da maioria da população brasileira. Que belo exemplo para os políticos
do Brasil e de Brasília. O país clama por transparência e decência. Que justiça
é essa?
(*) Severino Francisco, Jornalista, Colunista do
Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google