O
avanço da superpopulação mundial vem sendo alertado pelo Clube de Roma desde
1972. Biólogos da Finlândia, na década de 1960, sinalizavam que a natureza
nórdica já sofria de exaustão diante da exploração intensa de seus bens. As
consequências do crescimento da população mundial tornaram-se mais agudas,
especialmente para países pobres ou emergentes. Hoje, a pobreza, a fome, a
falta de água, o desemprego e as guerras entre países provocam uma nova
diáspora. Multidões estão fugindo de seus países e morrendo pelo caminho. O
planeta sofre de superpopulação. Mas a superpopulação começa ao nosso lado.
Seus efeitos são sentidos em nossas cidades, em nossas ruas, em nossas casas,
em nossas florestas e rios, em nossas lavouras.
Quais
são as indicações mais visíveis que apontam para a realidade da superpopulação
tanto em países ricos quanto em nações pobres? A fome castiga quase um bilhão
de pessoas em todos os países do mundo. A dificuldade de acesso diário à água
potável sacrifica quase dois bilhões de humanos e milhões de outros seres
vivos. O desemprego generalizado atinge países pobres e ricos. Os mortos e os
exilados de guerras econômicas e religiosas e os expulsos de suas terras pelas
mudanças climáticas compõem um retrato lúgubre da espécie humana.
Mais
perto de nós, em quase todas as regiões do país, há sinais incontestes de
superpovoamento urbano e indícios claros de superpopulação. Filas diárias às
portas de hospitais. Prisões superlotadas. A busca angustiante da casa própria.
A falta de creches para liberar as mães trabalhadoras de duas ou três jornadas
de trabalho. O inchaço das cidades com sacrifício de áreas verdes. Milhares de
famílias em situação de risco ambiental. Ruas entulhadas de carros. Esses
acontecimentos do dia a dia parecem não dar ao cidadão perspectiva alguma de
mudança.
Tenho
comentado com alguns demógrafos sobre o tema da superpopulação. A primeira
reação é dar uma resposta estatística. As taxas de crescimento, no Brasil, vêm
caindo, reafirmam. Já tivemos, nas décadas de 1950 e 1960, taxas de crescimento
de até 5%. Hoje, a taxa média de fecundidade, em nosso país, é de 1,94%. Isso
quer dizer que uma mulher, em média, tem 1,94 filho. Não tem um jeito ridículo
essa linguagem estatística que amputa parte do filho para dar a ilusão de um
decréscimo do ritmo de reprodução? Em que lugar do mundo uma mulher tem um
filho e um pedaço de outro?
Por
que não falar da realidade da reprodução humana e localizar essa realidade no
tempo e no espaço? Seria mais fácil discutir esse tema tabu conhecendo-se as
circunstâncias, a cultura, a forma de relacionamento de um povo com a natureza
diante da oferta de maiores ou menores condições de sobrevivência. Em que
lugar, mulheres têm dois filhos ou nenhum? Em que lugar, mulheres têm quatro
filhos? Em que lugares e em que circunstâncias mulheres têm cinco ou mais
filhos?
A
média estatística enfraquece a realidade e limita a condução racional de uma
política democrática e consciente de controle da natalidade humana, não só em
benefício da espécie humana, como também em favor de todas as espécies vivas do
planeta, tanto vegetais quanto animais que constituem a biodiversidade do
planeta. Nenhuma monocultura é desejável para o convívio harmonioso dos seres
vivos.
O
crescimento descontrolado da espécie humana com múltiplas e variadas
necessidades impõe medidas de sobrevivência para si em detrimento da
sobrevivência das demais espécies vivas do planeta das quais depende. Os
prenúncios, apesar dos contraceptivos, da urbanização e da tecnologia são de
aumento da população para as próximas décadas, sem que se propicie, ao mesmo tempo,
o acesso aos bens essenciais a quase metade dela.
Superpopulação
não é apenas um fato numérico. É a relação entre o número de pessoas vivas, o
complexo conjunto de suas necessidades básicas ou estimuladas e a capacidade
das próprias instituições humanas de administrar grandes populações. Essa
incapacidade de administrar se agrava com o aumento da população. Parte
significativa dela não é igualitariamente atendida. O que se percebe é um
atendimento seletivo, parcial e discriminatório mesmo com leis adequadas e
vastos programas sociais.
O
crescimento da população, no dia a dia, é quase imperceptível. No Distrito
Federal, registram-se 125 nascimentos por dia, que somam, ao fim do ano, 45 mil
novos habitantes, número equivalente à população do Núcleo Bandeirante. Ou
seja, nasce uma cidade-satélite por ano, no DF, com necessidade de mais água,
energia, alimentos, espaço físico, postos de vacinação, serviços médicos,
fraldas, berços, roupas, sapatos.
Nesse
ritmo, o DF, em dois anos, terá 200 mil habitantes a mais, sem contar os 20 mil
imigrantes anuais, segundo a Codeplan. O avanço indiscriminado sobre as últimas
áreas verdes e a urbanização descontrolada agravam as dificuldades
administrativas e entorpecem a ação governamental. As habilidades institucionais
para atender a todas as necessidades da população não crescem no mesmo passo do
aumento da população. O limite da capacidade de suporte do DF já foi
ultrapassado. Há que se rever a situação presente e prever o que nos espera nos
próximos anos. O racionamento de água, neste ano, é um aviso claro de
superpovoamento.
Por: Eugênio Giovenardi - Escritor, sociólogo e
acadêmico do Instituto Histórico
e Geográfico do Distrito Federal –
Correio Braziliense Foto/Ilustração: Blog - Google